Bolsonaro sanciona a Lei nº 13.979/2020 (“Lei da Quarentena”) [1], que tramitou com extrema rapidez no Congresso [2]. Em 04/02, a Câmara aprova o projeto com modificações [3] e, no dia seguinte, o Senado aprova o texto enviado pela Câmara [4]. A Lei era condição necessária para a repatriação dos brasileiros a serem trazidos do epicentro do coronavírus, a cidade chinesa de Wuhan [5]. Em termos de conteúdo, ela traz previsões de isolamento, quarentena, realização compulsória de exames, restrição de movimentação de cidadãos, requisição de bens e serviços privados, dispensa de licitação para produtos e serviços relacionados ao enfrentamento da emergência sanitária e compartilhamento de dados entre órgãos e entidades da administração pública. Até empresas deverão prestar informações à administração se requisitadas pela administração [6]. Além disso, fica previsto que a lei vigorará pelo tempo que durar o estado de emergência internacional decorrente da covid-19. Em 20/03, novos poderes de emergência são criados com o Decreto Legislativo nº 6 [veja aqui]. Dois dias depois, a Medida Provisória nº 926 [veja aqui] alterou dispositivos da Lei em questão. Em 08/07 é publicada a Lei 14.023/20 [7], que trata de emenda à Lei da Quarentena, apresentando relação de 27 categorias profissionais tidas como ‘essenciais’ para o combate ao coronavírus, as quais passam a receber equipamentos gratuitos de proteção ao vírus e prioridade na realização de testes e diagnósticos da doença. A lista inclui profissionais da saúde, de segurança e de limpeza em geral, biólogos, biomédicos, farmacêuticos e outros [8].
Leia as análises sobre a ‘Lei da Quarentena‘ e gastos do governo com a dispensa de licitações.
Bolsonaro edita medida provisória (MP 926) [1], que inclui na Lei da Quarentena [veja aqui], entre outros aspectos [veja aqui], a dispensa de licitação. Com ela, há possibilidade de aquisição de bens, serviços, inclusive de engenharia e insumos, desde que relacionados ao enfrentamento da pandemia. Além disso, é possível que, excepcionalmente, empresas inidôneas sejam contratadas para prestar serviços em geral, caso não haja outras fornecedoras, e também não sejam feitas estimativas de preço prévias se houver justificativa [2]. Por último, fica estabelecida também presunção da urgência dessas contratações e do risco que a demora na celebração dos contratos poderia trazer [3].
Leia a análise sobre os impactos da MP nas contratações públicas.
Impulsionado por pedido do presidente na Mensagem nº 93/2020 do dia 18/03 [1], a Câmara [2] e o Senado [3] aprovam o Decreto Legislativo nº 6/2020 [4] que reconhece estado de calamidade pública no país para fins fiscais. Fica declarado o estado de calamidade pública até 31/12/2020, sem previsão de prorrogação. O decreto prevê a criação de Comissão Mista do Congresso para acompanhar a situação fiscal e a execução orçamentária das medidas relacionadas à pandemia do novo coronavírus. Na prática, o governo é dispensado de cumprir com a meta de déficit primário estabelecido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020 [5] e com a obrigatoriedade de limitação de empenho e movimentação financeira decorrentes do não atingimento bimestral das metas de resultado primário ou nominal, conforme estipula a Lei de Responsabilidade Fiscal [6]. Vale notar que a declaração de calamidade pública do Decreto serviu de base legal para a implementação de outras medidas excepcionais, como aquelas pautadas na MP 927 [veja aqui], que afetam a regulamentação trabalhista no país.
Leia as análises sobre o que significa a decretação de calamidade pública, as diferenças entre instrumentos de emergência e o impacto do decreto na realização do orçamento do país após quase três meses.
A Advocacia-Geral da União (AGU) entra com ação no Supremo Tribunal Federal (ADPF 663) solicitando que os prazos das Medidas Provisórias (MPs) editadas pelo presidente da República sejam suspensos por 30 dias, tendo em vista a crise gerada pelo coronavírus e a possibilidade de prejuízo na apreciação das medidas pelo Congresso Nacional [1]. Entidades da sociedade civil se manifestam na ação contra a alteração do rito de aprovação, sob argumento de que as mudanças propostas excluiriam a participação da sociedade civil nos processos legislativos [2]. O ministro do STF, Alexandre de Moraes, nega o pedido e determina apenas alterações nos regimes de deliberação e votação das MPs, adaptando-os ao sistema de votação remota. O principal argumento da decisão é a inexistência de previsão constitucional que ampare o pedido da AGU [3]. Após a decisão do STF, Câmara e Senado emitem ato conjunto a respeito do regime de tramitação de MPs durante a pandemia [veja aqui].
Medida provisória (MP 928) [1] altera a Lei da Quarentena (Lei 13.979/20 [veja aqui]) e reflete mudanças na Lei de Acesso à Informação (LAI) sobre medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública [2], resultando na suspensão de prazos da Administração Pública para responder a pedidos de informação, além de extinguir a possibilidade de recursos desses pedidos durante o estado de calamidade pública. Assim, os pedidos de informações ao Estado, previstos na LAI, ficam suspensos, dando-se prioridade aos relacionados às medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública provocada pelo coronavírus. A determinação vale para órgãos e entidades que estiverem em quarentena ou funcionando por teletrabalho, desde que as respostas dependam de trabalho presencial ou de agente público envolvido com medidas de enfrentamento ao coronavírus [3]. Entidades e juristas [4] criticam a medida, apontando que a MP não apresenta exposição de motivos para alterar a LAI e a falta de diálogo com a sociedade civil para sua elaboração [5]. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, decide suspender as alterações promovidas pela MP e, posteriormente, a decisão é confirmada pelo plenário do STF em 30/04 [6]. Em 20/07, o Congresso Nacional não aprova a transformação da MP em lei e a medida tem sua vigência encerrada [7].
