A Secretaria de Educação de Rondônia (Seduc) determina por meio de memorando o recolhimento de 43 obras literárias de bibliotecas de escolas estaduais sob a justificativa de ‘conteúdo inadequado’ para crianças e adolescentes; entre as obras listadas pode-se citar clássicos brasileiros como ‘Memórias Póstumas de Brás Cubas’ de Machado de Assis, e ‘Macunaíma’ de Mário de Andrade [1]. Em resposta à Folha de São Paulo, o secretário da Seduc, Suamy Vivecananda, nega a prática e, em seguida, afirma que ‘não tinha conhecimento da medida’ e determina o não recolhimento dos livros [2]. A ação é criticada pela Academia Brasileira de Letras e outras organizações [3]. No dia seguinte, o Ministério Público Federal instaura procedimento para investigar a atuação da Seduc [4]. A medida ocorre um mês após o presidente Bolsonaro declarar que livros didáticos ‘são um montão de amontoado de muita coisa escrita’ [veja aqui]. Vale lembrar que em setembro de 2019, ocorreram episódios semelhantes no Rio de Janeiro [5] e em São Paulo [6], com determinações para o recolhimento de materiais educativos (gibis e livros didáticos), em razão de conteúdo relacionado à identidade de gênero e à orientação sexual.
Leia análises sobre autoritarismo e censura de livros na história.
O Ministro da Economia, Paulo Guedes, afirma que o aumento do valor do dólar é ‘bom para todo mundo’, e justifica que com o dólar mais baixo, ‘todo mundo’, inclusive ‘empregada doméstica’, estaria viajando para a Disney nos Estados Unidos, ‘uma festa danada’ [1]. A declaração é realizada no Seminário de Abertura do Ano Legislativo de 2020, em contexto econômico no qual o dólar opera em alta e chega ao valor de R$ 4,38, o quarto recorde do ano em relação ao real [2]. Nas redes sociais, empregadas domésticas e seus familiares reagem ao tom considerado classista da fala do ministro, e questionam o baixo valor do piso salarial federal para empregados domésticos (R$1.045) [3]. A declaração também teria surpreendido auxiliares do próprio presidente Jair Bolsonaro, o qual não se manifestou sobre a frase do Ministro da Economia [4]. Vale lembrar que esta não é a primeira vez que Guedes realiza declarações polêmicas. Ele havia comparado, na semana anterior, servidores públicos a parasitas [5] e, em novembro de 2019, retomado a ideia de um ‘novo AI-5’ no país[veja aqui].
Leia análise sobre o papel do trabalho doméstico no Brasil.
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Às vésperas do Carnaval, o Presidente Jair Bolsonaro baixa decreto que altera a estrutura do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) [1]. A medida extingue programas de incentivo a assentados, quilombolas e comunidades extrativistas, dentre eles, o Terra Sol, que serve de ‘fomento à agroindustrialização e à comercialização por meio da elaboração de planos de negócios’, e o Pronera, programa de educação de jovens e adultos [2]. Além disso, o decreto transforma a Ouvidoria Agrária, a quem competia ‘resolver’ tensões e conflitos no campo e ‘adotar’ medidas de preservação de direitos humanos, em Câmara de Conciliação, que passa a ‘contribuir para a resolução’ dos conflitos e apenas ‘recomendar’ medidas [3]. A medida é alvo de críticas por extinguir programa protagonizado pelos grupos afetados [4] e constituir mais um ataque do governo ao modelo de ‘soberania alimentar’ [5]. A Deputada federal Maria do Rosário (PT) propõe Projeto de Decreto Legislativo (PDL) [6] para sustar os efeitos do decreto presidencial [7]. O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) critica a extinção dos programas e recomenda ao presidente a revogação da medida e ao Congresso a aprovação do PDL [8]. Em março, o Incra divulga nota afirmando que o Pronera se mantém [9]. A medida compõe o quadro de desmonte do Incra [veja aqui], suspensão das políticas de reforma agrária [veja aqui] [veja aqui] [veja aqui] e favorecimento de grileiros [veja aqui] e ruralistas [veja aqui].
Leia mais sobre a contribuição do Pronera para a democratização do Estado brasileiro, as consequências de sua extinção e o estudo de caso de implementação do programa Terra Sol e seus impactos na agroindústria rural.
