Apenas dez dias antes do início das apresentações na mostra ‘CCBB – 30 anos de Cias.’, o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) do Rio de Janeiro exclui a peça ‘Caranguejo overdrive’ do repertório, de forma unilateral e sem justificativa [1]. A peça conta a história de um ex-catador de caranguejos que enlouquece no campo de batalha da Guerra do Paraguai [2]. O grupo Aquela Cia de Teatro foi surpreendida pela decisão, uma vez que a produção de ‘Caranguejo overdrive’ ganhou diversos prêmios e integraria a mostra junto com a peça ‘Guanabara Canibal’, também da companhia [3]. Em nota, a companhia afirma que situações semelhantes são cada vez mais recorrentes, que as instituições culturais devem ‘fazer jus à pluralidade da sociedade brasileira, e não simplesmente acatar a um dirigismo’ e a peça é transferida para o Espaco Cultural Municipal Sérgio Porto [4]. Duas semanas depois, durante o início de um protesto na frente do centro cultural, movido pelo episódio, o CCBB se pronuncia afirmando que ‘teriam sido acrescentados em seu roteiro posicionamentos político-partidários, com citação a nomes de personalidades políticas do atual governo e da oposição’, o que infringiria cláusulas contratuais do patrocínio que veda manifestações político-partidárias [5]. O Ministério Público Federal entra com ação contra o CCBB [6], para que retome a exibição da peça nos termos acordados, e contra a Secretaria Especial de Comunicação (Secom), que teria dado a ordem de censura [7]. A ação aguarda julgamento [8]. Em outras oportunidades, a Caixa Econômica Federal cria novas regras para avaliação de projetos culturais, incluindo a verificação de posicionamento político de artistas [veja aqui], e o secretário de Cultura pede demissão em razão interferência indevida do governo em edital [veja aqui].
Leia as análises sobre como o cancelamento de atividades culturais podem ensejar ações na Justiça e como o governo tem interferido na área cultural.
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.