O presidente Jair Bolsonaro edita Decretos [1] [2] que promovem a extinção, a partir de 28/06, de órgãos colegiados da administração pública federal, dentre eles a Comissão Técnica de Acompanhamento da Avaliação (CTAA), tendo como uma das justificativas diminuir custos operacionais [3]. A CTAA havia sido instituída em maio de 2006 pelo Ministério da Educação (MEC) [4] com o intuito de acompanhar avaliações periódicas dos cursos de instituições de ensino superior, contando com comissões constituídas por avaliadores cadastrados [5]. Como instância única e recursal, uma de suas atribuições consistia em analisar recursos das instituições de educação superior a respeito de avaliações in loco feitas pelo MEC sobre a qualidade de seus cursos [6], podendo, em caso de inconsistência ou erros no conteúdo da avaliação, determinar a advertência, recapacitação ou exclusão de avaliadores [7]. Em 2018, uma portaria do MEC [8] estabeleceu que, das decisões da CTAA caberia recurso ao presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), alteração considerada importante em caso de decisões equivocadas ou prejudiciais às instituições [9]. Mais de 90 dias depois da extinção, especialista ressalta a necessidade de se adotarem providências para a sua imediata recriação, diante da paralisação dos processos de impugnação, trazendo grave prejuízo às instituições de ensino superior [10]. Em janeiro de 2020, a CTAA é recriada, mas volta a ser a última instância recursal e não permite recurso de suas decisões ao Presidente do Inep [veja aqui].
Ouça a análise sobre a importância da CTAA e a necessidade de sua recriação.
De acordo com o presidente Jair Bolsonaro, durante encontro com países do G20, grupo formado pelas economias mais expressivas do mundo [1], existe uma ‘psicose ambientalista’ contra o Brasil [2]. O termo teria sido utilizado quando o presidente discutiu política ambiental com Angela Merkel, chanceler alemã, e Emmanuel Macron, Presidente da França [3]. Dias antes, Merkel afirmou ver com ‘grande preocupação’ a política ambiental do governo brasileiro; ao que Bolsonaro reagiu e disse que não foi à reunião do G20 para ser advertido [4]. Macron também se manifestou afirmando que não fecharia o acordo de livre-comércio com o Mercosul caso o Brasil saísse do Acordo de Paris (tratado internacional sobre mudança climática), possibilidade aventada por Bolsonaro em sua campanha eleitoral [5]. Ainda, Bolsonaro diz que o Brasil é referência em preservação ambiental e que não aceitaria uma ‘difamação’ do país nessa área [6]. Em julho, o Inpe divulga dados que demonstram o maior aumento no desmatamento da Amazônia dos últimos dez anos [7], as informações são questionadas por Bolsonaro [veja aqui], e em agosto, o diretor do instituto é exonerado [veja aqui]. Macron afirma que as queimadas na Amazônia configuram uma crise internacional [8] e Bolsonaro reage insultando a primeira-dama francesa [veja aqui] e criticando o líder na ONU [veja aqui]. Bolsonaro acusa ONGs de promoverem incêndios na Amazônia [veja aqui], o número de multas ambientais reduz nos primeiros meses de seu governo [veja aqui] e, em dezembro, a Alemanha suspende o financiamento do Fundo Amazônia [veja aqui].
Leia as análises sobre o acirramento entre os países do G20 e o Brasil na questão ambiental, como a política ambiental de Bolsonaro afetou a imagem do Brasil no exterior e o balanço da gestão ambiental em 2019
O sargento da Aeronáutica, Manoel Silva Rodrigues, foi preso em Sevilha por tráfico de drogas, ao transportar cocaína em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) [1]. O sargento fazia parte da tripulação que aguardaria a volta da comitiva do presidente Jair Bolsonaro do encontro do G20 no Japão [veja aqui] [2]. Ao comentar o episódio, Bolsonaro afirma que é ‘uma pena que não foi na Indonésia’ , país onde o crime de tráfico de drogas é punido com a pena de morte [3]. Nas redes sociais, o presidente afirma que exigiu ‘punição severa’ ao sargento [4]. O vice-presidente, Hamilton Mourão, afirma que Rodrigues era ‘mula qualificada’ e que receberá uma ‘punição bem pesada’ e o Ministro da Justiça, Sergio Moro, diz que não irão ‘medir esforços’ para investigar e punir o crime [5]. Auxiliares do presidente afirmam que o caso prejudica a imagem do Brasil no exterior e defendem endurecer os procedimentos de segurança [6]. Mesmo sem sua extradição, a justiça militar aceita denúncia do Ministério Público contra Rodrigues, paralelamente, corre processo contra o acusado na justiça espanhola [7]. Durante a campanha eleitoral, o filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, havia defendido a pena de morte para o crime de tráfico de drogas [8]. Em seu programa de governo, Bolsonaro indicava ‘tolerância zero’ ao crime e disse que iria ‘prender e deixar preso’ [9]. Em anos anteriores, o presidente também já defendeu matar criminosos [10] e membros de movimentos sociais pela reforma agrária [11]. Em outras oportunidades, Bolsonaro afirma que colocaria em ‘pau de arara’ ministros envolvidos em corrupção [veja aqui] e que ‘ladrão de celular tem que ir para o pau’ [veja aqui].
