A atriz e cantora Linn da Quebrada, ativista transexual, tem a gravação do clipe de seu novo single ‘Oração’ interrompido pela polícia, a despeito da autorização que obteve junto à prefeitura para realizar a produção em uma igreja abandonada [1]. No dia da gravação, aparecem duas viaturas policiais e um homem que se dizia proprietário do local, os quais ameaçam a produção dizendo que quebrariam todos os equipamentos caso não se retirassem do local [2]. Só foi possível prosseguir com a filmagem após a chegada de um advogado e o grupo tem apenas uma hora para realizá-la [3]. Linn lamenta que a execução da filmagem não foi como havia planejado e afirma que se trata de um caso de censura: ‘O que é censura, senão a proibição dos nossos corpos de ocupar um espaço? E, além da censura, é uma violência sobre quem pode e quem não pode’ [4]. Linn ressalta que diversas pessoas já gravaram naquele local e não tiveram problemas, e que o fato da produção ser composta por travestis foi o principal fator para que a filmagem fosse obstaculizada [5]. Dias antes, Linn teve um show cancelado na Parada LGBT de João Pessoa, em razão de seu discurso político [6]. Os acontecimentos se inserem em um conjunto de casos de restrição da liberdade artística com temática LGBT, como ocorreu na exposição do Centro Cultural Banco do Nordeste [veja aqui] e na Caixa Cultural [veja aqui]. Em outro momento, o show da banda BNegão & Seletores de Frequência foi interrompido pela Polícia Militar, pois o cantor BNegão fazia críticas à conduta da polícia, aos ataques nas aldeias indígenas [veja aqui].
Veja aqui o clipe da música ‘Oração‘ de Linn da Quebrada, ouça a análise sobre a censura nas produções culturais e leia a análise sobre as performances de Linn da Quebrada.
A empresa BB DTVM, gestora de fundos de investimentos do Banco do Brasil, abre edital visando a selecionar filmes que receberão investimentos com base na Lei do Audiovisual [1]. O formulário de inscrição inova ao adicionar três perguntas que não estavam previstas na mesma oferta de recursos nos anos de 2018 e 2017 [2]. As novas perguntas, previstas no campo ‘informações adicionais’, questionam se o filme exibe ‘cenas de nudez ou de sexo explícito’, se faz referência a ‘crimes, drogas, prostituição ou pedofilia’ e se ‘tem cunho religioso ou político’ [3]. O Sindicato dos Bancários de São Paulo critica o teor das perguntas, afirmando que a medida é uma tentativa de censura e que o Banco do Brasil deveria ‘zelar pela pluralidade de ideias e de temas’ [4]. Em nota, o Banco do Brasil afirma que o edital privilegia a alocação de recursos ‘da melhor maneira possível’ [5]. Vale notar que o contexto é marcado por medidas de controle nas produções culturais. Em janeiro, o governador do Rio de Janeiro censurou peça de teatro com cena de nudez [veja aqui], em abril, Bolsonaro vetou campanha publicitária do Banco do Brasil que tinha como objetivo representar a diversidade racial, sexual e de gênero [veja aqui], em julho, ameaçou extinguir a Agência Nacional do Cinema (Ancine) se não pudesse filtrar as produções nacionais [veja aqui] e, em agosto, o governo suspende edital federal para televisão em razão da presença de produções com temática LGBT [veja aqui]. No ano seguinte, o secretário de cultura anuncia prêmio das artes e repete padrões nazistas [veja aqui].
Leia a análise sobre as censuras do governo Bolsonaro na área da cultura no ano de 2019
Em cerimônia de inauguração da duplicação da BR-116, o presidente Jair Bolsonaro afirma que o ‘cocozinho petrificado de um índio’ atrapalha a realização de obras [1]. O Presidente faz referência a uma construção no Paraná que depende de laudo de órgão governamental para prosseguir, mas não fornece informações precisas [2]. Em caso de áreas indígenas, a Funai tem a prerrogativa constitucional de participar e produzir laudos nos licenciamentos de obras [3]; em caso de áreas de valor arqueológico, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) deve intervir [4]. O Presidente complementa sua fala: ‘tem que integrar o índio na sociedade e buscar projeto para nosso país’ [5], como também já havia mencionado em outras vezes [veja aqui]. No mês seguinte, o presidente se manifesta contrário à demarcação de terras [veja aqui] e, em novembro, é denunciado no Tribunal Penal Internacional por incitar a violência contra comunidades indígenas [veja aqui]. Na semana anterior, Bolsonaro recomendou, de forma irônica, que as pessoas fizessem ‘cocô dia sim, dia não’ para combater a poluição ambiental [veja aqui]. No ano seguinte, em reunião ministerial [veja aqui], Bolsonaro volta a citar ‘coco petrificado’ como impeditivo para realização de obra e critica a atuação do Iphan, afirmando que o órgão ‘para qualquer obra do Brasil’ [6]. Na oportunidade, a Sociedade de Arqueologia Brasileira afirma que o Presidente demonstra ‘total falta de conhecimentos dos processos e nenhuma preocupação com as heranças culturais deixadas’ [7].