O presidente Jair Bolsonaro, durante transmissão ao vivo nas redes sociais, afirma que o deputado federal Hélio Lopes (PSL-RJ), que é negro, teria ‘dado uma queimadinha’ ao demorar dez meses para nascer [1]. A declaração de cunho racista foi marcada por tom de brincadeira e risos em conversa com a participação do Ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni. Aludindo ao fato do deputado ter se elegido em 2018 com o nome de ‘Hélio Bolsonaro’, mesmo sobrenome do presidente [2], Bolsonaro ainda afirma que o deputado é seu ‘irmão que demorou a nascer’, e caso contrário ‘ele seria minha cara’ [3]. A declaração se dá dois meses depois da nomeação por Bolsonaro do novo presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, para o qual ‘não há racismo real no Brasil’[veja aqui].
Leia entrevista sobre o racismo estrutural no Brasil.
Durante o governo Bolsonaro, quilombolas sofrem baixa histórica em reconhecimento de suas comunidades [1]. Sem a devida certificação de reconhecimento, os territórios das comunidades quilombolas ficam excluídos de políticas publicas, como bolsa família, ingresso à faculdades públicas e tendem se tornar alvo de conflitos [2]. A certificação é feita pela Fundação Cultural Palmares (FCP), que emitiu somente 70 certificações durante o ano de 2019, o menor número em 16 anos [3]. Até 2019 o número de certificados foi em média de 180 por ano, 15 por mês, mas até fevereiro de 2020 foram emitidas somente 5 certidões, apresentando um ritmo muito mais lento [4]. Funcionários da fundação afirmam que a gestão do atual presidente, Sérgio Camargo, é contra políticas raciais e desde sua nomeação ele estaria ‘obcecado’ em diminuir o número de certificados [5]. Não é a primeira vez que Camargo demonstra atitudes que divergem da politica de combate ao racismo e promoção de igualdades da Fundação [6] [veja aqui].
Leia analises sobre o abismo dos certificados nas terras quilombolas e a baixa emissão de certificados pela Fundação Palmares.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, afirma nas redes sociais que deseja que Suzy de Oliveira, mulher transexual atualmente presa, o médico Dráuzio Varella, e os membros da família Marinho, responsáves pela emissora Globo, ‘terminem no inferno’ [1]. No mesmo texto, refere-se a Suzy como ‘pedófilo’ e ‘estuprador assassino’ [2]. A postagem é uma resposta a reportagem feita pela equipe do médico transmitida no dia 01/03 no programa Fantástico [3]. A matéria aborda as condições de vida das mulheres trans e travestis nos presídios brasileiros [4]. Suzy é entrevistada e relata os preconceitos que enfrenta enquanto mulher trans e soropositiva em um presídio na capital de São Paulo e conta que estava há anos sem receber nenhuma visita. Após a conversa, recebe um abraço do médico [5]. O gesto e a matéria são alvos de crítica depois que o site ‘O Antagonista’ publica texto afirmando que a mulher está cumprindo pena pelos crimes de estupro e homicídio, informação que é confirmada pela Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) [6]. O presidente Jair Bolsonaro também critica o conteúdo da reportagem e sua veiculação nas redes sociais [7]. As declarações do ministro da Educação se alinham com outras posturas do governo, como a orientação do Itamaraty sobre sexo ser apenas o biológico [veja aqui] e a defesa da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos de que discutir gênero causa sofrimento a jovens [veja aqui].
Leia nota do Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) sobre a situação das pessoas LGBT no cárcere, análise sobre a questão das mulheres trans e travestis presas e entrevista com o médico Dráuzio Varela sobre seu livro ‘Prisioneiras’.
Ignorando o momento de pandemia da covid-19, o Governo Bolsonaro publica Resolução nº 11 [1], que anuncia a remoção e o reassentamento de famílias quilombolas no município de Alcântara, Maranhão. A normativa pode atingir até 800 famílias dos descendentes de escravos que estão na região desde o século 17 [2]. A medida determina ações de nove ministérios, mas não prevê prazo para a mudança e nem o número de famílias a serem removidas [3]. Diversas organizações quilombolas se manifestam contra a resolução, afirmando que as comunidades não foram consultadas [4], o que viola as determinações da Convenção 169 da Organização Internacional do trabalho (OIT) [5]. As comunidades têm seus assentamentos ameaçados desde o acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST), que prevê a cessão da base de lançamentos de foguetes e satélites na região para os Estados Unidos [6]. No começo de maio, a Justiça Federal suspende a remoção das famílias quilombolas de seus territórios através de decisão liminar em ação ajuizada pelo deputado federal Bira do Pindaré (PSB/MA) [7]. A decisão determina que não pode haver remoção até que seja realizada a consulta livre, prévia e informada dos quilombolas afetados [8]. Apesar da decisão a favor dos moradores, eles afirmam não ser o momento de relaxar, sendo necessária máxima atenção na causa [9].
