O presidente Jair Bolsonaro anuncia a jornalistas no Palácio da Alvorada que o governo deve apresentar projeto de lei (PL) que permitirá operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) para a reintegração de posse em áreas rurais [1]. A ‘GLO rural’, como apelidada pelo presidente, teria o objetivo de acelerar a retirada de invasores de propriedades rurais e dissuadir possíveis invasores no futuro [2]. Em nota, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, grupo que é afetado pela violência no campo, repudia a proposta do presidente e defende a função social da propriedade prevista na Constituição [3]. Na semana anterior ao anúncio, o presidente enviou ao Congresso o PL 6125/2019, que flexibiliza a aplicação do instituto da legítima defesa a militares em operações de GLO [veja aqui]. A nova proposta de mudança apresentada nesta data faz parte de pacote de medidas na área de segurança pública, que inclui não apenas as propostas supramencionadas, mas também a proposta de mudança da definição de legítima defesa no Código Penal [veja aqui] e a garantia absoluta de defesa aos proprietários de áreas urbanas e rurais contra invasores [veja aqui]. No ano seguinte, o presidente apresenta o PL 191/2020 [4] que propõe a regulamentação do art. 176 da Constituição para permitir mineração, pecuária e geração de energia hidrelétrica em terras indígenas , medida que também é vista como ameaça a proteção e a direitos de minorias [5].
Leia as análises sobre o que são operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e as propostas do governo no ambiente rural.
O presidente Jair Bolsonaro assina decreto com as regras para o indulto de natal de 2019 [1] com medidas que autorizam o perdão da pena de agentes de segurança pública condenados por crimes culposos – sem intenção – no exercício da profissão [2]. O decreto ainda concede liberdade para militares das Forças Armadas presos por crimes não intencionais relacionados às operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e que tenham cumprido um sexto da pena [3]. Além de ser a primeira vez que um indulto é concedido a uma categoria profissional específica, a medida reforça a ideia de um excludente de ilicitude, isentando de culpa policiais e militares que praticam excessos na atuação, proposta no pacote anticrime [veja aqui], beneficiando policiais militares que integram a base eleitoral de Bolsonaro [4]. Para juristas, o indulto de Bolsonaro viola a Constituição Federal por selecionar arbitrariamente uma categoria profissional como beneficiária [5]. Vale lembrar que o presidente é reconhecido por elogiar policiais militares que matam em serviço [veja aqui] e por ampliar o acesso a armas de fogo para agentes de segurança pública [veja aqui].
Leia análises para entender o que é o indulto de natal, e para compreender as consequências sobre a população prisional.
O presidente Jair Bolsonaro sanciona lei que extingue a possibilidade de prisão disciplinar para policiais militares (PMs) e bombeiros [1]. A lei determina que os 26 estados e o Distrito Federal tenham um ano para promover mudanças consoantes a nova legislação [2]. Os entes federados devem promulgar um Código de Ética e Disciplina por meio de lei estadual ou federal que determine transgressões, conceitos, recursos, recompensas e novas punições aos PMs e bombeiros [3]. A prisão disciplinar tem tempo máximo de 30 dias e era usada como sanção em mais de 100 transgressões, entre elas, falta ou atraso sem justificativa, disparo por negligência e omissão diante de ordem recebida [4]. Os deputados federais, subtenente Gonzaga (PDT-MG) e Jorginho Mello (PL-SC), que assinam o projeto, afirmam que a lei é um tratado de cidadania dos policiais e bombeiros’ e que a prisão disciplinar é um ‘instrumento pesado de punição’ [5]. Em pelo menos dois estados, Minas Gerais e Ceará, esse tipo de prisão já tinha sido abolido [6]. Em 24/11/2020, o governador do Rio de Janeiro Cláudio Castro (PSC) ajuíza ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a lei [7]. Castro afirma que a prisão é ‘instrumento disciplinar crucial para manutenção da hierarquia’ e que a extinção da prisão disciplinar expõe uma ‘indevida interferência na organização e funcionamento da Administração Pública estadual’ [8]. Em reação, a Advocacia-Geral da União (AGU) envia manifestação ao STF em defesa da lei sob justificativa de que não há qualquer ofensa à autonomia federativa e que a norma não afeta a hierarquia militar [9]. A extinção da prisão preventiva por Bolsonaro é um aceno do presidente aos militares; em 26/05/2020 Bolsonaro edita medida que aumenta a remuneração dos PMs [veja aqui]; em dezembro concede indulto a policiais presos por crimes culposos [veja aqui] como já havia feito em 2019 [veja aqui]. Além disso, no dia 10/07/21, Bolsonaro edita decreto que permitia a ocupação de cargos no governo por militares durante tempo indeterminado [veja aqui].
