O presidente Jair Bolsonaro, em discurso [1] na cúpula dos Brics – bloco de cooperação entre Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – critica a ‘politização do vírus’, defende ‘reformas’ nas ‘entidades internacionais’, como a Organização Mundial da Saúde (OMS),e desaprova o ‘pretenso monopólio do conhecimento por parte da OMS’ durante a pandemia do coronavírus [2]. No decorrer do discurso, ele também afirma que ‘não foram os organismos internacionais que superaram desafios, mas sim a coordenação entre os nossos países’ [3]. No mesmo dia, o Brasil registra mais de 30 mil novos casos da doença e volta a marca de 500 mortes em 24h [4]. Dias depois, anuncia-se que, por negligência do governo federal, 6,86 milhões de testes para detectar a doença poderão ser descartados nos próximos meses [5] [veja aqui]. Vale lembrar que a oposição de Bolsonaro às recomendações da OMS é frequente: em março, o governo federal defendeu a flexibilização do isolamento social [veja aqui]; em abril, o presidente demitiu o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta por discordar de sua atuação alinhada à OMS [veja aqui], e em maio, o ex-ministro da Saúde, Nelson Teich, pediu demissão [veja aqui] após embates com o presidente sobre métodos de controle da pandemia; em junho, Bolsonaro ameaçou deixar a OMS e afirmou que ‘não precisamos de gente lá de fora dar palpite na saúde aqui de dentro’ [veja aqui]. No campo diplomático, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) já associou o coronavírus ao comunismo [veja aqui]; o ministro do MRE, Ernesto Araújo, publicou texto chamando o a covid-19 de ‘comunavírus’ [veja aqui], e o deputado federal e presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, Eduardo Bolsonaro (PSL), gerou desgaste diplomático após criticar a atuação do governo chinês na pandemia [veja aqui].
Leia análise sobre a importância da cooperação internacional frente a pandemia
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.