O deputado estadual Filippe Poubel (PSL-RJ) entra, acompanhado de seguranças armados, nas instalações de hospital de campanha para o combate à covid-19 no Rio de Janeiro e realiza ‘vistoria’ para verificar a oferta de leitos [1]. A invasão é transmitida ao vivo nas páginas do deputado nas redes sociais. Durante a ‘vistoria’, ocorrida aos gritos, o deputado afirma que iria ‘tocar o terror’ [2]. De acordo com a administração do hospital, que classificou a ação do político como ‘inapropriada’, uma das pessoas que acompanhava Poubel ‘chegou a sacar uma arma’ [3]. Filippe é apoiador da política de Bolsonaro em relação à covid-19 [veja aqui] e utilizou-se desta invasão para apoiar a candidatura de seu irmão, o policial militar Glauber Poubel [4]. Esta foi a primeira iniciativa desta espécie, dias depois, uma ação similar ocorreria em São Paulo [veja aqui]. Em junho, Bolsonaro recomendaria que seus apoiadores fizessem o mesmo em todo o Brasil [veja aqui], o que fez com que invasões semelhantes fossem replicadas em diversos locais [veja aqui]. Essa incitação é criticada em diversos âmbitos, sendo classificada por alguns juristas como uma infração penal [5].
Leia a análise sobre as invasões de hospitais, seus riscos e seu uso enquanto método político.
Governo da Bahia aprova lei contra disseminação de fake news na pandemia [1]. Projetos semelhantes foram aprovados no Acre [veja aqui], Paraíba [veja aqui], Ceará [veja aqui] e Roraima [veja aqui]. Neste caso, a lei estabelece multa de R$ 5 mil a R$ 20 mil para quem divulgar notícias ou informações falsas ou sem procedência oficial sobre epidemias, endemias ou pandemias no Estado da Bahia, sem citar a fonte primária [2]. A lei também afirma que não são consideradas ilícitas as publicações jornalísticas devidamente assinadas e o compartilhamento de opinião pessoal, desde que seja ‘evidenciado o caráter não-fático e opinativo do texto’ [3]. Além disso, é estabelecido que os valores arrecadados com as possíveis multas serão destinados a ações de combate a pandemias e epidemias [4]. O governador do Estado, Rui Costa (PT), afirma que a lei se justifica porque o Brasil vive uma ‘peste’ que é o ‘vírus da mentira e da calúnia’ e que, no contexto da pandemia, têm sido divulgadas notícias sobre formas de cura sem qualquer comprovação científica [5]. As denúncias sobre notícias falsas podem ser feitas por whatsapp ou pelo site ‘Bahia contra fake’ [6]. Leis com esse conteúdo têm sido criticadas por especialistas, pois não estabelecem o que são ‘notícias falsas’ e não consideram o fato de que grande parte das informações falsamente divulgadas são feitas por pessoas sem a consciência de sua falsidade [7]. Tais leis também podem restringir a liberdade de expressão e imprensa no país [8]. Entre o começo de março e o começo de junho de 2020, 26 projetos de leis foram lançados para combater notícias falsas na pandemia [veja aqui] e ao menos 21 um dos 26 estados brasileiros apresentaram iniciativas nesse sentido [9].
Leia análise sobre o surgimento de projetos que pretendem alterar a estrutura de regulação da liberdade de expressão na internet.
O Ministério Público de São Paulo (MP SP) abre inquérito civil para averiguar suposto ‘gabinete do ódio’ contra o deputado estadual Douglas Garcia (PSL) e Edson Salomão, seu chefe de gabinete e presidente do Instituto Conservador [1]. A investigação busca apurar se, durante o horário do expediente na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) e com uso de recursos públicos, houve manifestação de ódio contra figuras públicas, divulgação de postagens do Instituto Conservador e incentivo a coleta de assinaturas para a formação do partido Aliança pelo Brasil (do presidente da República Jair Bolsonaro) [2]. Em 01/06, Garcia pede que enviem dados de pessoas que se autodenominam ‘antifascistas’ para seu endereço de e-mail e no dia seguinte grava vídeo com suposto dossiê [3], em contexto de protestos desses grupos contra o governo [veja aqui]. Com o vazamento de uma lista com os dados de cerca de 900 pessoas (cidadão comuns classificados como antifascistas) muitos atribuem ao deputado sua confecção e vazamento dos dados [4]. O MP SP irá investigar se houve uso da administração pública para a elaboração do dossiê [5] e deputadas do PSOL, partido da oposição ao PSL, pedem a cassação de Garcia [6]. O deputado nega que tenha elaborado o dossiê e afirmar ter entregue as informações à polícia [7]. Posteriormente, liga-se servidores do gabinete de Garcia à ataques de figuras como a parlamentar Joice Hasselman, vista como opositora à setores do governo Bolsonaro, além de instituições como o Supremo Tribunal Federal [8]. Em agosto, Garcia é condenado pela justiça paulista a pagar indenização de R$ 20 mil por conta do dossiê [9], e posteriormente ele afirma que Eduardo Bolsonaro, filho do presidente e deputado federal, teria entregado cópia do dossiê para a Embaixada dos EUA [10]. Na sequência, Eduardo se torna réu de ação no STF, sob justificativa de que a entrega de cópia do dossiê viola a Lei de Segurança Nacional [11]. Em julho, ação sigilosa do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) monitora servidores antifascistas e repassa informações a outros órgãos do governo [veja aqui], e o STF, acionado sobre a ação, proíbe a elaboração de dossiês pelo MJSP [12].