Leia sobre como Bolsonaro sanciona benesses aos policiais e agentes de segurança pública em busca de fortalecer a base eleitoral.
Carros-chefe da educação no governo Bolsonaro, as escolas cívico-militares (Ecim) [veja aqui] terão atividade semanal voltada ao ‘desenvolvimento de valores e atitudes’ [1]. Diversos detalhes do programa ainda não são divulgados nesta data [2], mas apuração da imprensa revela que será implementado o ‘projeto valores’ [3]. De acordo com ofício do Ministério da Educação (MEC), tal projeto fica a cargo da direção escolar e é obrigatório [4]. O projeto implica também o acompanhamento dos alunos por meio de indicadores [5]. No mês seguinte, o MEC divulga, após pedido pela lei de acesso à informação (LAI) [6], manual [7] das Ecim, que traz mais informações e rigorosas normas de conduta [8]. O projeto organiza-se em 10 competências a serem desenvolvidas através do ‘envolvimento de todos os profissionais’ e deve ser avaliado continuamente para ver se alcançou os ‘objetivos desejados’; dentre as competências, estão a responsabilidade e cidadania, o trabalho e o projeto de vida e a cooperação [9]. O projeto não é previsto nas diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (documento que norteia os currículos da educação básica no país [10]), a que as Ecim se submetem [11]. Quanto às condutas proibidas no manual, estão o uso de adereços não discretos e o tingimento de cabelos e também são previstas notas de comportamento aos alunos [12]. A repercussão da divulgação do manual é negativa e se soma às diversas críticas ao programa já anunciado ano passado [13] [veja aqui]. Críticos e especialistas mencionam o apego à disciplina, em detrimento dos valores de justiça social e respeito à diversidade [14] e também o foco do projeto na formação para o trabalho, em prejuízo de uma concepção mais abrangente de educação [15]. Quando da ditadura militar, aulas de educação moral e cívica se tornaram obrigatórias e tinham por objetivo, por exemplo, a transmissão de valores de cidadania [16]; o paralelo pode ser feito ao presente evento, que já era cotado na campanha presidencial [17].
Leia as análises sobre as diferenças entre Ecim e escolas militares, seus problemas, o rigor do manual divulgado e as aulas de educação moral e cívica durante a ditadura militar.
O Presidente Jair Bolsonaro convida o general Walter Souza Braga Netto para comandar a Casa Civil no lugar do Ministro Onyx Lorenzoni [1]. Braga Netto é chefe do Estado-Maior do Exército, liderando o Comando Militar do Leste, e participando em 2018 como interventor militar na área de segurança pública do Rio de Janeiro [2]. Até a data, o primeiro escalão do governo já contabiliza 08 integrantes militares, contando com o vice-presidente, de modo que todos os ministérios com gabinete no Palácio do Planalto passam a ser comandados por membros da reserva do Exército e da Polícia Militar [3]. Vale lembrar que na semana anterior a Ancine nomeou capitão de Mar e de Guerra para compor a sua Diretoria Colegiada [veja aqui]. As reações do Congresso Nacional à nomeação de Braga Netto são heterogêneas, há preocupações com a militarização da alta cúpula do governo, mas também há elogios à nomeação por parte do presidente da Câmara dos Deputados [4]. No mês seguinte, levantamento aponta a presença de 2.897 militares da ativa no Executivo Federal, confirmando receios sobre a ocupação fardada no governo [veja aqui].
Leia análise com o perfil e o histórico do novo Ministro da Casa Civil.
Seguindo uma tendência desde o início deste governo [veja aqui], os militares vêm ocupando mais cargos na Administração Pública. De julho de 2019 para fevereiro de 2020, houve aumento de 65% no número de integrantes do Exército no governo [1]. Levantamento desta data mostra que pelo menos 2.897 cargos da Administração federal são ocupados por integrantes das Forças Armadas da ativa e 8 dos 22 ministérios têm a chefia fardada [2]. Outro levantamento, de outubro de 2019, já havia apontado que ao menos 2.500 membros das Forças Armadas ocupavam cargos de chefia ou assessoramento em ministérios e repartições [3].
