João Pedro Mattos Pinto, 14 anos, é morto dentro da casa do tio durante operação da Polícia Federal (PF) em conjunto com a Polícia Civil (PC) na cidade de São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro [1]. Segundo pessoas próximas, o menino brincava com os primos quando foi alvejado por policiais nas costas [2]. O garoto é socorrido em um helicóptero da PC e a família só é informada que o corpo estava no Instituto Médico Legal no dia seguinte (19/05), após campanha nas redes sociais [3]. Segundo a versão da polícia, seguranças de traficantes teriam invadido a casa e resistido com granadas. Testemunhas, por sua vez, afirmaram que somente os policiais teriam utilizado armas [4]. A morte de João Pedro, junto com a de outros jovens, gera reações da sociedade civil, como pedido ao Supremo Tribunal Federal (STF) de que ações policiais sejam suspensas, posteriormente acatado, [veja aqui] e a aliança entre movimentos da sociedade civil buscando defender a vida de jovens negros [5]. A reconstituição de sua morte foi suspensa por tempo indeterminado utilizando-se como motivo a decisão no STF [veja aqui] [6], e o delegado responsável pelo inquérito que investiga a morte do menino estava na operação que resultou nela [7]. A Organização das Nações Unidas (ONU) lamenta a morte do jovem e afirma que ‘violência letal contra adolescentes e jovens não deve ser naturalizada’ [8]. Posteriormente, o Conselho da ONU é acionado por entidades da sociedade civil brasileira por conta do crescimento da letalidade policial, sendo a morte de João Pedro um dos casos mencionados na denúncia [9]. Em quatro dias, além de João Pedro, Iago César dos Reis Gonzaga [veja aqui], João Vitor Gomes da Rocha [veja aqui] e Rodrigo Cerqueira da Conceição [veja aqui] também são mortos durante operações policiais no Rio de Janeiro. Em 18/05/21, após um ano da morte do menino, o caso pouco andou e o laudo da reconstituição feita em outubro ainda não saiu, mas a reabertura da ação criminal pelo MPF pode ajudar no processo [10]. Nesse mesmo mês, a Polícia Civil do RJ realiza a maior chacina da história da corporação, com 28 mortes [veja aqui].
Leia análises sobre o genocídio da população negra, a violência policial no Rio de Janeiro em meio à pandemia, a justiça para jovens negros e sobre a morte de crianças pela polícia militar.
João Vitor Gomes da Rocha, 18 anos, falece em fogo cruzado entre a Polícia Militar (PM) e traficantes durante entrega de cestas básicas na Cidade de Deus, no Rio de Janeiro [1]. O grupo que fazia as entregas abrigou-se na casa dos moradores no início do tiroteio; quando as pessoas puderam sair, encontram o jovem baleado [2]. Segundo testemunhas, João Vitor estaria indo comprar uma pipa. A PM, por sua vez, afirma em nota que fazia parte de uma quadrilha, e estaria armado [3] e teria aberto fogo contra tropa [4]. Anteriormente, a PM havia interrompido, com tiroteio, outra ação de distribuição de alimentos durante a pandemia [5]. Em quatro dias, além de João Vitor, Iago César dos Reis Gonzaga [veja aqui], João Pedro Mattos Pinto [veja aqui], Rodrigo Cerqueira da Conceição [veja aqui], este alvejado também durante entrega de cestas básicas, também são mortos durante operações policiais no Rio de Janeiro. Em 05/06 o SupremoTribunal Federal decide em caráter liminar pela suspensão de operações no estado [veja aqui].
Leia entrevista sobre racismo e a polícia e análise sobre ajuda humanitária nas favelas em tempos de pandemia.
Rodrigo Cerqueira da Conceição, 19 anos, é morto durante operação realizada pela Polícia Militar (PM) durante distribuição de cestas básicas no Morro da Providência [1]. Testemunhas relatam que, durante ação comunitária em um colégio, policiais militares encapuzados iniciaram tiroteio [2]. Segundo relatos, Rodrigo, que trabalhava informalmente com camelô, teria sido alvejado e colocado ferido em uma viatura sob um lençol, a despeito de protestos dos moradores [3]. Já de acordo com a PM, a patrulha havia sido atacada por criminosos e somente um suspeito (que portaria drogas e munição) teria sido ferido [4]. Segundo a corporação, os policiais teriam prestado socorro e o suspeito teria falecido depois [5]. Em quatro dias, além de Rodrigo, Iago César dos Reis Gonzaga [veja aqui], João Pedro Mattos Pinto [veja aqui] e João Vitor Gomes da Rocha [veja aqui], este alvejado também durante entrega de cestas básicas, são mortos durante operações policiais no Rio de Janeiro. Em 05/06, o SupremoTribunal Federal decide em caráter liminar pela suspensão de operações no estado [veja aqui].