Leia análises sobre o que é o antifascismo, o papel de Garcia no inquérito de fake news e comunicado da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.
Congresso Nacional aprova a Medida Provisória (MP) 917 [1], convertida na Lei 14.009/2020 [2], que determina o adiamento, por um ano, da entrada em vigor de alteração do Estatuto da Pessoa com Deficiência (EPD) [3]. O Dispositivo normativo de 2015 define que todos os estabelecimentos cinematográficos do país devem garantir, obrigatoriamente, recursos de acessibilidade para pessoas com deficiência. A norma deveria entrar em vigor no início de 2020, mas a MP, agora convertida em Lei, estabelece que a obrigação passe a valer somente em janeiro de 2021 [4]. Na exposição de motivos da MP é alegado que a proposta se baseia na necessidade de adequação do prazo às etapas necessárias para o lançamento das linhas de crédito, previstos para iniciar em fevereiro 2020, e que a avaliação de propostas e aprovação dos respectivos créditos costuma durar aproximadamente 8 meses [5].
Deputados da oposição ao governador João Doria (PSDB) invadem hospital de campanha (pequena unidade médica móvel) na cidade de São Paulo causando tumulto [1]. Acompanhados de suas equipes, os deputados adentram o local sem autorização e equipamento de proteção (EPI) e, afirmando terem ido realizar vistoria, criticam Doria, alegando que o governo estadual mentiria sobre o número de casos e mortes em São Paulo e que o hospital seria subutilizado. Na ocasião, gravam e divulgam vídeos sobre a ação; foram identificados três legisladores nas imagens [2]. Os deputados são contra as medidas de distanciamento social [3] e compõem um grupo na Assembleia Legislativa do estado chamado Parlamentares em Defesa do Orçamento (PDO), que buscaria verificar os gastos públicos durante a pandemia [4]. A Prefeitura afirmou que a invasão e as atitudes foram ‘violentas’ e que os parlamentares gravaram pacientes sem autorização prévia [5]. Na semana seguinte, o presidente Jair Bolsonaro incentiva apoiadores a filmarem hospitais e denunciarem possível manipulação da situação pandêmica [veja aqui].
Projeto de lei (PL) de ratificação da Emenda de Kigali, acordo internacional de redução da emissão de gases do efeito estufa, tramita há três anos na Câmara dos Deputados (CD) [1]. Embora encontre-se apto à votação pelo plenário da CD há quase dois anos, a presidência da casa legislativa, que no período foi exercida por Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Arthur Lira (PP-AL), tem negligenciado a sua inclusão em pauta [2]. Entre os países em desenvolvimento, apenas Brasil e Iêmen não sinalizam à ONU a validação ao acordo, que obrigaria o país a, até 2045, reduzir em 80% a emissão dos gases usados em aparelhos de ar condicionado, geladeiras e freezers [3]. A aprovação do PL liberaria, ainda, à indústria local verba de R$ 500 milhões em recursos para a preservação do ambiente, provenientes do Fundo Multilateral para Implementação do Protocolo de Montreal [4]. Em 22/04/21, quando da abertura da Cúpula do Clima, a Frente Ambientalista da CD pede a Lira (PP-AL) pela votação do PL [5]. Além disso, uma carta aberta, com apoio do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), da Fecomércio-SP, do Centro Brasil no Clima, do Climate Policy Initiative e mais de 1,2 mil outras assinaturas é enviada ao presidente da CD pedindo a ratificação imediata da emenda [6]. Essa não é a primeira vez que o Brasil não adere a compromissos internacionais relacionados a proteção do meio ambiente: em março, o governo Bolsonaro optou por não participar de projeto que envolve mais de 60 países e tem como objetivo reconhecer o direito a um meio ambiente seguro, limpo e sustentável como um direito humano [veja aqui].
Leia análises acerca da negligência do estado com a Emenda Kigali e também sobre os benefícios ambientais e econômicos de sua aprovação.
