Presidente Jair Bolsonaro nomeia, através de decreto [1], último colocado em lista tríplice elaborada pelo Conselho Universitário (Consuni) para o cargo de reitor da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) [2]. O ato nomeia Marcelo Recktenvald como novo reitor, que obteve apenas 4 dos 49 votos do Consuni – enquanto o primeiro e segundo colocados obtiveram, respectivamente, 26 e 19 votos [3]. Na consulta à comunidade acadêmica, Recktenvald também ficou em último lugar, sequer participando do segundo turno das eleições [4]. A nomeação representa quebra de tradição existente desde 2003 , na qual o presidente da República sempre nomeava o primeiro colocado da lista tríplice, em atendimento às eleições acadêmicas e posicionamento do conselho universitário [5] [veja aqui]. O ato é repudiado por órgãos da própria universidade [6] [7], por entidades sindicais [8], e manifestações estudantis [9], que apontam ofensa à autonomia universitária. Em maio de 2020, Recktenvald defende intervenção militar no Supremo Tribunal Federal (STF) através de postagem nas redes sociais: ‘Um cabo e um soldado resolveriam essa questão. Tenho a impressão de que nossas instituições estão perdidas’ [10]. A mensagem é postada um dia após a Polícia Federal executar mandados de busca e apreensão contra apoiadores do governo Bolsonaro e parlamentares aliados, no âmbito do inquérito das fake news [11] [veja aqui]. Em outras oportunidades, Bolsonaro nomeou segundos e terceiros colocados para as reitorias das universidades federais do Ceará [veja aqui], do Triângulo Mineiro [veja aqui], dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri [veja aqui], e do Rio Grande do Sul [veja aqui]. No fim de 2019, o presidente editou Medida Provisória (MP) que alterou o processo de escolha dos reitores [veja aqui], e em 2020 outra MP possibilitou o Ministro da Educação nomear reitores temporários durante a pandemia [veja aqui].
Leia carta de repúdio de reitores eleitos, porém não nomeados, análises sobre as intervenções de Bolsonaro nas universidades federais e sobre outros ataques praticados pelo governo federal, e veja estudo sobre as atuais condições da liberdade acadêmica no Brasil – em inglês.
Polícia Militar interrompe de forma violenta ensaio do grupo de Maracatu ‘Baque Mulher’ na Praia Brava de Caiobá em Matinhos (PR), encaminha três membras à delegacia e apreende instrumentos [1]. Uma das jovens que foi levada à delegacia conta que o grupo estava ensaiando, como de costume, entre o calçadão e a praia e que optou por ensaiar pela manhã para evitar perturbações à vizinhança, mas que um morador chamou a PM por conta do barulho [2]. Ela também diz que a abordagem dos policiais foi desproporcional; eles chegaram em quatro viaturas e oito policiais, sendo que um deles estava muito alterado, e, de imediato, elas pararam o ensaio e apresentaram seus documentos [3]. De acordo com a artista, num primeiro momento, os policiais disseram que pegariam dois instrumentos e depois pegaram mais um [4]. Durante a ação policial, uma das integrantes é empurrada de forma violenta para dentro da viatura e afirma que o PM a chamou de ‘vadia’; o grupo grita várias vezes que o ato se trata de ‘abuso de autoridade’ e chamam um dos PMs de ‘fascista’, ao que o policial volta para confrontá-las questionando quem tinha dito aquilo [5]. Em nota, a PM afirma que ‘adotou os procedimentos necessários e adequados aplicados em qualquer outra situação de perturbação de sossego’ e que a atuação da corporação ‘é imparcial e segue diretrizes de direitos humanos’ [6]. O órgão declara que o denunciante decidiu representar contra as pessoas ‘que causavam barulho’, por isso três pessoas foram levadas à delegacia e três instrumentos foram apreendidos [7]. Nas redes sociais, o grupo diz que os crimes de resistência à ordem e perturbação do sossego foram desconsiderados, pois o Maracatu é parte da cultura popular afro-brasileira; também negam que houve desacato aos policiais [8]. Enquanto aguardam as três integrantes prestarem depoimento, as percussionistas tocam músicas como forma de resistência na frente da porta da delegacia [9]. O Ministério Público investiga a ação dos policiais [10].