Leia as análises sobre o como o punitivismo ameaça a Democracia e os mitos da pena de morte
O número de multas por crimes contra a flora (desmatamento e incêndios, por exemplo) caiu 23% nos primeiros 6 meses do governo Bolsonaro, em relação à média registrada nos últimos 5 anos [1]. Essa situação coincide com o período em que o desmatamento na Amazônia atingiu sua maior extensão em 10 anos [2]. Em 2019 o Ibama aplicou o menor número de multas dos últimos 15 anos [3]. Para Elisabeth Uema, antiga funcionária do Ibama, esse fenômeno decorre das declarações de Jair Bolsonaro contra um excesso de multas e a desarticulação do órgão através da mudança de postos-chave [4]. Das 27 superintendências do Ibama, 19 estão sem chefia [5], desde que o Ministro do Meio Ambiente exonerou grande parte dos superintendentes em fevereiro [veja aqui][6]. Em setembro,13 superintendências continuavam sem chefia [7]. Pouco antes de assumir a Presidência, Jair Bolsonaro afirmou que a ‘festa vai acabar’ em referência às multas aplicadas pelo Ibama e pelo ICMBio [8]. Também houve uma queda de 58% nas operações de fiscalização realizadas pelo Ibama até abril de 2019, em comparação com o ano anterior [9]. Ainda, desde o início da gestão Bolsonaro, a assessoria de comunicação do Ibama foi desautorizada a comunicar-se diretamente com a imprensa [10]. A redução na fiscalização está atrelada a agenda do governo Bolsonaro de desmonte das políticas ambientais, dentre elas a paralisação do Fundo Amazônia [veja aqui], a desqualificação dos dados produzidos pelo Inpe sobre desmatamento [veja aqui] e a exoneração de funcionário do Ibama [veja aqui].
Leia as análises sobre a política ambiental de Bolsonaro e do Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e ouça sobre a pesquisa feita por brasileiros acerca da política ambiental do governo
Durante o primeiro semestre do governo Bolsonaro, apenas 1.374 famílias foram assentadas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), número reduzido em comparação ao ano de 2018, no qual foram assentadas no ano todo 8.872 famílias [1]. O presidente do Incra descarta a possibilidade do governo realizar novos assentamentos para trabalhadores rurais, pois o orçamento estaria ‘praticamente zerado’, e afirma que as desapropriações feitas no passado não deram certo [2]. Além disso, nos primeiros 100 dias do governo, o Incra registrou apenas uma ocupação de terra no país, enquanto em 2018, no mesmo período, foram registradas 43 ocupações; o fenômeno estaria atrelado aos discursos do Presidente Jair Bolsonaro contra o Movimento Sem Terra (MST) e ao clima de tensão decorrente das eleições de 2018 [3]. O Presidente comemora a redução das ocupações afirmando que a ‘propriedade privada é sagrada’ e ‘o Estado tem o dever de preservá-la’ [4]. Em outras oportunidades, Bolsonaro afirmou que pretendia classificar o MST como grupo terrorista [5], que as invasões seriam recebidas com tiros [6] e chamou seus membros de ‘gente canalha e vagabunda’ [7]. As ações do governo estão alinhadas com a política de interrupção da reforma agrária [veja aqui] [veja aqui] e de beneficiamento dos agropecuaristas, através da aceleração da regularização fundiária [veja aqui], do desmonte do Incra [veja aqui], da nomeação de ruralistas para o Ministério da Agricultura [8], da ampliação da permissão de armazenamento de armas em área rural [veja aqui] e da facilitação da legalização de terras griladas [veja aqui].