Ricardo Barros (Progressista – PR), líder do governo na Câmara dos Deputados, crítica o Supremo Tribunal Federal (STF) e ameaça descumprir decisões do tribunal [1]. Durante discussão sobre a realização do censo demográfico pelo governo federal após determinação do STF, o deputado federal afirma que ‘o Judiciário vai ter que se acomodar nesse avançar nas prerrogativas do Executivo e Legislativo’ e que ‘vai chegar uma hora (…) que simplesmente não vamos cumprir mais’ [2]. Barros também declara que o possível descumprimento das determinações seria porque elas ‘não têm nenhum fundamento, nenhum sentido, nenhum senso prático’ [3]. Em reação, o presidente do STF, Luiz Fux, diz que ‘o respeito a decisões judiciais é pressuposto do Estado Democrático de Direito’ [4]. O presidente do Instituto Não Aceito avalia a ameaça de Barros como um ‘desmantelamento da essência do contrato social’ [5]. Professor da Universidade de Brasília (UnB) afirma que caso haja o descumprimento das decisões, como ameaça Barros, o judiciário tem o poder de impor o cumprimento [6]. As críticas de Barros as decisões do STF são alinhadas com as falas do presidente da República e seus aliados [7]. Em maio de 2020, Bolsonaro caracterizou as determinações do STF sobre o inquérito das fake news como ‘ordens absurdas’ e que não deveriam ser cumpridas [veja aqui]. No dia 05 de maio desse ano, Bolsonaro ameaçou promulgar decreto contra as medidas de isolamento social e disse: ‘se eu baixar um decreto, vai ser cumprido, não será contestado por nenhum tribunal’, em referência ao Supremo Tribunal Federal [8].
Leia sobre as ameaças de Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal e ouça sobre como os ataques direcionados ao STF põem em risco as instituições e a democracia brasileira.
Congresso Nacional publica a Lei 14.010/2020 [1], que dispõe sobre o regime jurídico emergencial e transitório das relações jurídicas de direito privado durante a pandemia decorrente do coronavírus. Dentre as mudanças destaca-se a possibilidade, durante o estado de calamidade pública, de empresas firmarem parcerias sem a configuração ou identificação de formação de cartel ou monopólio de determinados setores econômicos. Assim, a lei permite que empresas firmem parcerias (joint ventures) sem aprovação prévia do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade); tal análise, no entanto, poderá ser realizada posteriormente pelo órgão regulador para apurar eventuais infrações de ordem econômica e aplicar as sanções necessárias para coibir práticas ilegais [2]. A lei também flexibiliza relações jurídicas privadas durante a pandemia, visando ‘atenuar as consequências socioeconômicas da covid-19, de modo a preservar contratos e servir de base para futuras decisões judiciais’ [3]. A flexibilização no âmbito do direito privado se insere em contexto mais amplo de flexibilizações durante a pandemia, como as também ocorridas no campo do direito do trabalho, através da Medida Provisória 936 [4] que permite a suspensão de contratos de trabalho e institui o auxílio emergencial [veja aqui], e do direito administrativo, a partir da Medida Provisória 926 [5] que prevê dispensa de licitação para a aquisição de bens, serviços e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública [veja aqui].
Leia análises sobre a regulação do direito privado na pandemia a partir da nova lei e o papel do Legislativo nas alterações realizadas.
Parlamentares invadem hospitais destinados ao tratamento da covid-19 em pelo menos três estados após fala de Jair Bolsonaro recomendando vigilância de hospitais [veja aqui]. No Espírito Santo, em 12/06, cinco deputados (nenhum deles médico ou parte da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa do estado) fazem inspeção em hospital de campanha [1]; posteriormente, a Procuradoria do Estado apresenta queixa-crime contra os parlamentares [2] e a Secretaria de Saúde repudia as invasões [3]. Na Bahia, em 17/06, um deputado bolsonarista também invade hospital [4], e, armado, ameaça os profissionais do local com voz de prisão [5]. No Ceará, em 13/06, três vereadores apoiadores do presidente tentam invadir hospital [6]. Antes da fala do presidente, parlamentares em São Paulo [veja aqui] e no Rio de Janeiro [veja aqui] já haviam invadido hospitais.
Leia análise sobre invasões de hospitais incentivadas pelo presidente.
Seguindo tendência do governo [veja aqui], os militares vêm ocupando mais cargos na Administração Pública. Levantamento desta data [1] aponta que 2.930 cargos do Executivo, Legislativo e Judiciário federais são ocupados por militares da ativa, ficando de fora da contagem os militares da reserva – que sabidamente ocupam, ao menos, sete chefias de Ministérios do Executivo [2]. Destes militares, 2.716 estão no Executivo, 213 no Judiciário e 1 no Legislativo, o que em termos percentuais quer dizer que mais de nove a cada dez militares nos três poderes estão no Executivo (92,6%) [3], em grande parte concentrados nos Ministérios da Defesa e da Segurança Institucional [4] – ambos chefiados por generais da reserva [5]. Levantamento anterior do fim de fevereiro havia apontado 2.897 militares da ativa no Executivo federal [veja aqui], o que representa recuo tímido de 3,45% em três meses e meio. No dia seguinte à contagem, o Tribunal de Contas da União (TCU) decide fazer levantamento do total de militares na ativa e na reserva que integram o governo federal [6] e, um mês depois, os novos dados são revelados [veja aqui].
Leia análises sobre o papel das Forças Armadas no governo e a relação entre sua presença, a falta de transparência e possível declínio de reputação.