Por acúmulo de atos, entidades brasileiras de defesa dos direitos humanos representam contra o presidente Jair Bolsonaro por crimes contra a humanidade no Tribunal Penal Internacional (TPI), encarregado de julgar governantes que cometem crimes no âmbito internacional [1]. A petição [2] cita o incentivo à grilagem e garimpagem em terras indígenas , além de mencionar a politica antiambiental do presidente , que além de ter discursos mitigando a importância do meio ambiente e o aumento do desmatamento na Amazônia [veja aqui], também enfraquece órgãos ambientais por meio de normativas [veja aqui]. A gestão do governo Bolsonaro violou diversas vezes o Programa Nacional de Direitos Humanos [3], segundo o Conselho Nacional de Direitos Humanos que produz parecer com diretrizes para uma Política de Estado dos Direitos Humanos [veja aqui]. O Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu) [4] e a Comissão Arns [5], responsáveis pela representação, acusam o presidente de incitar violência contra populações indígenas e tradicionais, enfraquecendo a fiscalização e omitindo na resposta a crimes ambientais [6]. No ano seguinte, o presidente volta a ser representado no TPI por sua gestão na crise da covid-19 [7] [veja aqui] e é denunciado na Corte Interamericana de Direitos Humanos por insultar a memória de vitimas do regime da ditadura no Brasil [veja aqui] [8].
Leia mais sobre a opinião de ex-juíza brasileira do Tribunal Penal Internacional e análise da queixa contra Bolsonaro no TPI.
O Fundo Amazônia [1] termina 2019 com 2,2 bilhões de reais paralisados, enquanto o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pede recursos internacionais para financiamento da preservação do meio ambiente [2] e pensa em criar novo fundo [3]. As atividades foram paralisadas após o governo destituir o comitê que fazia a seleção dos projetos para o fundo [4], decisão que leva os dois maiores países financiadores do fundo, Alemanha e Noruega, a bloquearem o repasse de doações [5]. O fundo não aprova projetos em 2019 [6], enquanto 4 propostas já haviam sido outorgadas em 2018 até o mês de agosto [7]. A paralisação das atividades prejudica apresentação de projeto por associações representativas dos indígenas[8]. Por causa da paralisação das atividades, povos indígenas passam a conviver com grande aumento no número de garimpeiros, invasores e madeireiros ilegais [9]. Devido ao aumento histórico do desmatamento na Amazônia [veja aqui], no ano seguinte, partidos políticos ajuízam ação direta de inconstitucionalidade por omissão devido a paralisação do Fundo Amazônia [10]. Em seguida, o Supremo Tribunal Federal questiona a omissão do governo Bolsonaro referente a proteção ambiental [11]. Além do mais, 50 organizações da sociedade civil, escrevem carta para o Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDS) requeredo a que os recursos do Fundo Amazônia sejam liberados visando a mitigação das consequências causadas pela covid-19 e o desmatamento [12]. Vale lembrar que outras medidas do governo que favoreceram o desmatamento [veja aqui] e mitigaram a proteção dos indígenas .
Leia mais sobre os principais acontecimentos envolvendo o Fundo Amazônia em 2019, como foram afetadas as comunidades rurais que eram maiores beneficiadas dos recursos do Fundo e como afetou também as comunidades tradicionais.
O Ministro da Justiça, Sérgio Moro, baixa portaria que autoriza a atuação da Força Nacional de Segurança Pública (FNS) no estado do Maranhão com o objetivo de proteger membros dos povos indígenas Guajajara após assassinato de dois de seus membros [1], no entanto, a medida se restringe às terras indígenas de Cana Brava, local dos assassinatos, excluindo da proteção a terra indígena Arariboia que também registra intervenções violentas de madeireiros [2]. Desde novembro, com o assassinato do Guajajara e guardião da floresta Paulo Paulino [3] por madeireiros invasores, a região do Arariboia registra aumento de ameaças e sentimento de insegurança pela população isolada [4]. A atuação estatal no Arariboia se restringiu à retirada de outros três guardiões da floresta pelo governo do Maranhão e ao envio da Polícia Federal para investigar o assassinato de Paulino [5]. A necessidade de mobilização da FNS para a região é confirmada pelo especialista Carlos Travassos, para quem ‘a invasão pode realmente ter se intensificado após a morte de Paulo’ [6]. A despeito dos pedidos por maior segurança, Moro justifica a restrição da medida para Cana Brava em razão da solicitação da Fundação do Índio (Funai), a qual apenas mencionava essa região [7]. A Funai confirma e diz que poderá solicitar posteriormente a FNS para outras áreas [8]. Vale notar que o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) registra 06 assassinatos de índios Guajajara em 2019 [9]; e que os ataques de invasores ocorrem em contexto de enfraquecimento das políticas de demarcação de terras indígenas [veja aqui] e de discursos do presidente que deslegitimam o assassinato de indígenas [veja aqui] [veja aqui].