Leia entrevista sobre racismo e a polícia e análise sobre ajuda humanitária nas favelas em tempos de pandemia
Levantamento mostra que, no mês de abril, período em que o Rio de Janeiro está em quarentena por causa da pandemia da covid-19, há crescimento de 43% nas mortes cometidas por policiais no estado [1] e em São Paulo, também se registra aumento da letalidade policial durante a pandemia [veja aqui]. Ainda, há queda no índice de outros crimes, como roubos de rua, que apresenta redução de 64% [2]. Nesse cenário, morre em operação policial João Pedro, de 14 anos [veja aqui] e diversas entidades da sociedade civil protestam contra o fato [3]. No Supremo Tribunal Federal (STF), requer-se suspensão de operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia [4]. O pedido é feito na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, de 2019, que trata da política pública do governador Wilson Witzel (PSL) no Rio de Janeiro [5]. Edson Fachin, ministro da corte, decide pela suspensão de operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia [6]. Em sua decisão, afirma que ‘nada justifica que uma criança de 14 anos de idade seja alvejada mais de 70 vezes. O fato é indicativo, por si só, de que, mantido o atual quadro normativo, nada será feito para diminuir a letalidade policial, um estado de coisas que em nada respeita a Constituição’ além de apontar que o Estado brasileiro tem o dever de rever seus protocolos por já ter sido condenado internacionalmente pela violência policial [7]. Em julho, o estado tem uma queda de 73% na letalidade policial [8] e o conselho da Organização das Nações Unidas recebe denúncia contra a violência no Rio de Janeiro [9]. Em 04/08, o plenário do STF confirma a liminar concedida por Fachin para suspender as operações [10]. Em nova decisão do STF em 17/08, em outra ação, o tribunal proíbe o uso de helicópteros e da atuação das operações em áreas hospitalares e escolares [11]. Em 26/11, Fachin determina prazo de cinco dias para que o estado do Rio de Janeiro informe porque do prosseguimento de ações policiais em comunidades [12], mesmo após a decisão do STF proibindo as operações durante a pandemia [13].
Leia as análises sobre os dados da segurança no estado do Rio, sobre o ano de 2019 e a letalidade policial no estado, sobre a ação da polícia durante a quarentena, sobre a incidência da violência policial na vida de jovens e sobre violência racial nos Estados Unidos e no Brasil.
O deputado estadual Filippe Poubel (PSL-RJ) entra, acompanhado de seguranças armados, nas instalações de hospital de campanha para o combate à covid-19 no Rio de Janeiro e realiza ‘vistoria’ para verificar a oferta de leitos [1]. A invasão é transmitida ao vivo nas páginas do deputado nas redes sociais. Durante a ‘vistoria’, ocorrida aos gritos, o deputado afirma que iria ‘tocar o terror’ [2]. De acordo com a administração do hospital, que classificou a ação do político como ‘inapropriada’, uma das pessoas que acompanhava Poubel ‘chegou a sacar uma arma’ [3]. Filippe é apoiador da política de Bolsonaro em relação à covid-19 [veja aqui] e utilizou-se desta invasão para apoiar a candidatura de seu irmão, o policial militar Glauber Poubel [4]. Esta foi a primeira iniciativa desta espécie, dias depois, uma ação similar ocorreria em São Paulo [veja aqui]. Em junho, Bolsonaro recomendaria que seus apoiadores fizessem o mesmo em todo o Brasil [veja aqui], o que fez com que invasões semelhantes fossem replicadas em diversos locais [veja aqui]. Essa incitação é criticada em diversos âmbitos, sendo classificada por alguns juristas como uma infração penal [5].
Leia a análise sobre as invasões de hospitais, seus riscos e seu uso enquanto método político.