Leia análise de críticas à alteração na LAI, como isso se liga a resquícios autoritários na democracia, como o acesso à informação tem sido tratado por outros países no contexto da pandemia, os desafios em relação à transparência e sistemas eletrônicos de informação e veja relatório de pesquisa sobre como a covid-19 tem afetado o direito à informação
Após a Medida Provisória 928 ter suspendido os prazos de resposta aos pedidos baseados na Lei de Acesso à Informação (LAI) e gerado intensa reação negativa da sociedade civil [veja aqui], o ministro da Controladoria-Geral da União (CGU) defende a MP [1] e afirma que o trabalho de contratação e logística envolvendo o coronavírus não pode ser interrompido por respostas a LAI [2]. Desde então, o governo Bolsonaro tem utilizado a argumentação da CGU para negar requerimentos de deputados federais para a entrega de relatórios de monitoramento de redes sociais feitos a pedido da Secretaria Especial de Comunicação [3]. Especialistas em transparência pública e dados abertos, no entanto, classificaram a Medida Provisória editada pelo presidente como desnecessária, equivocada e desproporcional [4].
Leia análise sobre como funciona a Lei de Acesso à Informação em governos com resquícios autoritários.
Instrução Normativa do Ministério do Meio Ambiente [1] prorroga prazo de 31 de março para 29 de junho de 2020 para que empresas e pessoas físicas apresentem ao Ministério do Meio Ambiente relatório de atividades poluidoras ou de utilização de recursos ambientais, referente às atividades desenvolvidas em 2019 [2]. Em outras oportunidades, o Ministério do Meio Ambiente anistiou desmatadores e autorizou produção em áreas de preservação permanente [veja aqui], e alterou regras processuais sobre denúncias de irregularidades ambientais possibilitando a identificação de denunciantes .
Leia as análises sobre a política ambiental praticada no primeiro ano da gestão Bolsonaro e os ataques realizados aos órgãos de proteção ambiental.
Portaria do Ministério da Justiça e Segurança Pública [1] suspende os processos administrativos punitivos das áreas de controle de armas e atividades de segurança privada, enquanto perdurar o estado de calamidade pública. Além disso, a medida também prorroga até 12 de junho de 2020 os prazos dos processos sobre registros de armas de fogo, autorizações de posse e porte de armas, e funcionamento de empresas de segurança privada [2]. Na sequência, nova portaria [3] prorroga os prazos de 12 de junho para 3 de agosto de 2020 [4]. Posteriormente, outra portaria [5] estende os prazos até 31 de agosto deste ano [6].
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Após pedido feito pela AGU de suspensão do prazo de medidas provisórias por 30 dias, negado pelo STF [veja aqui], a Câmara dos Deputados e o Senado Federal emitem Ato Conjunto [1] responsável por flexibilizar o regime de tramitação de MPs durante a pandemia da covid-19. As alterações permitem que o período máximo para análise das MPs possa ser reduzido de 120 para até 16 dias, além de dispensar a primeira etapa de tramitação, isto é, a votação por comissão mista, formada pelas duas casas [2]. O ato é criticado por entidades da sociedade civil, que apontaram redução da participação civil no processo legislativo por conta das alterações promovidas no rito de tramitação [3].
Leia análise sobre a incompatibilidade da flexibilização da tramitação de MPs e premissas democráticas previstas na Constituição de 1988.
Estudo revela baixa transparência por parte da maioria dos estados brasileiros a respeito de informações básicas sobre a covid-19 [1]. Dentre os dados, destaca-se a falta ou imprecisão do número de testes realizados, disponibilidade de leitos de UTI, quantidade de infectados e mortos decorrentes do coronavírus. A análise conclui que cerca de 90% dos estados não tornam públicos dados que possibilitam o acompanhamento em detalhes da pandemia no Brasil [2]. O estado de São Paulo, epicentro brasileiro da pandemia com cerca de 40% das mortes confirmadas no país até a presente data, figura apenas na 10ª posição do ranking de transparência [3]. Já na cidade do Rio de Janeiro, levantamento médico na Rocinha aponta 145% de mortes a mais do que em divulgação feita pela prefeitura do Rio [4]. Em decorrência, estados e municípios afirmaram alto nível de subnotificação ao Ministério da Saúde dos casos de contaminação e mortes por covid-19, dificultando a construção do panorama nacional da pandemia e o controle pelo governo federal [5]. Moradores do morro do Borel, no Rio, lançaram o projeto ‘CoronaZap’ que visa identificar a contaminação do coronavírus na comunidade em combate à subnotificação da prefeitura [6]. A falta de divulgação de dados sobre o vírus também acontece no nível federal [veja aqui].
Leia análise sobre os riscos decorrentes de fake news e falta de informações no contexto da pandemia, entrevista com epidemiologista que explica a discrepância entre os números de contaminados na realidade e os divulgados pelos órgãos públicos, e veja como ranking de transparência pressiona os estados a divulgarem dados sobre a covid.