Leia mais sobre o surgimento do Maracatu-Nação.
Após reportagem da TV Globo que mostrou aumento no número de mortes em acidentes nas rodovias federais com a queda nos índices de isolamento social [1], o chefe da área de comunicação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) da Superintendência do Paraná é afastado e há mudança nos protocolos de atendimento à imprensa [2]. O policial concursado, Fernando Oliveira, afirma que seu afastamento se relaciona a política do presidente Jair Bolsonaro e que os superiores passaram a controlar as informações passadas da assessoria de imprensa à sociedade [3]. Temas de interesse de Bolsonaro seriam vistos como ‘temas sensíveis’ e receberiam outro tratamento dentro da corporação [4]. Ainda, Oliveira afirma que seu ‘desalinhamento’ foi criticado pela direção da PRF em Brasília [5]. Além disso, foi repassado documento da coordenação de comunicação social do órgão centralizando as atividades de comunicação social que condicionando entrevistas à aprovação prévia [6]. Outros policiais também afirmam haver ‘censura’ e ‘controle’ no setor [7]. Anteriormente, servidores foram afastados do Ibama em situação semelhante, incluindo reportagem à TV Globo [veja aqui].
Ministério Público do Estado do Paraná (MP-PR) denuncia o artista Maikon K pela performance ‘DNA de DAN’ realizada em outubro de 2017 no anfiteatro do Lago Igapó na cidade de Londrina (PR), acusando-o de exibir um ‘espetáculo de caráter obsceno’ e praticar ‘atentado ao pudor’, como apurado pela imprensa nesta data [1]. A apresentação, que consistia em uma performance com o corpo nu dentro de uma esfera plástica e translúcida, foi interrompida pela Polícia Militar, após a denúncia de uma pessoa [2]. À época, a equipe responsável pelo Festival de Dança, em que se inseria a atuação, informou a todos que o espetáculo envolvia nudez [3], porém o MP defende que ‘havia uma pista de caminhada/corrida, local pelo qual passam as pessoas, inclusive crianças e adolescentes’ [4]. O ator não foi preso, como ocorreu em Brasília , pois os espectadores fizeram uma corrente em torno da performance e a deslocaram para outro ponto [5], no entanto, foi lavrado Termo Circunstanciado em desfavor do artista [6]. Em junho de 2020, a Justiça paraense determina o trancamento da ação penal movida contra Maikon K; de acordo com o desembargador relator, Aldemar Sternadt, a situação é ‘absurda, desarrazoada e inaceitável’ [7]. Para ele, aqueles que denunciaram e interromperam a performance são ‘hipócritas que acreditam ter o poder de censurar o que o vizinho pode ouvir, ver e consumir’ e a atuação policial foi ‘ilegal, abusiva e com finalidade castrense’ [8]. Para o advogado de Maikon K, a decisão mostra que a população ‘tem consciência e cultura para decidir o que ela deve acompanhar ou prestigiar’ e não precisa de censor [9]. O artista afirma que preferiu não fazer um acordo com a Justiça porque seria ‘assumir uma culpa’ que não teve e que sua atitude pode ‘proteger outros artistas’ e seu ‘próprio trabalho no futuro’ [10]. Produtora cultural que coordenou o festival declara que após a performance ‘teve um movimento de fake news’ que a assustou porque eram comentários ameaçadores e violentos contra a organização do evento [11]. Em outros momentos, o MP-SP investigou exposição no Museu de Arte Moderna por performance nu [12] e o governador do Rio de Janeiro censura peça de teatro com cena de nudez [veja aqui].
Leia mais sobre a polêmica em torno da performance ‘DNA de DAN’ e os limites da liberdade artística.
