A Polícia Federal (PF) intima o advogado criminalista Marcelo Feller a depor em inquérito criminal instaurado a pedido do Ministro da Justiça, André Mendonça, com base na Lei de Segurança Nacional (LSN) [1]. O inquérito foi instaurado contra Feller em razão de críticas ao presidente Jair Bolsonaro em programa televisivo [2]. As declarações de Feller ocorreram em 13 de julho de 2020 durante ‘O Grande Debate’ da CNN Brasil, ocasião em que apresentou estudos científicos sobre a pandemia e afirmou que o presidente seria ‘responsável por pelo menos 10% das mortes por covid-19 no país’ [3]. O inquérito foi aberto pela PF em agosto de 2020 e foi fundamentado por Mendonça em artigo da LSN, que prevê sanção de até quatro anos de reclusão para pessoa que ‘caluniar ou difamar o presidente da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal’ [4][5]. Em reação, a defesa de Feller argumenta que a investigação ‘revela a faceta opressiva contra a liberdade de expressão e crítica e, mais ainda, contra a liberdade de imprensa’, uma vez que Feller estaria no programa na ‘condição de debatedor’ [6][7]. A defesa do advogado também afirma que irá ajuizar habeas corpus para que a investigação seja paralisada [8]. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, também se manifesta contra a abertura do inquérito, que é vista como uma forma de ‘intimidar e tentar calar’ aqueles que apontam os erros do governo [9]. Em 21/01/2021, representante do Ministério Público Federal determina o arquivamento do inquérito por considerar que a utilização da LSN é inadequada, uma vez que a lei se reserva para casos extremos contra a segurança do Estado, devendo resguardar o direito à liberdade de expressão [10]. Esse é mais um caso em que a LSN – resquício da ditadura militar – é mobilizada por autoridades do Executivo contra pessoas críticas ao governo e a figura de Bolsonaro: em junho foram solicitados inquéritos com base na LSN contra colunista de jornal [veja aqui], contra jornalista e cartunista [veja aqui] [veja aqui] e em julho Ministro do STF também sofreu representação fundamentada na mesma lei [veja aqui]. Em 2019 e no primeiro semestre de 2020 foram registrados, respectivamente, 28 e 20 inquéritos abertos pela LSN [veja aqui] [veja aqui].
Veja linha do tempo sobre a história da Lei de Segurança Nacional e leia análises sobre a aplicação desta legislação e o direito constitucional a liberdade de imprensa.
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.