A Escola Superior de Guerra (ESG), órgão que integra o Ministério da Defesa (MD), envia ofícios ao MD [1] e à Advocacia-Geral da União (AGU) [2] questionando a possibilidade de punição dos servidores que critiquem o presidente Jair Bolsonaro, o que é apurado nesta data pela imprensa. No documento consta preocupação com a emissão de opiniões políticas de servidores contra Bolsonaro, ainda que em contexto de ‘licenças particulares, férias, folga’ e que comentários contra o presidente poderiam ‘contrariar as linhas de pesquisa e o escopo de atividades da instituição de ensino’ [3]. A consulta seria baseada no Código de Ética do Servidor Público e nos crimes contra a honra previstos no Código Penal [4]. Em nota, a ESG afirma que o ofício teria caráter consultivo, sem pretensão punitiva [5]. Em outras oportunidades, o Ministério da Saúde exonerou servidores que assinaram notas técnicas sobre saúde sexual das mulheres, em suposto desalinhamento com o governo federal [veja aqui], e empresa pública de comunicação ajuízou ação contra funcionários por manifestações críticas em rede social [veja aqui]. Já o Ministério da Justiça promoveu ação sigilosa para monitorar 579 servidores ‘antifascistas’ e repassou informações a outros órgãos do governo [veja aqui], enquanto a Controladoria-Geral da União baixou nota técnica permitindo punição a servidor que se manifestar nas redes sociais [veja aqui].
Leia análise sobre a relação entre Bolsonaro, outros poderes e o papel do Exército.
Portaria do Ministério da Defesa [1] define diretrizes de atuação das Forças Armadas no apoio ao governo para conter o avanço do coronavírus. A medida prevê que a Aeronáutica, por exemplo, planeje eventual apoio às ações de controle de passageiros e tripulantes nos aeroportos. Para a Marinha são previstas as funções de controle nos portos. Ainda é previsto planejamento para ação conjunta visando apoio no controle de acesso às fronteiras e triagem de pessoas com suspeita de contaminação para encaminhamento a hospitais [2]. Posteriormente, foi anunciada a ativação de dez Centros de Operações Conjuntas, nas cinco regiões do país, com representantes das três Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) em cada um dos centros [3].
Leia a análise sobre atuação das forças armadas pelo mundo durante a pandemia.
Após a edição da primeira de série de Portarias logo depois revogadas [veja aqui], Eugênio Pacelli, general da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados, órgão do Exército responsável pela norma, é exonerado pelo presidente [1]. A Portaria em questão [2] criava sistema de rastreamento sobre produtos controlados pelo exército (PCE). Segundo os procuradores que investigam o caso da revogação das portarias [3] [veja aqui], Pacelli pode ter sido exonerado por pressão de lobistas de empresas de armas e munições. Em carta de despedida, ele desculpa-se por não poder atender sempre a ‘interesses pontuais’ de industriais no ramo de PCE, dado que seu compromisso maior seria com a ‘tranquilidade da segurança social e capacidade de mobilização da indústria nacional’ [4]. Vale notar que o evento acontece em meio a discussões sobre ingerência do presidente também na Polícia Federal [veja aqui] e outras medidas de implantação da agenda armamentista [veja aqui].
Leia as análises sobre implicações a favor de milícias das revogações, a suspeita de interferência indevida, a comparação entre controle de armas antes e após o primeiro ano do governo Bolsonaro e e as investidas armamentistas do presidente na pandemia.
Em entrevista, general da reserva Eduardo Villas Bôas, que tem boa influência nas Forças Armadas, confirma apoio a Bolsonaro diante da pandemia. A entrevista ocorre após a mídia ter noticiado que Bolsonaro procura apoio na ala militar [1] diante de isolamento político [veja aqui] e que o general Villas Bôas [2] e outros militares [3] do governo têm apoiado o presidente contra medidas mais drásticas de isolamento social. Segundo o general, o coronavírus não pode ser visto como uma ‘gripezinha’ [veja aqui], mas o presidente teria declarado isso apenas para tranquilizar o país. Também afirma que um problema é que ‘está todo mundo’ contra Bolsonaro, principalmente a mídia, mas o apoio militar continua intacto e o presidente deve ‘sair por cima’ no final [4]. Em relação a eventuais violações à Constituição, defende que não houve desrespeito por parte do presidente, que seria ‘um democrata’. Por fim, nega uma ‘tutela’ dele por parte de Ministros como o general Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo). No mesmo dia 02/04, o Centro de Estudos Estratégicos do Exército (CEEEx) publica documento com análise sobre o combate à crise do novo coronavírus favorável ao isolamento horizontal [5]. Também defende no documento um papel ativo do Estado na economia e cuidado no manejo da cloroquina. Quatro dias após a publicação do CEEEx, o documento foi apagado [6].
Leia a entrevista original do general Villas Bôas e a análise sobre o papel do exército na pandemia.