Deputados estaduais aprovam projeto, elaborado pelo governador Ratinho Júnior (PSD-PR), que poderá implementar até 200 escolas cívico-militares no estado do Paraná [1]. O texto prevê um sistema de gestão das escolas compartilhado entre militares e civis e o desenvolvimento de atividades extracurriculares acompanhadas pela Secretaria de Estado da Segurança Pública [2]. Para implementação desse modelo, a Secretaria da Educação e do Esporte do Paraná (Seed-PR) deverá organizar consultas públicas com as comunidades dos colégios [3]. Nessas votações, os pais ou responsáveis por estudantes matriculados nas escolas devem optar por “sim” ou “não” para a militarização das instituições de ensino. Caso a atinja a maioria simples na votação de votantes, a gestão educacional dessa da escola passa a ser compartilhada entre um Diretor Militar e o um Diretor-geral, este civil [4]. Até novembro de 2020, foram realizadas 216 consultas em colégios do estado e o modelo cívico-militar foi aprovado por 186 [5]. O sindicato dos professores do estado, que é contra o projeto, elabora uma carta às mães, pais ou responsáveis, na qual denuncia que a militarização é autoritária, não considera a autonomia dos estudantes e a formação plural de cidadãos [6]. Após a realização das consultas, o sindicato divulga nota em que se manifesta não reconhecendo os resultados, pois, segundo a entidade, o procedimento contou com diversas ilegalidades, como a falta de debate e audiências públicas com a comunidade escolar [7]. Além disso, o sindicato questiona na Justiça a lei aprovada, bem como as consultas públicas que a sucederam, na justiça, pelo tendo em vista o programa contrariar os pilares da educação presentes na Constituição Federal [8]. O programa de implementação de escolas cívico-militares é uma das principais propostas do governo Bolsonaro para a educação [veja aqui]. Essas escolas possuem, em seu projeto pedagógico, cursos obrigatórios de ‘valores e atitudes’ e um manual rígido de comportamento [veja aqui]. Bolsonaro já criticou governadores que não se propuseram a aderir ao programa, afirmando que esses veem nas escolas um lugar para ‘formar militantes’ [veja aqui].
Leia análises sobre o modelo cívico-militar de escolas e sobre o avanço delas na rede particular de ensino
O Instituto Água e Terra (IAT), o IBAMA e a Federação de Agricultura (FAEP) no Paraná requerem na Justiça a possibilidade de não obedecer a lei federal da Mata Atlântica – para seguir o Código Florestal – argumentando que a aplicação da lei pode afetar o andamento dos Cadastros Ambientais Rurais pendentes [1]. A lei federal da Mata Atlântica prevê uma proteção mais rigorosa para esse bioma, devido a sua importância, enquanto o Código Florestal é uma lei mais branda [2]. Se confirmada a aplicação apenas do Código Florestal, a disputa judicial pode resultar no cancelamento de penalidades aplicadas e no perdão de responsáveis pela derrubada de quase 72 mil hectares de floresta em propriedades privadas do estado [3]. A partir do previsto no Código Florestal os donos de propriedades localizadas em Áreas de Preservação Permanente (APPs) e de reserva legal na Mata Atlântica, têm maior possibilidade de explorar a área, sem necessidade de recuperação do bioma [4]. O Paraná é um dos estados com maiores taxas de desmatamento de Mata Atlântica nos últimos 30 anos, e em todo país restam apenas 7% da área original desse bioma ameaçado de extinção [5]. A discussão já chegou ao Superior Tribunal de Justiça, mas ainda cabe recurso [6]. Para a Fundação SOS Mata Atlântica, a emergência climática precisa ser prioridade em um estado como o Paraná, que vive um sinal de alerta muito maior em relação a crise hídrica [7]. Esse litígio é um dos reflexos do despacho assinado pelo ministro do Meio Ambiente ano passado, que permitiu a aplicação de regras do Código Florestal ao invés da Lei da Mata Atlântica [veja aqui] [veja aqui], anistiando proprietários rurais que desmataram e ocuparam essas áreas até julho de 2008.
Atos que trazem como justificativa o enfrentamento da pandemia de covid-19 ou outra emergência. Sob o regime constitucional democrático, atos de emergência devem respeitar a Constituição e proteger os direitos à vida e à saúde. Mesmo assim, por criarem restrições excepcionais ligadas à crise sanitária, requerem controle constante sobre sua necessidade, proporcionalidade e limitação temporal. A longo prazo, demandam atenção para não se transformarem em um 'novo normal' antidemocrático fora do momento de emergência.
Atos que empregam ferramentas da constante reinvenção autoritária. Manifestações autoritárias que convivem com o regime democrático e afetam a democracia como sistema de escolha de representantes legítimos, como dinâmica institucional que protege direitos e garante o pluralismo.