Leia as análises sobre a violação de direitos quilombolas pelo acordo da Base de Alcântara, a ameaça que as comunidades em Alcântara também sofrem pela covid-19 e a opinião de membros da comunidade.
Instrução do Ministério do Meio Ambiente [1] regulamenta pagamento de indenizações em casos de desapropriação de propriedades localizadas no interior de unidades de conservação, dando prioridade para populações indígenas e quilombolas residentes em reservas ambientais cuja permanência não seja permitida. A medida, portanto, facilita a possibilidade de expulsão de índios e da população quilombola dessas áreas. O texto ainda diz que, excepcionalmente, outras áreas poderão ter prioridade com base em decisão que tenha ‘razões técnicas’ [2].
Leia a análise sobre como a política ambiental do governo Bolsonaro afetou a imagem brasileira no cenário internacional após o primeiro ano de governo.
Lei [1] aprovada para lidar com crise econômica nacional durante a pandemia prevê que governo pague até R$ 1.800 para trabalhadores maiores de idade, sem emprego formal, que tenham renda familiar mensal de até três salários mínimos e que não sejam beneficiários de programas sociais ou previdenciários. Já o benefício emergencial de R$ 600 mensais poderá ser pago para até dois integrantes de uma mesma família (domicílio). Os que tiverem declarado IR acima de R$ 28.559,70 em 2018 não terão direito ao benefício, que poderá ser acumulado com o Bolsa Família, desde que os R$ 600 não exceda o valor já recebido pelos beneficionados do BF [2]. Antes da aprovação da Lei, o ministro do STF, Gilmar Mendes, se manifestou nas redes sociais contra fala do ministro da Economia, Paulo Guedes, no sentido de que seria necessário aprovar uma PEC para o pagamento dos R$ 600. O ministro do STF afirmou que a Constituição não poderia ser tida como obstáculo para superação da crise [3]. Após a promulgação da Lei, no entanto, já foram registrados atrasos no pagamento do auxílio emergencial. O aplicativo Caixa Tem, utilizado para movimentação das contas poupança social digital, ficou inacessível para a movimentação do valor ou consulta do saldo no fim de semana do feriado de Tiradentes [4]. Em 30/06, o governo prorroga por mais dois meses, através de Decreto [5], o pagamento do auxílio emergencial sem, contudo, apresentar calendário de pagamento [6].
Leia a análise sobre as disputas políticas por trás do auxílio emergencial, entre os momentos de discussão até sua aprovação.
A Funai publica normativa [1] que interfere no processo de demarcação de terras indígenas, facilitando a invasão ilegal das áreas [2]. A nova normativa determina que somente terras indígenas que tiveram a fase de homologação finalizada – última fase do processo, determinada pelo presidente [3] [4] – serão cadastradas no Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra). O cadastro é importante, pois torna oficiais os dados sobre o perímetro do imóvel [5]. Dessa forma, a normativa mitiga a proteção de áreas que aguardam a homologação do Presidente da República. A legislação anterior, permitia o cadastro de qualquer terra indígena, mesmo com o procedimento de demarcação ainda em andamento [6]. Outra novidade é a modificação da emissão da Declaração de Reconhecimento de Limites, uma espécie de certidão, que garante que a propriedade privada não invada áreas vizinhas ocupadas por indígenas [7]. O que anteriormente era somente uma espécie de declaração, agora se torna um documento de posse, que imóveis privados localizados em terras indígenas ainda não homologadas poderão adquirir [8]. Durante o governo Bolsonaro, 114 terras privadas já foram certificadas de forma irregular pela Funai em áreas indígenas que aguardam demarcação de terra [9]. Após a publicação da normativa, o número registrado em menos de um mês foi de 72 novos certificados [10], grande aumento se comparado com as 42 certificações que ocorreram desde o início de 2019, até a publicação da normativa [11]. O governo vem tomando outras medidas que chancelam a violação dos direitos indígenas à terra, em âmbito estadual, como no caso do Projeto de Lei que autoriza o cadastramento de fazendas em sobreposição à terras indígenas e federal, como as tentativas de transferir a demarcação de terras para o ministério da Agricultura [veja aqui], resultando no grande aumento em invasões e violência [12].
Leia as análises sobre a eficácia da regulamentação fundiária na redução do desmatamento e as manobras do governo Bolsonaro para postegar a demarcação de terras indígenas.