Ministério da Saúde (MS) publica documento contendo incentivo de práticas de violência obstétrica e de eficácia relativa, como a manobra de Kristeller, a episiotomia e a amamentação como método contraceptivo [1]. A Caderneta da Gestante, utilizada no Sistema Único de Saúde (SUS), traz informações sobre o pré-natal, parto e os primeiros meses de vida do bebê e terá mais de 3 milhões de cópias distribuídas aos serviços da Atenção Primária à Saúde [2]. No lançamento do documento, o secretário de Atenção à Saúde Primária do Ministério da Saúde, Raphael Câmara, defende práticas banidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), argumentando que ‘tem algumas coisas que dependendo da situação e em casos excepcionais podem e devem ser feitas e quem define isso é o médico, não são leigos, militantes, ativistas’ [3]. Câmara defende também ‘parar de ficar usando termos que não levam a nada, como violência obstétrica, que só provoca desagregação, coloca a culpa no profissional’ [4]. Vale lembrar que Câmara é apontado como responsável pela edição de outra cartilha sobre direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, a qual negava a existência de aborto legal no país [veja aqui]. O Conselho de Enfermagem (Cofen) emite parecer recomendando que a edição da Caderneta da Gestante seja recolhida e reelaborada ‘de acordo com as evidências científicas disponíveis’, argumentando que ela vai contra protocolo pactuado pelo próprio MS, junto à organizações médicas nacionais e internacionais [5]. O deputado federal e ex-ministro da Saúde, Alexandre Padilha (PT-SP), classifica o conteúdo do documento como ‘gravíssimo’ e encaminha ao Tribunal de Contas da União (TCU) pedido para que o documento seja analisado [6]. A cartilha também foi criticada por especialistas pela falta de evidência científica e pelo incentivdo de práticas consideradas ultrapassadas e agressivas [7]. Em defesa do documento, o MS afirma que ‘as práticas realizadas durante o parto devem ser debatidas entre a paciente e o médico obstetra’ [8]. O governo federal já agiu anteriormente contra a autonomia feminina, como quando baixou o decreto que defende ‘direito à vida desde a concepção’ [veja aqui], bem como quando o Brasil, representado pela ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, assinou declaração internacional contra o aborto [veja aqui].
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Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.