Em evento na cidade de Tavares no Rio Grande do Sul (RS), diante de uma plateia de ruralistas, o Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ameça abrir processo administrativo contra todos os funcionários do ICMBio, pois nenhum deles está presente na cerimônia [1]. Salles complementa que ‘o momento de perseguição às pessoas de bem nesse país acabou’, em referência à fiscalização promovida pelos agentes do órgão [2]. Na agenda do ministro no RS não consta este compromisso, portanto, os funcionários ameaçados não foram convidados para o evento [3]. A região visitada por Salles abarca o Parque Nacional da Lagoa do Peixe, que sofre pressões do setor produtivo para seu rebaixamento a nível de área de proteção ambiental (APA), cujas restrições de uso são mais brandas [4]. Dois dias depois, o presidente do instituto, Adalberto Eberhard pede demissão e alega motivos pessoais [5]. No final do mês, o presidente substituto e dois diretores também pedem demissão dos cargos após a exoneração de Eberhard [6] e três agentes de cargos comissionados são exonerados por Salles, dentre eles, Fernando Weber, que comandava a unidade do ICMBio na Lagoa do Peixe desde janeiro de 2017 [7]. O ministro anuncia que militares irão ocupar os cargos vagos [8] e, questionado sobre a demissão de Weber, afirma que é uma ‘prerrogativa do Executivo escolher’ [9]. No ano seguinte, o ministro demite o presidente do órgão,que substituiu Eberhard, após desavenças [10]. Os acontecimentos inserem-se num contexto de desmonte das políticas de fiscalização ambiental [veja aqui] através de pressões sobre os órgãos de controle, com a exoneração de servidor que multou o Presidente Jair Bolsonaro [veja aqui], do diretor do Inpe [veja aqui], do chefe do parque de Fernando de Noronha [veja aqui]; a transferência de especialista em golfinhos da ilha [veja aqui] e a realocação de fiscais que multaram o presidente de agência federal [veja aqui].
Leia a análise sobre os ataques aos órgãos de proteção ambiental desde a ascensão de Bolsonaro
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, impõe que todas as demandas de imprensa relacionadas à atuação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) sejam direcionadas à Assessoria de Comunicação do Ministério do Meio Ambiente (MMA) [1] [2]. Isto significa que os órgãos não podem se manifestar publicamente sem submeter, previamente, as informações ao (MMA) [3]. Segundo apuração, nesta data a imprensa entra em contato com o Ibama e recebe a seguinte resposta: ‘Por orientação do Ministério do Meio Ambiente (MMA), demandas de imprensa relacionadas à atuação do Ibama devem ser direcionadas à Assessoria de Comunicação do MMA’ [4]. O procedimento tem sido adotado desde a exoneração do chefe da comunicação social do Ibama [5]. Embora a assessoria de comunicação do Ibama ainda exista, a medida a esvazia completamente [6]. O ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) já vem cumprindo a determinação há alguns dias [7]. Interferências em órgãos ambientais ocorreram em outros momentos, como a exoneração do diretor do Ibama [veja aqui] e a transferência de pesquisador do ICMBio [veja aqui].
O presidente Jair Bolsonaro veta campanha publicitária do Banco do Brasil dirigida à população jovem e com o objetivo de representar a diversidade racial, sexual e de gênero no Brasil [1]. O comercial estava no ar desde o início de abril e apresentava atrizes e atores negros e uma jovem transexual [2]. Após reclamações de Bolsonaro feitas ao presidente do banco, a veiculação do vídeo é suspensa e o banco demite o diretor de Comunicação e Marketing [3]. Em 24/04, o governo envia comunicado às empresas estatais determinando a submissão prévia de toda publicidade à avaliação da Secretaria de Comunicação Social (Secom) [4] [veja aqui]. Dois dias depois, o governo resolve recuar e afirma que a Secom ‘não observou a Lei das Estatais’ porque não cabe à administração direta intervir no conteúdo de publicidade [5]. Bolsonaro se pronuncia afirmando que ‘a massa quer respeito à família’, que dinheiro público não deve ser usado desse modo e que vídeo contrariava ‘agenda conservadora’ de seu governo [6]. Em maio, o Ministério Público Federal ajuíza ação contra a União por censura, racismo e homofobia, solicitando a veiculação do comercial e 51 milhões em indenização para que seja aplicada em campanha de conscientização de enfrentamento ao racismo e à LGBTQfobia [7]. No mesmo mês, Bolsonaro critica ‘turismo gay’ [veja aqui] e, em maio, baixa decreto que exclui preocupações com turismo LGBT [veja aqui]. Também, nomeia novo presidente na Fundação Palmares que defende não existir ‘racismo real’ no país [veja aqui]. Em maio de 2020, o Banco do Brasil volta atrás na decisão de retirar propaganda de site acusado de compartilhar ‘fake news’, após crítica feita por Carlos Bolsonaro, filho do presidente [veja aqui].