Leia análise sobre quem são os guardiões da floresta sob ameaça de madeireiros e entenda os impactos da falta de proteção estatal sobre os Guajajaras.
Ao comentar o aumento no preço da carne, o presidente Jair Bolsonaro defende a criação de gado em terras indígenas como medida para a redução dos preços e afirma que pretende incluir a permissão para agricultura e pecuária comerciais no Projeto de Lei que será encaminhado ao Congresso Nacional de liberação da mineração nas reservas indígenas [1]. O Presidente chama o projeto de ‘Lei Áurea para o Índio’, pois ‘o índio vai poder fazer tudo na sua terra, que nem o fazendeiro faz na dele’ [2]. A proposta enfrenta resistência de parlamentares [3]. Em 2019 o número de invasões em terras indígenas cresceu em relação aos anos anteriores, até setembro foram registradas 160 invasões, enquanto no ano todo de 2018 foram registradas 111 [4]. Na Câmara dos Deputados tramita PEC apoiada pela bancada ruralista que permite o arrendamento e exploração agropecuária de terras indígenas [5]. A fala do Presidente se insere nas demais medidas do governo de desmonte das políticas de proteção de terras indígena, como a defesa da exploração mineral nessas áreas [veja aqui], a desestruturação do Incra em favor dos ruralistas [veja aqui], a revogação do decreto que impedia a expansão do plantio de cana nas reservas [veja aqui], a paralisação do Fundo Amazônia [veja aqui] e a liberação da pesca esportiva em áreas protegidas [veja aqui]. O presidente foi alvo de representação no Tribunal Penal Internacional por implementar políticas predatórias contra indígenas [veja aqui] e edita Medida Provisória que estimula a grilagem de terras [veja aqui]. Em 2020, o Projeto de Lei citado por Bolsonaro é encaminhado ao Congresso Nacional [veja aqui].
Leia a análise sobre como as medidas do governo Bolsonaro relembram a antiga política indigenista.
O desembargador Benedicto Abicair, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), determina, em decisão liminar, a suspensão da exibição e divulgação publicitária do programa ‘Especial de Natal: A Primeira Tentação de Cristo’ da produtora Porta dos Fundos, atendendo a pedido da associação católica Centro Dom Bosco de Fé e Cultura [1]. O programa foi extremamente criticado por religiosos ao representar Jesus Cristo como homossexual e de satirizar outras figuras bíblicas relevantes [2]. O magistrado argumenta que a liberdade de expressão não é absoluta e que a suspensão é adequada para ‘acalmar os ânimos’ e mais benéfica para a sociedade brasileira de maioria cristã [3]. Em primeira instância o pedido foi negado, pois, ao sopesar o direito à proteção do sentimento religioso e da liberdade de expressão artística, a juíza entendeu que a proibição da exibição só poderia ocorrer caso houvesse ‘a prática de ilícito, incitação à violência, discriminação e violação de direitos humanos nos chamados discursos de ódio’ [4]. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, se posiciona contra a decisão liminar do TJRJ, afirmando que se trata de cerceamento à liberdade de expressão [5]. Dias antes, a sede do Porta dos Fundos foi alvo de um atentado com bombas caseiras em represália ao programa [6], a produtora declara em nota que condena qualquer ato de violência e afirma que ‘o país sobreviverá a essa tormenta de ódio’ [7]. Em novembro de 2020, o Supremo Tribunal Federal decide, em caráter definitivo, que o Especial de Natal do Porta dos Fundos não incita a violência e deve ser exibido [8]. Outros episódios de violações à liberdade artística são vistos no Congresso Nacional, onde um deputado quebrou uma placa com charge crítica à atuação da polícia em exposição [veja aqui], e no Itamaray, pois a diplomacia brasileira solicitou a retirada de filme sobre o cantor Chico Buarque de festival de cinema internacional [veja aqui].
