A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, divulga um vídeo nas redes sociais anunciando o ‘milagre da cloroquina’ na cidade de Floriano, no Piauí [1]. A ministra foi enviada ao local para visitar um hospital que faz uso do medicamento hidroxicloroquina [2] e buscar o protocolo adotado de atendimento a pacientes de coronavírus para outras regiões do país [3]. A ida se deu depois de começar a circular a informação de que o medicamento era o responsável por esvaziar a UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do hospital [4]. No entanto, o coordenador técnico do hospital afirma ser falsa a atribuição de êxito na melhora dos pacientes em razão do uso da cloroquina e declara que o diferencial para evitar a UTI é o uso de medicamentos como o corticoide e o anticoagulante para pacientes internados [5]. O protocolo é defendido por uma médica brasileira que trabalha em um hospital em Madri, na Espanha, mas ele não é aceito pelo Ministério da Saúde do país [6]. A Agência Espanhola de Medicamentos e Produtos Sanitários, inclusive, alerta para os riscos de possíveis reações adversas ocasionadas pela cloroquina, como problemas cardíacos [7]. Cinco dias depois da declaração da ministra, o ocupante interino do cargo de ministro da Saúde [veja aqui] assina novo protocolo para ampliar o uso de cloroquina após determinação do presidente, apesar da OMS ressaltar os efeitos colaterais do remédio e suspender os testes com a droga dias depois [veja aqui].
Leia as análises sobre a aposta do governo na cloroquina, dez pontos para entender o debate em torno desse medicamento, um estudo brasileiro que aponta a sua ineficácia – em inglês – e alguns apontamentos sobre esse estudo.
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.