Em 24/03, Bolsonaro fez seu terceiro pronunciamento televisivo [veja aqui], mudando radicalmente o tom em relação aos pronunciamentos anteriores, de 06/03 e 12/03. Até então, o presidente havia sugerindo conformidade com instruções sanitárias e científicas. Em 24/03, porém, ele afirmou, dentre outras coisas, que o vírus seria uma ‘gripezinha’, um ‘resfriadinho’ e que ele, pessoalmente, estaria imune em razão de seu passado atlético. Dois dias depois, disse que o cenário no país não seria tão dramático quanto nos EUA porque a população seria naturalmente mais resistente: segundo ele, o brasileiro ‘mergulha no esgoto’ ‘e não acontece nada com ele’ [1]. Em 27/03 registrou em suas mídias sociais vídeo de carreata em Santa Catarina que pedia a volta do comércio e era contrária ao isolamento social [2]. No mesmo dia, questionou a veracidade do número de mortos pela doença e levantou a possibilidade de fraudes para uso político dos números [3]. Em 29/03, o presidente fez passeio no comércio de Brasília, posicionando-se novamente contra as recomendações sanitárias e causando aglomerações [veja aqui]. No mesmo dia, afirmou que o vírus é uma realidade e que devemos enfrentá-lo ‘como homem’ na saída do Alvorada [4]. Ambos os atos do presidente nesse dia foram postados em suas redes sociais e posteriormente apagados pelas empresas Facebook, Instagram e Twitter [veja aqui]. No mesmo dia, ele também afirmou estar pensando em editar decreto para que a população volte a trabalhar [5]. Entre 23 e 31/03 o número de infectados pela covid-19 subiu de 1.960 [6] para 5.812 [7] e as mortes somaram 202 pessoas [8], de acordo com dados das Secretarias Estaduais de Saúde.
Leia as análises sobre os atos de Bolsonaro em março, uma ação ajuizada contra o presidente em razão de suas posturas, a repercussão internacional na mídia norte-americana e inglesa.
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.