Leia as análises sobre a relação do governo Bolsonaro com os povos indígenas e como sua política vai na contramão do proposto pela Constituição de 1988.
A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, edita Portaria [1] que extingue seis órgãos colegiados considerados como não prioritários pela sua gestão [2]. Entre eles, destacam-se o de Gênero, cuja finalidade residia na promoção de ações para prevenir a violência de gênero e o de Diversidade e Inclusão, com a função era combater a violência contra LGBTs e outras minorias [3]. A medida segue o caminho adotado por outros ministérios a partir do decreto [4] de Bolsonaro determinando a revisão da permanência de colegiados [veja aqui] [5], muitos deles formados por membros da sociedade civil [6]. Em outras oportunidades, o governo interveio nos Conselhos Nacionais dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) [veja aqui], do Meio Ambiente (Conama) [7] [veja aqui] e de Políticas sobre Drogas (Conad) [veja aqui]. A ministra tem uma relação conturbada com o tema de gênero e minorias, já tendo exposto seu posicionamento conservador nessa temática ao criticar a suposta ‘ideologia de gênero’ [veja aqui] e, desde que esteve à frente do Ministério, Damares não investe na construção da Casa da Mulher Brasileira – responsável pelo atendimento a mulheres vítimas de violência [8]. Além disso, a ministra edita nova Portaria extinguindo pontos importantes de respeito aos direitos humanos em empresas e entidades [veja aqui].
Leia as análises sobre as medidas de Damares à frente do Ministério, o tratamento dado pela ministra em temas como violência contra a mulher e política de direitos LGBT, bem como a importância da Casa da Mulher Brasileira.
O presidente Jair Bolsonaro, em vídeo transmitido ao vivo nas redes sociais, critica obras audiovisuais que participam de edital de chamamento para TVs públicas na categoria ‘diversidade de gênero’ e aguardam autorização da Agência Nacional do Cinema (Ancine) [1]. Na ocasião, ele afirma que ‘garimpou’ filmes da agência que estavam na fase de captar recursos e diz que não vai liberar verbas [2], defendendo que seria um dinheiro ‘jogado fora’ por suposta falta de audiência [3]. Declara, ainda, que se a Ancine não fosse constituída por cargos com mandatos, ele já teria ‘degolado tudo’. Atualmente, a diretoria do órgão possui três pessoas com mandatos de 4 anos [4]. Dias depois (21/08), o Ministério da Cidadania suspende o edital de chamamento que já estava na fase final de seleção das produções e, no mesmo dia, o Secretário da Cultura pede demissão em razão de interferência indevida do governo na área [veja aqui]. As declarações são repudiadas pela associação de produtores de audiovisual [5] e pela equipe de um dos filmes citados pelo presidente [6], em que é denunciada a censura imposta aos projetos que buscam discutir a diversidade sexual. Vale notar outras medidas de interferência na área cultural. O governador do Rio de Janeiro censura peça de teatro com cena de nudez [veja aqui], Bolsonaro transfere conselho de cinema a ministério com gabinete no Palácio do Planalto e ameaça extinguir Ancine se não puder filtrar as produções [veja aqui] e veta campanha publicitária do Banco do Brasil que representava a diversidade racial, sexual e de gênero [veja aqui].
Leia as análises sobre as estratégias do governo Bolsonaro vistas como censura a produções culturais, os efeitos dessas ações para o cinema nacional e ouça o poscast sobre a caracterização de censura.