Leia as análises sobre a intervenção do governo na comunicação, os retrocessos para a população LGBT+ em 2019 e o racismo estrutural vivenciado no país.
O ministro da Educação Abraham Weintraub relaciona, em seu discurso de posse, o educador Paulo Freire a resultados ruins na educação [1]. Nas palavras do novo ministro, ‘se (…) Paulo Freire seria uma unanimidade, por que a gente tem resultados tão ruins comparativamente a outros países? A gente gasta em patamares do PIB igual aos países ricos’ [2]. Embora o montante gasto em voluma seja 6% maior do que a média dos países pertecentes à Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o valor proporcional é equivalente à metade do que os demais países gastam [3]. Vale destacar que Paulo Freire é constantemente associado pelo governo Bolsonaro à esquerda, sendo alvo de ataques por isso [4] [veja aqui]. Contudo, o pensador é referência internacional na área de ciências humanas e seu livro ‘Pedagogia do oprimido’ é o único brasileiro constante na lista de cem mais pedidos pelas universidades de língua inglesa [5]. Freire é constantemente alvo de ataques pelo atual governo – o presidente o chamou de ‘energúmeno’ [veja aqui] e criticou sua ideologia [veja aqui]; Weintraub o critica outras vezes [veja aqui] e os filhos do presidente [veja aqui] também atacam o educador.
Leia as análises sobre o legado de Paulo Freire para a educação brasileira e sua relação com o pensamento reacionário
Atendendo a pedido do chefe do Gabinete de Segurança Nacional (GSI), general Augusto Heleno, o ministro da Justiça, Sérgio Moro, baixa portaria que autoriza o emprego da Força Nacional de Segurança Pública (FNS) para ‘realizar a segurança’ da marcha indígena que ocorrerá em 19/04 por ocasião do ‘Dia do Índio’ na Praça dos Três Poderes e na Esplanada dos Ministérios [1]. A medida tem prazo de 33 dias e inclui o período de reunião do ‘Acampamento Terra Livre’ (ATL), o qual o presidente Jair Bolsonaro chamou de ‘encontrão de índio’ [2]. A justificativa oficial, segundo Heleno, é ‘desencorajar que manifestações descambem para a violência e provoquem danos em pessoas ou no patrimônio público’ [3]. Em resposta, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) declara em nota que ‘não somos violentos, violento é atacar o direito sagrado a livre manifestação com tropas armadas’ [4]. No mesmo dia, o partido PSOL protocola projeto de decreto legislativo para anular a medida [5]. O encontro do ATL ocorre na semana de 25/04, como previsto, sem o uso efetivo da FNS, mas é marcado por tensões e negociações entre representantes indígenas e a polícia militar [6]. Ressalte-se que o emprego da FNS é autorizado novamente por Moro no mês seguinte para os protestos pela educação [veja aqui]. No ano seguinte, o presidente defende o uso da FNS para conter manifestantes também [veja aqui].
