A ONG Freemuse produz anualmente um relatório sobre o estado da liberdade artística no mundo e incluiu neste ano o Brasil como um de seus objetos de estudo [1]. De acordo com a coordenadora do projeto, Jasmina Lazovic, há o risco de que o Brasil siga o caminho de países como Rússia, Polônia e Hungria, que são ‘ditas democracias com lideranças nacionalistas, populistas e conservadoras’ e onde ‘tentam controlar círculos acadêmicos e culturais’ [2]. Lazovic ressalta que muitas vezes a censura não é explícita, mas ocorre através de nomeações para cargos de chefia com perfil ideológico específico ou de decisões de não financiamento dos artistas [3]. O relatório afirma que o Brasil passa por um contexto em que as instituições democráticas estão sendo desafiadas e que o governo federal busca minar as liberdades artísticas, principalmente com base em dissensos políticos e religiosos [4]. O documento registra que, desde a dissolução do Ministério da Cultura em 2019 [veja aqui], o governo federal busca centralizar o controle administrativo sobre o setor cultural, tendo acelerado esse processo em 2020 [5]. Em setembro, o secretário especial da Cultura, Mario Frias, determinou controle de postagens em sites e redes sociais de todos os órgãos vinculados à pasta [veja aqui]. Segundo o relatório, ainda que a medida reconheça a autonomia legal dessas instituições, é uma forma de subordiná-las à Secretaria [6]. O relatório aponta que grupos religiosos conservadores requerem na Justiça o banimento de certas produções artísticas sob a justificativa de proteção da família e valores religiosos [7]. A ONG cita o caso do programa Porta dos Fundos, que representava Jesus como homossexual [veja aqui], do filme que criticava a sexualização de crianças [veja aqui] e da exposição que debatia sobre a política de estado em torno do HIV . Além disso, o relatório menciona a tendência crescente de ataques contra artistas através da internet, que normaliza a violência. Em geral, os ataques e ameaças são direcionados a artistas mulheres e/ou LGBTI e contra aqueles que criticam o governo, inclusive tendo sido escritos por figuras públicas [8]. O relatório cita o caso em o secretário especial da Cultura criticou o humorista Marcelo Adnet por uma paródia de campanha do governo [veja aqui]. A ONG ressalta que esses tipos de agressões, promovidas pelos aliados do presidente Bolsonaro, prejudicam o trabalho e a saúde mental dos artistas [9]. O relatório conclui que, para promover uma sociedade plural e democrática, o governo brasileiro deve reconsiderar o processo de centralização e influência política sobre o setor cultural, deve se abster de censurar obras e artistas que critiquem o governo ou que pareçam inapropriadas sob uma ótica cristã e não deve ameaçar ou encorajar seus apoiadores a ameaçar e assediar artistas [10]. Ao invés disso, as autoridades têm a responsabilidade de investigar e punir aqueles que cometem violência contra artistas [11].
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.