Documentos divulgados nesta data pela imprensa demonstram que o Conselho Nacional da Amazônia Legal (CNAL), coordenado pelo vice-presidente Hamilton Mourão, tem como uma de suas metas ‘obter o controle de 100% das ONGs, que atuam na Região Amazônica, até 2022, a fim de autorizar somente aquelas que atendam os interesses nacionais’ [1]. A proposta faz parte do eixo de ‘proteção’ do plano de ações do CNAL, que foi apresentado a ministros e integrantes do conselho em reunião realizada no dia 03/11 e tem como outros grandes eixos a ‘preservação’ e o ‘desenvolvimento sustentável’ da região [2]. Mourão fala que não assinou os documentos divulgados e que ‘essa questão de marco regulatório das ONGs não passa por nenhum estudo mais sério nesse momento’ [3]. Especialistas dizem que barrar a atividade de ONGs em nome de supostos interesses nacionais, que não são explicitados no documento, é inconstitucional [4]. Em carta aberta, diversas organizações da sociedade civil manifestam seu repúdio contra a proposta e apontam para a perseguição que estão sofrendo por parte do governo [5]. Recentemente, o presidente Jair Bolsonaro disse que as ONGs que atuam na Amazônia são ‘câncer’ [veja aqui] e durante cúpula da ONU acusou tais organizações de cometerem crimes ambientais [veja aqui]. Em seu primeiro dia de governo, o presidente editou uma Medida Provisória que previa controle da atuação de ONGs pela Secretaria de Governo, o que foi muito criticado e revertido no Congresso posteriormente [veja aqui]. Outro ponto do plano do CNAL é a criação de mecanismos de expropriação de propriedades onde foram cometidos crimes ambientais, como queimadas e desmatamento ilegais [6]. Bolsonaro manifestou-se em rede social sobre tal proposta dizendo que ‘a propriedade priva é sagrada e é um dos tripés da democracia’ e declarou dar ‘cartão vermelho’ para quem sugeriu a ideia [7]. O plano de metas do CNAL enviado em setembro ao Ministério da Economia previa presença das forças armadas na floresta até o fim de 2022 [veja aqui] e estipulava uma ‘mudança doutrinária’ em órgãos como o Ibama, ICMBio, Incra e Funai [veja aqui].
Leia reportagem sobre a atuação e o perfil das ONGs ambientais na Amazônia e análise sobre a relação do governo com essas organizações.
Sete partidos da oposição e dez ONGs ajuizam ação [1] no Supremo Tribunal Federal (STF) para exigir a retomada do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAM) [2]. O PPCDAM é uma política ambiental criada em 2004 que visa à redução progressiva do desmatamento na Amazônia [3], e já chegou a garantir uma redução de 83% do desmatamento na região entre 2004 e 2012 [4]. A ação apresenta dados sobre a atuação da atual gestão do governo Bolsonaro e conclui que o PPCDAM foi ‘abandonado’ pelo Executivo federal desde 2019 [5]. Entre os atos do governo que inviabilizaram a execução do programa, pode-se citar a redução da fiscalização ambiental [veja aqui], com a diminuição de autuações por crimes ambientais [veja aqui] e de multas aplicadas [veja aqui], a paralisação do Fundo Amazônia [veja aqui], o corte de verbas para Política Nacional sobre Mudança Climática [veja aqui], a redução da previsão orçamentária para a pasta do Meio Ambiente em 2021 [veja aqui] e o enfraquecimento de órgãos como o Ibama [veja aqui] [veja aqui] [veja aqui], ICMBio [veja aqui] e Funai [veja aqui] [6]. A ação também dá ênfase para as evidências científicas sobre o crescimento das ações de desmatamento na Amazônia, que atingiu a taxa de aumento de 34% neste ano [7] [8]. Os pedidos da ação incluem: o cumprimento de metas ambientais previstas na legislação nacional e em acordos internacionais, a suspensão do desmatamento na Amazônia pelo período de um ano e o desenvolvimento de outros mecanismos institucionais para lidar com o problema em questão [9]. Segundo o advogado da ação, Maurício Guetta, ‘o Brasil e o mundo não podem mais esperar’ e é papel do STF ‘determinar a aplicação da política pública em vigor’ [10]. Vale notar que autoridades do governo federal, como o presidente [veja aqui], o vice-presidente [veja aqui] [veja aqui], e o ministro do Meio Ambiente [veja aqui] costumam refutar dados científicos sobre o desmatamento da região amazônica.