Damares Alves, ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, edita Portaria [1] para extinguir pontos do Código de Conduta e de Respeito aos Direitos Humanos para Fornecedores de Bens e de Serviços, cuja finalidade reside em garantir ‘conduta mínima ética, sustentável e respeitosa aos Direitos Humanos’ que se espera das empresas que fazem parcerias com o Ministério [2]. O Código [3], criado no governo de Michel Temer, define 12 princípios orientadores que devem ser seguidos, tais como o resguardo da igualdade salarial para cargos com atribuições semelhantes, independente de gênero, etnia, orientação sexual e o respeito à diversidade humana, com a adoção de políticas que viabilizem o preenchimento de vagas por minorias. O decreto que instituiu o Código previa a obrigatoriedade de especificação desses princípios em editais e contratos [4]. A Portaria, no entanto, derruba a obrigatoriedade, inclusive extinguindo a exigência de apresentação de relatório, com três meses de antecedência, sobre a implementação dos parâmetros previstos no Código pelas empresas [5]. Vale notar que, no mesmo mês, Damares exonera coordenadora geral do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) após críticas ao governo [veja aqui] e, em setembro, assina portaria que altera diretrizes e ações estratégicas em direitos humanos objetivada pelo Ministério [veja aqui]. Em dezembro, o procurador-geral da República também afasta representante do Ministério Público do CNDH, o que é interpretado como nova forma de pressão [veja aqui].
Leia as análises sobre as medidas de Damares à frente do Ministério, o tratamento dado pela ministra em temas como direitos humanos e o relatório com as recomendações ao Brasil do Grupo de Trabalho da ONU sobre empresas e Direitos Humanos.
O governo federal suspende edital de seleção de projetos audiovisuais [1], após o presidente Jair Bolsonaro afirmar que não permitiria que a Agência Nacional do Cinema (Ancine) liberasse verbas para certas produções com temáticas LGBT [veja aqui]. O presidente afirmou que seria um ‘dinheiro jogado fora’ e que ‘não tem cabimento fazer um filme com esse tema’ [2]. A Associação de Produtores Independentes do Audiovisual (API) repudia as declarações do presidente, pois ‘não cabe a ninguém, especialmente ao presidente de uma república democrática, censurar artes, projetos visuais e filmes’ [3]. A suspensão ocorre por meio de portaria [4], que prorroga o edital por 180 dias, para recompor os membros do Comitê Gestor do Fundo Setorial do Audiovisual (CGFSA) [5]. A medida determina que haverá revisão dos critérios e diretrizes para a aplicação dos recursos do Fundo e dos critérios de apresentação de propostas de projeto e seus parâmetros de julgamento [6]. Frente ao episódio, o secretário especial de Cultura do Ministério da Cidadania, Henrique Pires, pede demissão, afirmando que não concordaria com filtros culturais e que se trata de um caso de censura [veja aqui]. Em outubro, o Ministério Público Federal move ação contra o ministro da Cidadania, requerendo a anulação da portaria [7], a qual é acatada pela Justiça Federal em decisão liminar; o processo aguarda sentença final [8]. Em outras oportunidades, a Caixa Cultural cancelou eventos com temática LGBT e democracia [veja aqui] e o Centro Cultural Banco do Nordeste retirou obra sobre casamento gay de exposição [veja aqui].
Leia a análise sobre patrulha ideológica na arte e sobre a censura nas ações do governo na área cultural.
O Presidente Jair Bolsonaro endossa postagem no Facebook que ridiculariza a Primeira-dama francesa, Brigitte Macron. O post contém uma imagem comparando a Primeira-dama brasileira e a francesa por suas aparências com os dizeres ‘Entende agora porque Macron persegue Bolsonaro?’. Em resposta, Bolsonaro escreve ‘Não humilha cara. Kkkkkkk’ [1]. O Presidente francês, Emmanuel Macron, questiona se Bolsonaro está ‘à altura’ do cargo’ [2]. Bolsonaro justifica que o comentário visa repreender o internauta [3]. A resposta é apagada para evitar ‘dupla interpretação’ [4]. Em outra situação, o Ministro da Economia defende o Presidente e chama a Primeira-dama francesa de feia [5]. Especialistas em gênero criticam o comportamento do Presidente [6] e a filha de Brigitte Macron lança a hashtag #balancetonmiso para que as mulheres denunciem a misoginia [7]. Bolsonaro também já se referiu de forma misógina à Deputada Maria do Rosário quando ainda deputado [8] e à jornalista Patricia Campos Mello neste ano [veja aqui]. O acirramento da relação entre Bolsonaro e Emmanuel Macron, teve início quando o francês publicou em sua conta no Twitter sobre os incêndios que acometeram a Amazônia em 2019 [9] e convocou o G7 para discutir a situação [10]. Macron foi chamado de ‘idiota’ e ‘cretino’ pelo Deputado Eduardo Bolsonaro e pelo Ministro Abraham Weintraub e de ‘colonialista’ por Bolsonaro [11]. Também foi alvo de críticas no discurso do Presidente brasileiro na ONU [veja aqui]. Todos os atos foram repudiados pela mídia internacional [12].
