Em evento promovido pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), o presidente Jair Bolsonaro reclama da proibição do trabalho infantil. Bolsonaro afirma: ‘bons tempos, né? Onde o menor podia trabalhar. Hoje ele pode fazer tudo, inclusive cheirar um paralelepípedo de crack, sem problema nenhum’ [1]. A fala é repudiada pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI) [2] e pela Rede Peteca – Chega de Trabalho Infantil [3]. Segundo levantamento da UNICEF, realizado em São Paulo, houve um aumento da incidência do trabalho infantil durante a pandemia da covid-19 [4]. Em vigor desde 1990 [5], o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) veda o trabalho de menores de 16 anos – exceto na condição de aprendiz, quando há autorização a partir dos 14 [6]. Após o fim do Ministério do Trabalho [veja aqui], o número de fiscalizações para o combate ao trabalho infantil caiu de forma significativa [7]. Poucos dias depois, em setembro, o presidente voltou a defender o trabalho infantil: em sua live semanal, ao lado de uma criança de 10 anos que atua em vídeos no youtube, ele disse: ‘deixa a molecada trabalhar’ e utilizou a carreira da atriz mirim como exemplo para reforçar sua posição [8]. Bolsonaro já havia sido crítico ao ECA em outras ocasiões; quando era candidato ao cargo de presidente, já afirmou, inclusive, que o ECA deveria ser ‘rasgado e jogado na latrina’ [9]. Em 2019, afirmou que o trabalho dignifica, não prejudica, as crianças [veja aqui] e editou decreto destituindo representantes e reduzindo participação de entidades sociais no Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) [veja aqui].
Leia as análises sobre a relação do trabalho infantil e a pobreza, sobre os impactos da pandemia de covid-19 e o aumento do trabalho infantil e sobre os 30 anos do ECA.
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.