Em entrevista à rádio Bandeirantes [1], o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, declara que o governo federal estuda apresentar ação judicial contra a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) – entidade fundada pelo movimento indígena em 2005 – com base no crime de lesa pátria previsto na Lei de Segurança Nacional (LSN) [2]. Ao ser perguntado pelo jornalista sobre uma publicação realizada quatro dias antes em suas redes sociais, na qual afirmou que a Apib teria produzido um site que veicula ‘fake news contra o Brasil’ e que seria responsável por ‘imputar crimes ambientais ao presidente da República’ [3][4], o ministro confirma seu posicionamento e diz que ‘isso que está sendo feito pela Apib (…) é um crime de lesa-pátria, eu não estou inventando’. Heleno afirma também que a organização estaria aliada a interesses internacionais – argumento que tem sido reiterado pelo presidente na ONU [veja aqui] e em fóruns internacionais [veja aqui] – e que o governo federal estaria ‘buscando (…) quais são seus verdadeiros objetivos para, se for o caso, movermos uma ação contra esse trabalho nefasto que eles fazem’ [5]. Em reação, a Apib emite nota pública de repúdio, classificando as declarações de Heleno como ‘graves acusações’ e alertando para risco a segurança dos membros da Apib [6]. Além disso, deputados da oposição apresentam pedido ao Congresso Nacional para que o ministro seja convocado a prestar esclarecimentos [7]. Na semana seguinte, em discurso na ONU, Bolsonaro acusa instituições internacionais e ONGs de visarem às riquezas da Amazônia [veja aqui]. Vale notar que a Apib é responsável por apresentar ação contra União por se omitir na proteção de indígenas contaminados por covid-19 [veja aqui] e por denunciar empresa pública de comunicação por ocultar informações sobre a situação indígena na pandemia [veja aqui]. Em outras oportunidades, a LSN foi mobilizada por autoridades do governo contra pessoas consideradas opositoras, como jornalistas [veja aqui] [veja aqui], servidores públicos [veja aqui], e até ministro do Supremo Tribunal Federal que referiu-se a existência de genocídio indígena [veja aqui].
Leia análise sobre o papel das ONGs na Amazônia, e veja linha do tempo sobre os direitos dos povos indígenas
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.