Leia mais sobre o que é a reforma agrária, como se organiza o Movimento Sem Terra (MST), como a reforma agrária foi feita no Brasil até o ínicio de 2019; leia também o estudo sobre a desigualdade na distribuição de terras agrícolas no Brasil
Funcionários da Fundação Florestal e da Polícia Ambiental do estado de São Paulo realizam sem autorização judicial a demolição de duas casas de famílias caiçaras das comunidades Rio Verde e Grajaú, ambas instaladas na Estação Ecológica Jureia-Itatins [1]. De acordo com a Secretaria Estadual do Meio Ambiente, a operação ocorreu amparada pela Procuradoria Geral do Estado, que considera a região ‘inabitada’ e as construções e moradias das famílias no Rio Verde como ‘crime ambiental’ [2]. Tal interpretação dos fatos é contestada por ativistas e organizações da sociedade civil, que destacam não só a existência de laudos antropológicos e documentos que comprovam a presença das comunidades Rio Verde e Grajaú desde pelo menos 1957, como reiteram que os conflitos sobre o uso das terras na região remontam à própria criação da Estação Ecológica em 1986 [3]. Para a presidente da União dos Moradores da Jureia, Adriana Lima, o Estado vem restingindo seus modos de vida e desconsiderando seu papel ‘para a conservação e defesa da natureza e para manutenção da biodiversidade’ [4]. Em reação, a Defensoria Pública ajuíza ação civil que barra liminarmente a demolição de uma terceira casa no local [5]. Em julho do ano seguinte, o Tribunal de Justiça de São Paulo reafirma o direito dos caiçaras do Rio Verde e proíbe a demolição das moradias [6].
Leia entrevista com liderança caiçara sobre os direitos das comunidades tradicioanais da Jureia
Ao ser questionado sobre o desmatamento, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pergunta: ‘busca-se o zero absoluto ou o zero relativo?’ e declara que o Brasil já atingiu o desmatamento zero em valores relativos [1]. No entanto, os dados divulgados até então, do período entre 2017 e 2018, demonstram a maior taxa de devastação da floresta na última década [2]. No dia anterior, o ministro afirmou que o desmatamento da Amazônia correspondia à 0,002% do bioma, porém, o número real é 0,16% [3]. Salles justifica que, em números inteiros, o desmatamento ‘já é zero, é 0,2’ e, ao ser questionado sobre a área desmatada ser semelhante ao tamanho do Distrito Federal, rebate: ‘quantos Distritos Federais cabem na Amazônia?’ [4]. Salles acusa supostos concorrentes do Brasil no agronegócio de promoverem uma imagem negativa da agenda ambiental no país [5]. Ambientalista afirma que a imagem do Brasil é comprometida pelos discursos dos líderes do governo ‘que vão contra dados e análises’ [6]. Ainda, critica líderes estrangeiros de tentarem influenciar nas políticas ambientais brasileiras e os governos anteriores que demarcavam terras e ‘dificultavam o progresso’ [7]. Três dias antes das declarações, dez ex-ministros da Ciência, Tecnologia e Inovação se reuniram para demonstrar sua oposição às medidas do governo na área [8]; meses antes, o mesmo ocorreu em relação à pasta do Meio Ambiente [9]. As falas de Salles alinham-se às posturas do presidente Bolsonaro, que afirma que existe uma ‘psicose ambientalista’ contra o Brasil [veja aqui], contesta [veja aqui] dados produzidos pelo Inpe sobre desmatamento e diz que incêndios na Amazônia são mentira [veja aqui]. Em outros momentos, Salles diz que o Ibama cumpriu 100% da meta de redução do desmatamento, mesmo com número recorde da destruição da floresta [veja aqui], e o o vice-presidente contraria dados do Inpe [veja aqui], divulga dados falsos sobre desmatamento [veja aqui] e nega queimadas que acometem a floresta amazônica [veja aqui].