Leia análises sobre o que é a Força de Segurança Nacional, as motivações para contestar a comemoração do ‘Dia do Índio’ e as tensões entre povos indígenas e o governo Bolsonaro
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, exonera o diretor de planejamento do Ibama [1], Luiz Eduardo Nunes e o substitui por militar. Para o lugar do antigo diretor de planejamento do órgão é indicado o major da Polícia Militar de São Paulo, Luis Gustavo Biagioni [2]. Dentre as competências do cargo destaca-se a elaboração e proposição do planejamento estratégico da autarquia, o supervisionamento e a avaliação do desempenho dos seus resultados institucionais [3]. O cargo é de livre nomeação e exoneração, mas apresenta requisitos mínimos a serem cumpridos [4], como a compatibilidade entre ele e o perfil profissional ou formação acadêmica do indicado. Nunes era servidor de carreira com experiência na gestão da instituição; em contrapartida, não há informações públicas de que o seu substituto, Biagioni, já atuou na área. O policial militar permaneceu no cargo por apenas três meses, sendo deslocado para a secretaria executiva do Ministério do Meio Ambiente [5]. Em seguida, é substituído por Luis Carlos Hiromi Nagao [6]. Essa nomeação é parte de um processo de militarização do Ministério do Meio Ambiente; ao menos 12 policiais militares e integrantes das Forças Armadas já foram nomeados para cargos da pasta [7]. Em oportunidade anterior, o presidente Jair Bolsonaro defendeu uma ‘limpa’ no Ibama e no ICMBio [veja aqui]. Antes das mudanças no cargo do Ibama, o ambientalista Adalberto Eberhard pediu demissão do comando do ICMBio, após ameaças por parte do ministro do Meio Ambiente [veja aqui]. Outros três diretores do instituto também pediram para deixar o cargo e foram substituídos por militares [8]. Interferências em instituições do governo ligadas ao meio ambiente ocorreram em outros momentos, como a exoneração do diretor do Ibama e sua substituição por coronel da Polícia Militar [veja aqui], da coordenadora do Inpe [veja aqui], da diretoria completa do ICMBio – também em favor de militares [veja aqui], do diretor do Inpe [veja aqui] e a transferência de pesquisador do ICMBio [veja aqui]. Em 2020, inclusive, a soma de militares em órgãos socioambientais é de 99 [veja aqui].
Nas redes sociais, o Presidente Jair Bolsonaro comemora a redução de novas ocupações promovidas pelo Movimento Sem Terra (MST) e afirma que pretende tipificar tais ações como terrorismo [1]. O presidente defende implantar modelo em que os moradores possam atirar naqueles que entrarem em sua propriedade sem autorização, como forma de ‘legítima defesa’, e afirma que ‘se o outro lado resolver morrer é problema dele’ [2]. Durante a campanha eleitoral, Bolsonaro já havia suscitado a proposta de criminalizar as ações do MST como atos terroristas e chamou seus membros de ‘marginais’ [3]. Em outras oportunidades, o presidente compara o MST com o Hezbollah [veja aqui], grupo de militantes radicais, e afirma que ambos são terroristas [4]. Na ocasião, o MST responde em nota que o presidente ‘não conhece a realidade no campo’ e que ‘terrorismo é cortar as verbas da ciência e da educação brasileira’ [5]. A fala do presidente se insere no quadro de desmonte das políticas de reforma agrária [veja aqui], com a suspensão reiterada desse procedimento [veja aqui] e consequente redução no número de famílias assentadas [veja aqui], e de favorecimento de ruralistas, através de indicações para o Incra [veja aqui], aceleração da regularização fundiária [veja aqui] e ampliação do armazenamento de armas [veja aqui]. Em outros momentos, Bolsonaro classifica manifestações chilenas [veja aqui] e antifascistas [veja aqui] de ‘terroristas’ e o Ministro do Gabinete de Segurança Institucional chama a ex Presidente Dilma Rousseff de terrorista [veja aqui].
