Artistas relatam tentativas de censura e ameaças da Polícia Militar (PM) em shows após o Carnaval em Recife [1]. Durante a apresentação da banda Devotos, após a canção da música ‘Banditismo por uma questão de classe’ da Nação Zumbi (antiga Chico Science e Nação Zumbi), os membros do grupo são informados de que a PM ameaçou terminar o show caso houvesse mais alguma música crítica à polícia [2]. Situação semelhante ocorre na apresentação da banda Janete Saiu para Beber; nas redes sociais, o grupo musical afirma que a PM fez uma barreira entre o público e a banda e ameaçou prender o vocalista por desacato [3], afirmando que não poderiam cantar Chico Science [4]. Os artistas declaram que respeitam o trabalho da PM, mas que são ‘totalmente contra qualquer tipo de ação repressora que venha a inibir manifestações artísticas em suas variadas formas’ [5]. Ainda, na última música do show do cantor China, a PM sobe no palco para interromper a apresentação que teria ultrapassado do horário permitido; o artista afirma que a competência do cronograma dos shows é da prefeitura [6]. Em nota, a PM informa que não há proibição à exibição de músicas e que o efetivo orienta a suspensão de blocos que tenham estourado o tempo previsto para o desfile [7]. O vocalista do Devotos, Cannibal, defende que a atmosfera política tem intensificado episódios como esses, de hostilização, e afirma que é um retrocesso [8]. O Ministério Público instaura inquérito civil para apurar ‘possíveis violações à cultura da população e à liberdade de expressão e artística dos músicos’ [9]. Durante o carnaval de Belo Horizonte, também ocorre caso de interferência da PM em bloco que criticava o governo [veja aqui].
Ouça a música ‘Banditismo por uma questão de classe‘ da Nação Zumbi e leia a análise sobre o caráter político do Carnaval.
Assembleia Legislativa do Espírito Santo convoca civil que realizou críticas a deputado estadual para depor na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) de Crimes Cibernéticos [1]. A CPI foi feita com o objetivo de apurar as denúncias de crimes cibernéticos e é composta pelos deputados Vandinho Leite (PSDB), Capitão Assumção (PSL) e Delegado Danilo Bahiense (PSL) [2]. Em um contexto de negociações salariais entre o governo do Espírito Santo e agentes de segurança, o civil produziu e divulgou conteúdo associando Assumção a um motim policial e chamando a situação de ‘terrorismo psicológico’ [3]. No depoimento, ele se desculpa e ressalta que o conteúdo produzido estaria embasado em notícias que viu na mídia; sua intenção ao compartilhá-lo seria apenas a de ‘acalmar a [sua] família’ e vizinhos [4]. A pedido do deputado Danilo Bahiense, também grava um vídeo pedindo perdão pelo conteúdo do áudio [5]. Assumção pede responsabilidade e condena inescrupulosidade de quem espalha o que chama de fake news, já que isso mancharia sua imagem perante seus filhos e como parlamentar [6]. O presidente da CPI, Vandinho Leite, também afirma que esse trabalho de combate a notícias falsas deve continuar e que é necessária resposta do Executivo sobre a situação [7]. Especialistas enquadram o ocorrido como violação à liberdade de expressão e abuso de autoridade pelos parlamentares, já que o terapeuta não teria incorrido em crime [8].
Leia análise sobre o status jurídico das fake news.