Governo da Bahia aprova lei contra disseminação de fake news na pandemia [1]. Projetos semelhantes foram aprovados no Acre [veja aqui], Paraíba [veja aqui], Ceará [veja aqui] e Roraima [veja aqui]. Neste caso, a lei estabelece multa de R$ 5 mil a R$ 20 mil para quem divulgar notícias ou informações falsas ou sem procedência oficial sobre epidemias, endemias ou pandemias no Estado da Bahia, sem citar a fonte primária [2]. A lei também afirma que não são consideradas ilícitas as publicações jornalísticas devidamente assinadas e o compartilhamento de opinião pessoal, desde que seja ‘evidenciado o caráter não-fático e opinativo do texto’ [3]. Além disso, é estabelecido que os valores arrecadados com as possíveis multas serão destinados a ações de combate a pandemias e epidemias [4]. O governador do Estado, Rui Costa (PT), afirma que a lei se justifica porque o Brasil vive uma ‘peste’ que é o ‘vírus da mentira e da calúnia’ e que, no contexto da pandemia, têm sido divulgadas notícias sobre formas de cura sem qualquer comprovação científica [5]. As denúncias sobre notícias falsas podem ser feitas por whatsapp ou pelo site ‘Bahia contra fake’ [6]. Leis com esse conteúdo têm sido criticadas por especialistas, pois não estabelecem o que são ‘notícias falsas’ e não consideram o fato de que grande parte das informações falsamente divulgadas são feitas por pessoas sem a consciência de sua falsidade [7]. Tais leis também podem restringir a liberdade de expressão e imprensa no país [8]. Entre o começo de março e o começo de junho de 2020, 26 projetos de leis foram lançados para combater notícias falsas na pandemia [veja aqui] e ao menos 21 um dos 26 estados brasileiros apresentaram iniciativas nesse sentido [9].
Leia análise sobre o surgimento de projetos que pretendem alterar a estrutura de regulação da liberdade de expressão na internet.
Um mulher negra de 51 anos, comerciante, é pisoteada por policial em São Paulo, na zona sul da cidade [1]. A ação foi divulgada para o público em vídeo no programa Fantástico, em que os dois policiais alegaram estar se defendendo [2]. A vítima afirma ter desmaiado e que estaria defendendo um amigo [3]. Ainda, informa que tentou denunciar o caso à Corregedoria da corporação, mas que não conseguiu, já que o órgão não estava atendendo por causa da pandemia da covid-19 [4] e diz temer retaliação da tropa [5]. Segundo a Secretaria de Segurança Pública, houve afastamento e abertura de inquérito contra os profissionais [6]. Comparações com o caso de George Floyd, homem negro norte-americano morto em uma abordagem policial com um ‘mata-leão’ (espécie de enforcamento), são evocadas [veja aqui] – a Polícia Militar afirma que os dois casos não são relacionados porque, no caso dos Estados Unidos, o procedimento policial poderia estar previsto (e não no brasileiro) [7]. Apesar disso, após caso de policiais terem abordado um motoboy com enforcamento, o governador João Doria proibiu o uso do ‘mata-leão’ [veja aqui]. Visando coibir a violência policial, também anunciou o uso de câmeras nos uniformes dos policiais – excluindo da medida, entretanto, as unidades mais letais da PM [veja aqui]. A letalidade policial cresceu mesmo em meio à pandemia de coronavírus no estado de São Paulo [veja aqui] e Rio de Janeiro [veja aqui] e tem sido alvo de protestos [veja aqui].
Leia análises sobre abuso policial em rotina e a saúde mental das pessoas negras no contexto de racismo brasileiro.
Diversos protestos contra o racismo e fascismo são reprimidos pela Polícia Militar (PM) ao redor do país. No Rio de Janeiro, um policial militar aponta sua arma para um manifestante num ato chamado ‘Vidas negras importam’, no contexto de aumento da violência policial no estado [veja aqui] e morte de jovens negros [veja aqui]; a PM ainda reage com balas de borracha e bombas de efeito moral, além de utilizar spray de pimenta para dispersar pessoas em outro ato realizado no mesmo dia [1]. Em São Paulo, protesto pró-democracia (liderado por torcidas organizadas de times de futebol antifascistas) tem confusão com apoiadores do presidente Jair Bolsonaro [2] e termina com violência policial, ação da tropa de choque da PM e detenção dos manifestantes [3]. O governador João Doria elogia a ação da corporação e afirma que esta agiu para ‘manter a integridade física dos manifestantes’; destaca-se ainda que o estado também registra aumento da violência policial [4]. Curitiba também registra episódio semelhante [5]. Protestos contra o racismo têm acontecido ao redor do mundo apesar da pandemia do coronavírus, tendo seu estopim com a morte de George Floyd nos Estados Unidos [6]. Também neste fim de semana, Bolsonaro comparece a protesto de seus apoiadores em Brasília [veja aqui].
