O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Kassio Nunes Marques, decide monocraticamente, ou seja, de maneira individual, conceder liminar que autoriza as celebrações de cultos religiosos em todo o país, suspensas em alguns estados e municípios como forma de evitar aglomerações e controlar a pandemia do coronavírus [1] [veja aqui]. A decisão é tomada em ação proposta pela Associação Nacional de Juristas Evangélicos (AANAJURE), que questiona a constitucionalidade dos decretos que proíbem tais situações por ferirem a liberdade religiosa [2]. Nunes Marques concorda com o pedido feito pela ANAJURE e aponta para a ‘essencialidade da atividade religiosa, responsável (…) por conferir acolhimento e conforto espiritual’ [3]. A decisão prevê que deverão ser cumpridas certas medidas sanitárias para conter o espalhamento do vírus [3]; Investigação da imprensa de 04/04 revela que elas foram descumpridas em diversos locais [4]. A decisão é proferida sem a solicitação da inclusão do processo na pauta de discussão do plenário do Tribunal e desrespeita os precedentes já julgados pelo STF, inclusive pelo próprio Nunes Marques, em casos semelhantes [5]. Apuração da imprensa indica que a decisão gerou incômodo no STF: os demais ministros interpretaram a decisão como um mau exemplo à sociedade, tendo em vista que o país enfrenta o pior momento da pandemia [6]. No dia seguinte à decisão, o Município de Belo Horizonte encaminha recurso ao presidente do STF para tentar reverter a determinação [7]. Em 05/04, o Ministro Gilmar Mendes decide, em ação distinta e em discordância com a decisão de Nunes Marques, pela proibição dos cultos e missas religiosas; contudo, ele submete sua decisão ao colegiado [8]. Em 08/04, o tema é debatido no STF e a maioria dos ministros decide pela possibilidade de estados e municípios restringirem as celebrações religiosas durante a pandemia, invalidando a decisão dada por Nunes Marques [9]. A celebração de cultos religiosos durante a pandemia é um tema que já vem gerando grande polêmica desde março de 2020, quando o presidente Jair Bolsonaro considerou atividades religiosas como essenciais [veja aqui]. Decretos estaduais de fevereiro de 2021 também incluíram igrejas no rol de atividades essenciais [veja aqui]. Em abril de 2021, Bolsonaro critica as medidas de restrição aos templos religiosos [veja aqui].
Leia análises sobre os impactos jurídicos da decisão do Ministro Nunes Marques, sobre o risco à saúde pública na permissão dos cultos religiosos presenciais e ouça sobre como funciona o STF e quais são interesses de Bolsonaro no STF.
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.