Além do fechamento de escolas [veja aqui], diversos governadores anunciam fechamento do comércio e serviços não-essenciais na pandemia do novo coronavírus. Trata-se de medidas de reforço do isolamento social em combate ao novo coronavírus – o ministério da Saúde [1] afirma que o número de casos poderia dobrar a cada três dias sem medidas de distanciamento social [2]. Essas medidas visam ‘achatar a curva’ ou afastar ao longo do tempo o número de infectados pelo vírus, e são indicadas por especialistas e pela Organização Mundial da Saúde [3]. O governador do Piauí edita decreto com medidas de urgência em 16/03, estabelecendo em 19/03 estado de calamidade pública e suspendendo atividades de comércio [4]. No Rio de Janeiro, em 11/03 o governador Wilson Witzel (PSC) decreta adoção de isolamento [5], e em 17/03 assina decreto suspendendo diversas atividades, como visitas a unidades prisionais e sessões de cinema, além de recomendar o fechamento de centros comerciais, redução de lotação em bares e restaurantes [6]. Rondônia decreta estado de emergência e encerramento de diversas atividades em 17/03, e posteriormente, em 20/03, institui calamidade pública e o isolamento social [7]. Esses são exemplos de medidas por todo o país e destaca-se sua heterogeneidade em diversos aspectos: sua nomeação, quais as restrições impostas e qual o período de tempo do isolamento – São Paulo, por exemplo, é o único que trata das medidas oficialmente como quarentena [8]; Minas Gerais, por sua vez, estabelece medidas de prevenção da doença, e cria um comitê gestor de crise [9]. A estipulação ou não de penas para quem descumpre as medidas também varia: Piauí [10] e Alagoas [11] preveem de multas a detenção para quem descumprir as normas, ao passo em que em São Paulo o governador João Doria (PSDB) apenas menciona a possibilidade de detenção ; no Rio de Janeiro, Witzel afirma que seu decreto também prevê a possibilidade de prisão . Os próprio governadores questionam a falta de coordenação do governo federal, que teria politizado as medidas de isolamento social [12]; reflexo dessa ausência de diretrizes é uma pesquisa que aponta que mais de 10.000 normas são criadas por municípios e estados em meio à pandemia [13]. Em 25/03, mesmo com o presidente da República pedindo o fim do isolamento [veja aqui], 25 governadores afirmam que manterão restrições contra o novo coronavirus [14]. Ainda, de acordo com a imprensa, em 06/04, 23 estados mantinham quarentena [15]; levantamento de 11/04 aponta que todos os estados tinham adotado medidas de isolamento [16]. Destaca-se que as medidas são prorrogadas e endurecidas em diversos estados: alguns anunciam medidas de lockdown [veja aqui] e na semana de 03/05, segundo a imprensa, 18 estados e o Distrito Federal [17].
Leia as análises sobre estados na pandemia, como as políticas públicas diferem entre norte e nordeste, os custos e benefícios do isolamento social e a diferença entre as regiões na pandemia.
Todos os Estados e o Distrito Federal já tiveram suas aulas na rede estadual canceladas [1]. Nesta data, diversos municípios já haviam cancelado aulas também ou fizeram-no poucos dias depois [2]. Com aulas presenciais suspensas nas escolas e universidades, as instituições de ensino são dispensadas de cumprir o número mínimo de dias de efetivo trabalho escolar, mas continuam tendo que cumprir a carga horária mínima [3] por meio de Medida Provisória (MP) [4]. O Exame Nacional do Ensino Médio, Enem, é mantido a princípio e tem seu edital divulgado em 31/03, o que motivou críticas [5]. Em seguida, secretários de educação divulgam nota ressaltando a expansão de desigualdades com a pandemia e a falta de acesso de estudantes ao ensino remoto [6]. Em 02/04, o PDT ajuíza ação no Supremo Tribunal Federal, requerendo a imediata suspensão do calendário da prova [7]. Duas semana depois, a Defensoria Pública da União (DPU) ajuiza outra ação, em favor da adequação do calendário à evolução da crise [8]. Em 17/04, a Justiça Federal determina adiamento do Enem [9], mas dias depois a decisão é revertida [10]. A DPU recorre em seguida [11]. Nesse ínterim, o MEC lança peça publicitária em defesa da manutenção do Exame [veja aqui] e o Inep cede a pressões e determina adiamento [veja aqui]. Em junho, o ministro da Educação é exonerado da pasta [12] e, no mês seguinte, as novas datas do Enem são divulgadas e a MP é aprovada no Congresso [13] [14]. Neste mesmo mês, são anunciadas volta às aulas presenciais [15] [16] [17] e Manaus é a primeira capital a voltar oficialmente às escolas [18], mas especialistas temem [19] [20]. Neste cenário, o Conselho Nacional de Educação (CNE) recomenda flexibilização do controle de presença no retorno às aulas presenciais e a possibilidade de escolha dos pais a esse respeito [21], posição também controversa entre especialistas [22]. A justiça também é acionada contra decisões de governos [23]. Em agosto, o presidente sanciona a lei aprovada no Congresso [24]. Em setembro, escolas reabrem no estado de São Paulo [25], mas permanecem fechadas na cidade do Rio de Janeiro [26], reabrindo só no mês seguinte [27]. Em outubro, o CNE recomenda a possibilidade de manutenção de aulas remotas até o fim de 2021 [28].
Leia as análises sobre as lições internacionais para lidar com a pandemia em escolas, o futuro da educação e os planos de volta às aulas no país.