Leia as análises sobre o desmatamento na Amazônia em 2019, a política ambiental do governo Bolsonaro, quais as consequências dessa política para o meio ambiente e como ela reflete na imagem do país no exterior
O presidente Jair Bolsonaro afirma, em transmissão ao vivo nas redes sociais, que trabalhou na infância, em referência ao trabalho infantil, e completa que ‘o trabalho dignifica o homem e a mulher, não interessa a idade’ [1]. As declarações criticadas por defensores de direitos humanos, como a chefe de proteção da Unicef no Brasil [2] e a procuradora do Ministério Público do Trabalho (MPT) responsável pela Coordenação Nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente [3]. Nessas manifestações, afirmam que o trabalho infantil contribui para o ciclo de pobreza e ainda é naturalizado pela sociedade brasileira. Organizações da sociedade civil [4], como a Ordem dos Advogados [5] e a Associação de Magistrados do Trabalho [6] publicam notas de repúdio. Pela legislação nacional trabalhista e pelo Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) é proibido qualquer trabalho a menores de 14 anos, sendo permitida a realização de atividade laboral a partir dos 14 anos na modalidade de aprendiz [7]. Segundo dados do IBGE, mais de 1,8 milhão de crianças entre 5 e 17 anos trabalham, sendo que mais da metade (54,4%) está em situação de irregularidade [8]. Em razão do impacto negativo de sua fala, Bolsonaro faz postagem no Twitter negando a defesa ao trabalho infantil e acusando a esquerda de atacá-lo [9]. Vinte dias depois, o MPT lança plataforma digital para monitorar o combate ao trabalho infantil [10]. No final do mês, o presidente questiona legislação trabalhista que veda o trabalho análogo à escravidão [veja aqui] e edita decreto que altera o escopo do Conselho Nacional do Trabalho [veja aqui].
Leia análise sobre a relação do trabalho infantil e a pobreza e assista seminário de pesquisa sobre as formas mais incidentes de trabalho infantil.
O Ministro da Justiça Sérgio Moro comemora em suas redes sociais queda no índice de homicídios para o primeiro bimestre do ano utilizando dados estatísticos do Sistema Nacional de Informações da Segurança Pública (Sinesp), ferramenta reconhecida por ser incompleta e pouco confiável [1]. De acordo com pesquisadores, além de não seguir critérios de padronização estatística, o Sinesp é alimentado por informações oferecidas pelos estados sem qualquer controle sobre a forma de coleta dos dados, seu modo de classificação e abrangência [2]. A primeira tentativa de criar instruções de preenchimento e parâmetros de padronização ocorreu em dezembro de 2018 por meio de portaria editada pelo ex-ministro de Segurança Pública, Raul Jungmann [3]. Vale lembrar que problemas de transparência são comumente identificados no governo federal, que amplia o rol de agentes permitidos a classificar dados públicos como ultrassecretos [veja aqui] [veja aqui]; o Ministério da Economia mantém em sigilo estudos que embasam a reforma da previdência [veja aqui] e o próprio Moro se nega a fornecer informações sobre sua agenda de reuniões [veja aqui]. No ano seguinte, a Controladoria Geral da União altera regras de transparência, ampliando sigilo [veja aqui], e o Ministério da Saúde, no contexto da crise sanitária da covid-19, atrasa a divulgação de dados epidemiológicos [veja aqui] e propõe mudança de metodologia de contagem de infectados [veja aqui].
Leia análise sobre as possíveis causas da redução dos índices de criminalidade e o discurso de Sérgio Moro
O Ministério das Relações Exteriores publica edital que exclui da lista de conhecimentos exigidos para a prova de ingresso na carreira diplomática conteúdos referentes às políticas econômicas dos governos petistas [1], que previam comparações nos dois mandatos do governo de Luiz Inácio Lula da Silva e efeitos positivos das políticas distributivas de renda no governo de Dilma Rousseff [2]. As alterações também incluem a supressão de menção a gênero e raça do item que trata das políticas de identidade [3]. Professores encaram as exclusões como um retrocesso e possível ‘orientação ideológica’ nas modificações [4]. Vale notar que as mudanças estão alinhadas com outras posturas adotadas pelo Ministério, quando o ministro Ernesto Araújo exclui curso sobre América Latina de formação de diplomatas [veja aqui], chancela a retirada de menção a direitos LGBT em documento [veja aqui] e reforça matriz ‘antigênero’ da política externa brasileira [veja aqui]. Além disso, o Itamaraty orienta diplomatas sobre gênero ser apenas sexo biológico [veja aqui], censura informações sobre política de gênero até 2024 [veja aqui] e o governo Bolsonaro, ao se candidatar para o Conselho de Direitos Humanos da ONU, omite temas fundamentais como ‘gênero’, ‘tortura’ e ‘migração’ [veja aqui].
Leia a análise sobre a política antigênero do governo Bolsonaro.