Leia as análises sobre a comparação entre os protestos no Brasil e nos EUA, democracia e raça, o papel das torcidas organizadas e símbolos usados nos atos pró-governo.
O Ministério Público de São Paulo (MP SP) abre inquérito civil para averiguar suposto ‘gabinete do ódio’ contra o deputado estadual Douglas Garcia (PSL) e Edson Salomão, seu chefe de gabinete e presidente do Instituto Conservador [1]. A investigação busca apurar se, durante o horário do expediente na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) e com uso de recursos públicos, houve manifestação de ódio contra figuras públicas, divulgação de postagens do Instituto Conservador e incentivo a coleta de assinaturas para a formação do partido Aliança pelo Brasil (do presidente da República Jair Bolsonaro) [2]. Em 01/06, Garcia pede que enviem dados de pessoas que se autodenominam ‘antifascistas’ para seu endereço de e-mail e no dia seguinte grava vídeo com suposto dossiê [3], em contexto de protestos desses grupos contra o governo [veja aqui]. Com o vazamento de uma lista com os dados de cerca de 900 pessoas (cidadão comuns classificados como antifascistas) muitos atribuem ao deputado sua confecção e vazamento dos dados [4]. O MP SP irá investigar se houve uso da administração pública para a elaboração do dossiê [5] e deputadas do PSOL, partido da oposição ao PSL, pedem a cassação de Garcia [6]. O deputado nega que tenha elaborado o dossiê e afirmar ter entregue as informações à polícia [7]. Posteriormente, liga-se servidores do gabinete de Garcia à ataques de figuras como a parlamentar Joice Hasselman, vista como opositora à setores do governo Bolsonaro, além de instituições como o Supremo Tribunal Federal [8]. Em agosto, Garcia é condenado pela justiça paulista a pagar indenização de R$ 20 mil por conta do dossiê [9], e posteriormente ele afirma que Eduardo Bolsonaro, filho do presidente e deputado federal, teria entregado cópia do dossiê para a Embaixada dos EUA [10]. Na sequência, Eduardo se torna réu de ação no STF, sob justificativa de que a entrega de cópia do dossiê viola a Lei de Segurança Nacional [11]. Em julho, ação sigilosa do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) monitora servidores antifascistas e repassa informações a outros órgãos do governo [veja aqui], e o STF, acionado sobre a ação, proíbe a elaboração de dossiês pelo MJSP [12].
Leia análises sobre o que é o antifascismo, o papel de Garcia no inquérito de fake news e comunicado da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.
Mortes cometidas pela polícia nos primeiros quatro meses de 2020 crescem em 31% em São Paulo [1]. Somente no mês de abril, em que o estado estava em quarentena, houve crescimento de 43% no número de pessoas mortas em ações da polícia [2]. De 20/03 a 07/04 , houve queda em outros crimes, como 65% no caso de violência patrimonial, mas também registrou-se aumento de 10% nos homicídios [3]. De acordo com levantamento, entre janeiro e março de 2020 houve uma a morte a cada oito horas e meia perpetrada por policiais; desses casos, 64% das vítimas com registro de raça eram negras [4]. Outro levantamento indica que o número de mortes por causa de intervenção policial’ que envolvem a Polícia Militar subiu 54,6% em abril, já no período de isolamento no estado [5], e mais um indica que em maio houve aumento de 6% na letalidade policial, totalizando o quarto mês de alta em 2020 [6]. Para especialistas, esses dados diriam também respeito à violência policial nas franjas da cidade [7]. Ouvidor da polícia do estado de São Paulo afirma que ‘não tem justificativa’ o aumento significativo da violência policial durante a pandemia, tendo em vista que muitas pessoas se encontram em quarentena [8]. No Rio de Janeiro, também é registrada alta no número de mortes por policiais em meio a pandemia [veja aqui]. Pelo país, eclodem protestos que têm como pauta a igualdade racial e o fim da violência contra a população negra [veja aqui].
Leia análise que aponta relação entre números de letalidade e de vitimização policial no país, e veja boletim sobre estatísticas criminais do Estado de São Paulo no primeiro trimestre de 2020.