Começam a ser tomadas medidas restritivas contra a covid-19 nos presídios estaduais. O Distrito Federal isola detentos idosos buscando prevenção contra o novo coronavírus [1]. Demais governadores também adotam medidas diversas – em São Paulo, após a morte de 6 detentos e 3 agentes penitenciários, 3 mil presos são isolados em 30 de abril [2]. No Rio de Janeiro as visitas são proibidas (em março, o Departamento Penitenciário Nacional suspendeu também visitas e contatos com advogados em penitenciárias federais [veja aqui]) [3]; no Amazonas, 300 presos são isolados e não são testados [4]. O Ministério da Justiça sugere que presos com suspeita de contaminação sejam alocados em contêineres [veja aqui] e outras normativas preveem isolamento de presos com traçados de linha em celas [veja aqui]. Após recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cerca de 30 mil presos são soltos [5]. Organizações da sociedade civil apontaram a insuficiência dessas medidas restritivas para proteção da saúde nas prisões, defendendo medidas como a liberdade condicional e prisão domiciliar para reduzir a superlotação e evitar a disseminação do vírus [6]. O Brasil ocupa o 4º lugar na lista de países com mais mortes por covid-19 de pessoas encarceradas, segundo apuração de 05/05 [7]. Agentes penitenciários do estado de São Paulo relataram aumento de tumultos dentro dos presídios e risco de perda de controle dos detentos devido à falta de produtos básicos e tensão gerada pela pandemia [8].
Leia as análises sobre o sistema prisional na pandemia, a situação das mulheres e mães encarceradas, a vida nas prisões neste momento e pesquisa baseada em questionário sobre a situação carcerária.
Paraíba é o primeiro estado brasileiro a implementar lei sobre a disseminação de fake news no contexto da pandemia [1]. Com ela, fica estabelecida multa de até R$ 10,3 mil [2] para ‘quem dolosamente divulgar por meio eletrônico ou similar notícia falsa sobre epidemias, endemias e pandemias no Estado da Paraíba’ [3]. Especialistas e entidades de classe criticam a medida, já que (i) a lei não estabelece o que seriam ‘notícias falsas’ e nem como fica configurado o dolo; (ii) grande parte das informações falsamente divulgadas seriam feitas por pessoas sem a consciência de sua falsidade; e (iii) a medida pode restringir a liberdade de expressão e imprensa no país [4]. Segundo o governador João Azevêdo, porém, a intenção seria apenas de punir quem ‘espalha boatos e fake news’ e não atingiria ‘em nada os órgãos de imprensa’ [5]. De acordo com o deputado Wilson Filho (PTB), autor do projeto da referida lei, sua regulamentação passa pela referência a agências de checagem de fatos e os processos contarão com as garantias constitucionais, não havendo ‘a menor intenção de inibir e muito menos punir o exercício da livre imprensa’ [6]. Vale notar que, no ano anterior, já havia sido aprovada lei sobre a divulgação de fake news no cenário eleitoral [7] e, depois da medida do governo da Paraíba, o Ceará também aprovou similar [veja aqui].
Leia as análises sobre o espraiamento de leis sobre fake news pelo país, esse cenário no mundo e o uso político de ferramentas legais durante a pandemia – em inglês.
Estudo revela baixa transparência por parte da maioria dos estados brasileiros a respeito de informações básicas sobre a covid-19 [1]. Dentre os dados, destaca-se a falta ou imprecisão do número de testes realizados, disponibilidade de leitos de UTI, quantidade de infectados e mortos decorrentes do coronavírus. A análise conclui que cerca de 90% dos estados não tornam públicos dados que possibilitam o acompanhamento em detalhes da pandemia no Brasil [2]. O estado de São Paulo, epicentro brasileiro da pandemia com cerca de 40% das mortes confirmadas no país até a presente data, figura apenas na 10ª posição do ranking de transparência [3]. Já na cidade do Rio de Janeiro, levantamento médico na Rocinha aponta 145% de mortes a mais do que em divulgação feita pela prefeitura do Rio [4]. Em decorrência, estados e municípios afirmaram alto nível de subnotificação ao Ministério da Saúde dos casos de contaminação e mortes por covid-19, dificultando a construção do panorama nacional da pandemia e o controle pelo governo federal [5]. Moradores do morro do Borel, no Rio, lançaram o projeto ‘CoronaZap’ que visa identificar a contaminação do coronavírus na comunidade em combate à subnotificação da prefeitura [6]. A falta de divulgação de dados sobre o vírus também acontece no nível federal [veja aqui].
