Em meio a cenário de baixa testagem [1], Ministério da Saúde (MS) deixa 6,86 milhões de testes de coronavírus estocados, que podem perder a validade entre dezembro de 2020 e janeiro de 2021 [2]. Trata-se de exames RT-PCR, os mais efetivos para o diagnóstico da doença [3]. Esses exames estão guardados em armazém do governo federal em Guarulhos e não foram distribuídos para rede pública. O volume armazenado é maior do que o aplicado no SUS desde o início da pandemia até o mês de novembro de 2020 [4]. O governo federal culpa os estados e municípios pelo possível prejuízo, afirmando que sua atribuição se resume a comprar os insumos e que só entrega os testes quando há solicitação dos estados [5]. Secretários estaduais, por sua vez, dizem que não sabiam dos testes parados e que receberam kits incompletos com falta de materiais necessários para coleta de amostras [6]. Questiona-se também o critério adotado na distribuição dos testes RT-PCR: estados mais populosos e com maior número de casos, como, por exemplo, a Bahia receberam menos testes do que estados menos populosos e com menos infecções, como o Paraná, por exemplo [7]. O MS afirma que estuda a extensão do prazo de validade desses testes, com a garantia de que os exames não perderam suas propriedades [8]. O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União pede uma investigação sobre os problemas de logística e planejamento na distribuição dos testes para a rede pública de saúde e o eventual prejuízo ao erário, no valor de R$ 290 milhões decorrente do vencimento do prazo de validades desses testes [9]. Além disso, deputados integrantes da comissão da Câmara que acompanha as ações de combate à pandemia cobram soluções do governo para os testes [10]. Em 09/12, a Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a extensão da validade desses testes estocados [11]. Segundo depoimento de especialista, não é comum esse tipo de prorrogação, tanto que a Anvisa prorrogou a validade para os testes armazenados pelo MS, mas rejeitou pedidos semelhantes da iniciativa privada [12]. Cabe destacar que diversos estudos já apontaram a falta de transparência do governo Federal [veja aqui] e dos governos estaduais [veja aqui] com relação aos dados da pandemia. O governo Bolsonaro também já redirecionou uma doação destinada a compra de testes do coronavírus para um programa gerido pela primeira-dama, Michelle Bolsonaro que repassou os valores à instituições evangélicas, dentro do projeto ‘Arrecadação Solidária’ [veja aqui] e insiste na oferta de cloroquina, medicamento sem comprovações científicas de eficácia no combate ao coronavírus [veja aqui]
Ouça o podcast que analisa os problemas de logística na distribuíção dos testes de covid e a reação do governo federal
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.