Leia sobre outras situações em que Jair Bolsonaro deu declarações de cunho sexual e machista e como o padrão de beleza afeta o gênero feminino.
Durante encontro com os governadores dos estados da Amazônia Legal, o presidente Jair Bolsonaro critica a política de demarcação de terras indígenas [1], como fez em outros discursos [veja aqui]. Ele afirma que os governos anteriores foram irresponsáveis ao usar ‘o índio como massa de manobra’ e criar obstáculos para a atuação dos estados [2]. Bolsonaro defende que a demarcação das terras indígenas tem ‘aspecto estratégico’ para inviabilizar o Brasil economicamente e afirma que os países estrangeiros querem interferir na soberania brasileira [3]. Bolsonaro volta a criticar o presidente francês Emmanuel Macron por suscitar a internacionalização da Amazônia [4] e o Ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) afirma que Macron tem ‘posição colonialista’ [5]. A expectativa era de que o encontro versasse sobre os incêndios na Amazônia, que atingiram o maior número de focos dos últimos nove anos [6], mas Bolsonaro não dá centralidade ao tema e acusa aqueles que desejam a demarcação de terras de incendiarem a floresta [7]. Os governadores presentes têm opiniões divergentes sobre a fala de Bolsonaro [8]; alguns deles defendem que o país aceite os recursos oferecidos por países estrangeiros [9] e utilize o Fundo Amazônia [10]. No dia anterior, nas redes sociais, Bolsonaro escreveu que iria revelar ‘a verdade’ sobre os interesses estrangeiros na Amazônia [11]. Em outras oportunidades, Bolsonaro transfere a demarcação das terras indígenas para o Ministério da Agricultura [veja aqui], diz que pretende explorar a mineração em terras indígenas [veja aqui], acusa ONGs de promoverem incêndios na Amazônia [veja aqui] e afirma que o desmatamento é cultural [veja aqui].
Leia as análises sobre o resultado da reunião de governadores com Bolsonaro e como o governo traz à tona a antiga política indigenista
O presidente Jair Bolsonaro envia ao Congresso Nacional o projeto de Lei Orçamentária de 2020 que reduz em 18% – de 122 bilhões em 2019 para R$ 101 bilhões em 2020 – os recursos totais do Ministério da Educação (MEC), atingindo desde a educação básica até a pós-graduação [1]. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), responsável por financiar pesquisadores da pós-graduação, sofrerá o maior corte, com perda de metade do orçamento [2]. Algumas das universidades do país que concentram grande número de pesquisas acadêmicas perderão valores significativos no orçamento, como a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e a UnB (Universidade de Brasília), com previsão de uma redução de 24% cada e a UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), com redução de 23,5% [3]. A Lei Orçamentária também afetará programas sociais, como a Minha Casa Minha Vida – que passará a ter o menor orçamento da história do programa – e o Bolsa Família – que atenderá menos famílias [4]. Em dezembro, o Congresso aprova o orçamento da União para 2020 [5], elevando para R$102,9 bilhões os recursos do MEC [6] e, em janeiro do ano seguinte, a lei é sancionada por Bolsonaro [7]. Vale notar que essa política de redução no orçamento nessas áreas está alinhada com o projeto político do governo federal que, em maio, havia bloqueado bolsas de pós-graduação oferecidas pela Capes [veja aqui], reduz concessões ao Programa Bolsa Família, de modo que a fila de espera alcança 1 milhão [veja aqui], além de esconder dados sobre a redução do programa [veja aqui]. Em 2020, Bolsonaro quer reduzir o orçamento de 2021 da educação para aumentar os gastos com a área da Defesa [veja aqui].
Leia as análises sobre os efeitos no corte de bolsas na área da ciência e a aprovação do orçamento mais restritivo dos últimos anos.