Leia as análises sobre a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro no caso Porta dos Fundos e qual o conceito de liberdade de expressão artística para o direito.
Roberto Alvim, então Secretário de Cultura, lança vídeo em que divulga o Prêmio Nacional das Artes em rede social da Secretaria Especial de Cultura. Por usar referências ao Ministro da Propaganda de Hitler, Joseph Goebbels, o discurso é duramente criticado nacional [1] e internacionalmente [2]. A reação resulta na demissão de Alvim no dia seguinte [3]. Manifestaram-se, por exemplo, o Pacto pela Democracia [4], a Confederação Israelita do Brasil [5], o presidente da OAB [6], a Embaixada da Alemanha no Brasil [7] e o presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia [8]. Em seguida, é suspenso o edital do Prêmio lançado pelo ex-Secretário no vídeo [9]. Por outro lado, um advogado não ligado ao ex-Secretário impetra Habeas Corpus ao STF pedindo suspensão da exoneração de Alvim, sob alegação de que não teria havido contraditório e o exonerado teria sido ‘execrado’ publicamente [10]. Em 06/04/2020 o STF nega a tutela requerida [11]. Vale lembrar que, quando recém empossado em novembro de 2019, o ex-Secretário fez discurso na UNESCO que chamou atenção de delegações estrangeiras por seu tom ultraconservador [veja aqui].
Leia as análises sobre a comparação do discurso de Alvim e de Goebbels, a aceitação desse tipo de discurso no cenário político atual, segundo historiadores, os paralelos com o contexto cultural da Hungria e os paralelos com o período alemão pré-nazista.
Ao comentar sobre a criação do Conselho da Amazônia e as medidas para a proteção de terras indígenas, o presidente Jair Bolsonaro afirma que ‘com toda a certeza, o índio mudou. Está evoluindo. Cada vez mais, o índio é um ser humano igual a nós’ e defende que os povos indígenas se integrem à sociedade e sejam ‘donos’ das suas terras [1]. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) entra com uma representação contra Bolsonaro pelo crime de racismo e o advogado da instituição diz que a fala do presidente demonstra uma ideia colonial de desumanização e legitima ações contra os direitos dos povos indígenas [2]. No início do mês, o presidente tenta transferir a demarcação de terras indígenas e quilombolas para o Ministério da Agricultura (MAPA), medida que foi criticada por representante indígena Karajá na ONU por ser ‘integracionista, colonialista e racista’ e é rejeitada pelo Congresso [veja aqui]. Bolsonaro repete o discurso de ‘integração do índio a sociedade’ ao tentar novamente transferir a demarcação de terras para o MAPA, o que é vetado pelo Supremo Tribunal Federal [veja aqui], e ao criticar ocupações indígenas por obstarem a realização de obras [veja aqui]. O presidente discursa na ONU contra a extensão da demarcação das terras indígenas, oportunidade em que afirma que ‘é preciso entender que nossos nativos são seres humanos’ [veja aqui], defende a exploração pecuária [veja aqui] e mineral [veja aqui] nessas áreas e envia projeto de lei que autoriza atividades econômicas nas reservas [veja aqui]. Além disso, a Funai fica sob os interesses dos ruralistas [veja aqui] e o secretário do MAPA afirma que os indígenas são os maiores latifundiários do país [veja aqui]. Em outubro do ano seguinte, David Thiel, funcionário de alto escalão do Facebook – plataforma que sediava o vídeo de Bolsonaro – inicia processo interno para questionar a permanência do conteúdo na rede social, requerendo a remoção por identificar discurso ‘desumanizador’ contra população indígena [3]. A resposta à solicitação de remoção do vídeo é negativa e, em reação, Thiel pede demissão [4]. Após a saída do ex-funcionário, o Facebook afirma que teria mudado de opinião e emite nota afirmando compromisso com a proibição de discursos de ódio [5].
Leia as análises sobre o que significa a ‘integração’ dos povos indígenas – por veículo midiático alinhado com políticas de esquerda, como a política integracionista vai na contramão da Constituição de 1988 e como o governo Bolsonaro reproduz a antiga política indigenista brasileira.