Leia análise sobre os riscos decorrentes de fake news e falta de informações no contexto da pandemia, entrevista com epidemiologista que explica a discrepância entre os números de contaminados na realidade e os divulgados pelos órgãos públicos, e veja como ranking de transparência pressiona os estados a divulgarem dados sobre a covid.
O deputado federal Osmar Terra (PMDB-RS) compara a crise sanitária da covid-19 a uma gripe sazonal, diz que no ‘início de junho vai acabar a epidemia’, e argumenta que ‘vai morrer mais [gente] de gripe sazonal no Rio Grande do Sul (RS)’ em comparação ao número de mortes por coronavírus no Brasil [1]. A fala do deputado, defensor de medidas contrárias ao isolamento social, acontece durante programa de rádio no contexto da crise da covid-19 . Segundo Osmar Terra, em torno de 950 pessoas morrem no inverno do RS por conta da gripe sazonal [2], o que não explicaria as medidas de isolamento social e prevenção ao coronavírus, e que as mortes decorrentes da covid-19 terminariam em junho [3]. No dia 10/07 foram registradas 70.398 mortes por covid-19, em um contexto de ascendência do número de casos. A afirmação subestima a crise da covid-19 e se insere em um contexto mais amplo: o presidente da república também já comparou o covid-19 a uma ‘gripezinha’ [veja aqui] e se opôs ao isolamento social decretado nos estados [veja aqui]. Em dezembro, as previsões de Terra se mostram falsas, sendo contabilizados um total de 184.992 óbitos e 7.120.103 casos de covid-19 no país desde o início da pandemia [4], o RS registra 8.000 mortes pela doença e mais de 400 mil casos de contaminação [5].
Leia análise sobre como o deputado Osmar Terra promove desinformação em meio a crise do covid-19.
Após terem decidido pelo fechamento do comércio como medida sanitária para a contenção da covid-19, governadores decretam e organizam sua reabertura. Em Santa Catarina, foi liberado o comércio de rua — os casos da doença aumentaram em 173% entre a reabertura do comércio de rua, em 13 de abril, e o dia 28 de abril [1]. Houve inclusive a reabertura de shoppings no estado [2]. Demais estados, com alguns exemplos listados a seguir, organizaram a flexibilização da abertura. Foi o caso de São Paulo, em que a reabertura do comércio exigia uma série de medidas que acabam por excluir a maior parte das áreas do relaxamento [3]. O Rio Grande do Sul também organiza a reabertura a partir de uma política de “distanciamento controlado [4]. Minas Gerais também tem plano de reabertura conforme o avanço do coronavírus, embora deixe ao encargo de prefeitos decisões sobre o assunto [5]. No Espírito Santo, há um plano de abertura gradual e alternada que é alvo de críticas pelos comerciários do estado [6]. No Distrito Federal, a reabertura do comércio, fixada para 11 de maio e depois adiada para o dia 18, foi suspensa por decisões da Justiça Federal [7].
Leia reportagem sobre os efeitos da quarentena sob a contenção da pandemia de covid-19 e sobre as medidas divergentes entre o governo federal e os estados.
O Ministério Público do Rio Grande Norte produz um relatório sobre ‘policiais antifascistas’, sob a justificativa de suposta criação de grupo ‘paramilitar’ no estado [1]. O documento contém dados pessoais de 23 servidores da área de segurança pública, incluindo nomes, endereços residenciais, fotografias e publicações em redes sociais [2]. O órgão responsável pela sua confecção é o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), cujas atribuições contém o controle externo da atividade policial; segundo o órgão, o levantamento teria sido feito apenas com dados públicos, não ficando claro como teriam sido obtidos os endereços e informações pessoais [3]. No relatório consta, inclusive, que o apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria ‘apologia de autor de crimes’, além de fotos de policial com a ex-presidenta Dilma Rousseff, ambos do partido da oposição ao governo federal PT [4]. Vale lembrar outras medidas envolvendo posicionamento político de servidores, como dossiê de funcionários públicos feito pelo ministério da Justiça [veja aqui], emissão de comunicados de órgãos públicos sobre uso de redes socias e publicações sobre o governo [veja aqui], incluindo nota técnica da Controladoria-Geral da União [veja aqui].
Leia análise sobre como a elaboração do relatório relembra práticas executadas durante o período de ditadura militar.