Leia mais sobre o que é o Movimento Sem Terra e a Reforma Agrária
O Ibama arquiva diversos processos contra plantações irregulares de soja em áreas protegidas por lei federal na região de Lages, em Santa Catarina, sem instrução processual e análise técnica [1]. Em despacho, o presidente do órgão, Eduardo Bim, indica que as práticas estão amparadas pelo código ambiental do estado [2]. Em nota, a Associação Rural de Lages afirma que o cancelamento resulta de ‘cinco meses de intensa mobilização’ e o partido Novo, ao qual o Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, é filiado, comemora a medida [3]. O Ministério Público Federal investiga a decisão, que é tomada após reunião entre Bim, a equipe técnica do Ibama e um grupo de políticos e empresários da região [4]. Em outros momentos, o Ibama anula multa do Presidente Jair Bolsonaro por pesca ilegal , autoriza construção de hidrelétrica a despeito de pareceres técnicos contrários [veja aqui] e junta-se ao ICMBio para acelerar procedimentos de licenciamento ambiental em unidades de conservação [veja aqui]. Os acontecimentos se enquadram no contexto de desmonte das políticas ambientais promovidas pelo governo Bolsonaro, com a redução de multas [veja aqui], exoneração de diversos superintendes [veja aqui] e funcionário do Ibama [veja aqui] e corte de orçamento no instituto . Ainda, Bolsonaro ironiza a questão ambiental [veja aqui] e promete interromper a queima de maquinários usados no desmatamento ilegal [veja aqui] – o, que, no ano posterior, tem repercussão em caso de maquiagem de dados [veja aqui] – e os ministros do Meio Ambiente e da Agricultura incentivam a produção de soja ilegal [veja aqui].
Leia as análises sobre a política ambiental no primeiro ano do governo Bolsonaro e seu impacto no controle ambiental
Pedido via lei acesso à informação (LAI), realizado pela Folha de São Paulo sobre estudos e pareceres técnicos que respaldam a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma da Previdência é negado pelo Ministério da Economia sob a justificativa de que os documentos solicitados seriam ‘de acesso restrito, por se tratarem de documentos preparatórios’ [1]. Na prática o sigilo sobre os estudos produzidos pelo ministério impede o acesso dos cidadãos e parlamentares sobre cálculos do impacto econômico e fiscal das novas medidas propostas [2]. A restrição das informações é rebatida por especialista que apontam a ausência de previsão legal e a incongruência de impor sigilo sobre proposta já encaminhada para amplo debate no Legislativo [3]. A falta de transparência também gera indignação por parte de parlamentares, os quais pressionam o Executivo para liberação dos estudos, o que efetivamente é confirmado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) via redes sociais [4]. Em 25/04, o governo federal divulga documento oficial com o detalhamento dos cálculos utilizados para fundamentar a PEC [5]. Vale notar que em janeiro [veja aqui] e em fevereiro [veja aqui] já tinham sido editadas normativas que ampliaram o rol de agentes permitidos a classificar dados públicos como ultrassecretos. Em outras oportunidades, o Ministro da Justiça se nega a fornecer informações sobre sua agenda de reuniões [veja aqui], a Controladoria Geral da União altera regras de transparência, ampliando sigilo [veja aqui], e a justificativa de que ‘documentos seriam preparatórios’ é repetida pelo governo federal [veja aqui] para decretar sigilo de dados [veja aqui].
Leia análise para entender quais os retrocessos no acesso a informações públicas durante a gestão de Bolsonaro
O ministério da Agricultura (MAPA) pede a Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, o fim da lista de espécies aquáticas ameaçadas [1], afirmando ela estar prejudicando economicamente o setor pesqueiro [2]. A lista foi publicada em 2014 com intuito de divulgar espécies que foram avaliadas pelo risco de extinção e são proibidas de serem comercializadas, capturadas e transportadas entre outros impedimentos [3]. As avaliações foram feitas em 5.148 espécies, que incluem 100% dos peixes marinhos e continentais brasileiros e somente 9% foram classificadas como ameaçadas de extinção [4]. Um Grupo de Trabalho foi formado em 2017 para analisar as questões relacionadas à conservação e o manejo sustentável no caso de espécies consideradas importantes socioeconomicamente para o país [5]. No pedido feito pelo MAPA, foram criticadas as metodologias utilizadas pela União Internacional para Conservação da Natureza para elaborar a lista, alegando que o Brasil deve se orientar pelos próprios critérios e não utilizar critérios internacionais [6]. Especialistas afirmam que as críticas são infundadas e demonstram a falta de conhecimento sobre o processo de avaliação [7]. A coordenadora do programa Mata Atlântica e marinho da WWF-Brasil, organização ambiental, alega que a lista não ameaça o desenvolvimento econômico e é o principal documento oficial e mais atualizado sobre o estado de saúde das populações de peixes e demais invertebrados [8]. O ministério do Meio Ambiente afirma que o pedido será analisado [9].
Leia a análise sobre a opnião de especialistas a respeito das criticas feitas à lista de espécies aquáticas ameaçadas