A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, lança oficialmente a campanha que promove a abstinência sexual entre jovens na Semana Nacional de Prevenção à Gravidez Precoce em conjunto com Ministério da Saúde [1]. A política com o logo ‘tudo tem seu tempo’, estimula o adiamento das relações sexuais e ocorre no mesmo período em que que o Ministério da Saúde interrompe a distribuição da caderneta do adolescente nas unidades básicas de saúde, documento com informações sobre puberdade e sexo seguro [2]. A campanha é criticada por entidades da saúde e questionada pela Defensoria Pública da União, que recomenda em ofício aos ministérios seu encerramento diante da ausência de evidências sobre a efetividade da abstinência na diminuição da gestação entre adolescentes e na prevenção de doenças sexualmente transmissíveis [3]. A medida ocorre em contexto de censura de informações sobre políticas de gênero pelo Itamaraty[veja aqui], e críticas de Damares Alves à suposta ‘ideologia de gênero’[veja aqui].
Leia análise sobre as origens do modelo da política de abstinência sexual e seus riscos.
O Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio) altera regras sobre pesca esportiva através de Portaria [1]. O texto permite a atividade em Unidades de Conservação (UC), além de autorizar que visitantes consumam o pescado no próprio local [2]. A normativa abre possibilidades para exploração comercial da pesca esportiva em unidades classificadas de proteção integral, como áreas indígenas e de quilombos, exigindo que a atividade seja objeto de autorização específica do instituto [3]. Ficam permitidas também atividades em reservas extrativistas, florestas nacionais e reservas de desenvolvimento sustentável, onde organizações representantes das comunidades locais ou beneficiários da UC deverão preferencialmente realizar o serviço de apoio de pesca [4]. De acordo com o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), que pede anulação da nova portaria [5], a liberação da pesca esportiva prejudica ecossistemas como Pantanal e Amazônia [6]. O presidente, que já foi multado por pesca ilegal [7] antes de assumir o cargo e depois exonerou o fiscalizador [veja aqui], defende mudanças nas áreas de conservação [8]. Com a nova portaria, o governo permite novamente a exploração de atividade econômica nas UC, fragilizando a proteção ao meio ambiente e às populações tradicionais residentes das áreas de proteção [veja aqui].
Leia a análise sobre a autorização da pesca em unidades de conservação ambiental.
No mesmo dia em que envia ao Congresso Nacional um Projeto de Lei que prevê a exploração mineral e a geração de energia elétrica em terras indígenas [1] e que abre a possibilidade das aldeias realizarem atividades de agricultura e turismo [2], o presidente Jair Bolsonaro afirma que a medida é um ‘sonho’ seu, que o indígena é ‘tão brasileiro quanto nós’ e que, se pudesse, confinaria os ambientalistas na Amazônia para que eles deixem de ‘atrapalhar’ [3]. O Ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, define a medida como a ‘Lei Áurea’ dos indígenas [4]. Para líderes indígenas, a medida é vista como um ‘projeto de genocídio’ [5]. Entidades ligadas à pauta do meio ambiente criticam o projeto, pois ele viola os direitos dos povos indígenas e contribui para o desmatamento [6], e o Ministério Público Federal afirma que a incapacidade do Estado de fiscalização do garimpo ‘não pode ser legitimada pelo discurso do governo federal de legalização dessa e de outras atividades econômicas’ [7]. Poucos dias antes, Bolsonaro afirma que ‘cada vez mais, o índio é um ser humano igual a nós’ [veja aqui]. No início de 2019, o presidente tenta transferir a demarcação de terras indígenas e quilombolas para o Ministério da Agricultura (MAPA), medida que é criticada por ser ‘integracionista, colonialista e racista’ [veja aqui], na segunda tentativa, também frustrada, discursa a favor da ‘integração do índio à sociedade’ [veja aqui]. Bolsonaro já defendeu a mineração [veja aqui] e a pecuária [veja aqui] em terras indígenas e cedeu aos interesses ruralistas ao exonerar o presidente da Funai [veja aqui]. O secretário do MAPA afirma que os indígenas são os maiores latifundiários do país [veja aqui], o presidente reage em tom jocoso aos questionamentos sobre preservação ambiental [veja aqui] [veja aqui] e as multas por crimes ambientais reduzem nos primeiros meses do governo [veja aqui].
Leia as análises sobre o projeto de exploração de recursos naturais em terras indígenas, quais polêmicas em torno da mineração nessas áreas e como o governo Bolsonaro ecoa a antiga política indigenista