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O presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Fernando Cesar Lorencini, nomeia policial militar sem as qualificações técnicas necessárias para o comando do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses [1]. A nomeação ocorre no momento em que indicações como essa são questionadas no Tribunal de Contas da União [2]. Para o cargo em comissão, é escolhido José de Ribamar Vieira de Ribamar Vieira Rodrigues [3]. Segundo as exigências infralegais para ocupação de cargos desse tipo, o nomeado deve possuir, ao menos, experiência profissional de três anos em atividades correlatas às áreas de atuação do órgão ao qual será indicado, ter ocupado cargo em comissão ou função de confiança por dois anos ou possuir título de especialista, mestre ou doutor também nessa área [4]. José de Ribamar Rodrigues possui carreira na Polícia Militar do Maranhão, onde instituição na qual ingressou em 1986. Em seu currículo não há qualquer menção a experiência ambiental ou cursos na área, sendo que seu último emprego foi como assessor de segurança na Câmara Municipal de Barreirinhas [5]. Diante dessa da nomeação, o Ministério Público Federal inicia apuração sobre a ilegalidade da mesma e oficia a presidência do ICMBio, para solicitar manifestação sobre questionando o preenchimento dos requisitos legais para o cargo exercício da função pela pessoa designada [6]. Vale notar que essa nomeação seguiu o padrão de indicações efetuadas por Ricardo Salles no ministério do pelo ministro do Meio Ambiente como, por exemplo, as nomeações de superintendentes para, por exemplo, as superintendências do Ibama no Pará [veja aqui], Maranhão e Amapá [veja aqui].
Presidente Jair Bolsonaro, em discurso na cúpula do G20, elogia política ambiental brasileira ao afirmar que o país tem ‘elevado nível de preservação’ e diz que irá ‘continuar protegendo’ a Amazônia e o Pantanal [1]. Bolsonaro ainda alega que o Brasil tem sido alvo de ‘ataques injustificados’ por nações ‘menos competitivas e menos sustentáveis’ [2]. Em outubro, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou índices de desmatamento e queimada na Amazônia que apontaram aumento de 50,6% em 2020 em relação ao mesmo período no ano anterior [3] [veja aqui]; além disso, a dois meses do fim desse ano, os números registrados superam os dados de todo o ano passado: em 2019 foram registrados 89.176 focos de calor na Amazônia, sendo que de janeiro a outubro de 2020 já foram observados ao menos 89.734 queimadas na região [4]. Pesquisadores e especialistas ambientais criticam o discurso do presidente por não mencionar as altas nas queimadas e desmatamento florestal [5]. Em outra oportunidade recente, Bolsonaro disse que o Brasil ‘está de parabéns’ pela preservação do meio ambiente, a despeito do recorde de queimadas no Pantanal e alta no desmatamento amazônico [veja aqui]. Em discurso nas Nações Unidas, o presidente também distorceu informações sobre a política ambiental do país, afirmando falsamente que o Brasil é ‘líder em conservação de florestas tropicais’ [veja aqui]. O general Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional, também minimizou recentemente o problema das queimadas na Amazônia [veja aqui]. O país vem sofrendo pressão internacional para alterar sua política de preservação ambiental, após receber carta de oito países europeus colocando em xeque acordos comerciais em setembro [6]. No mesmo discurso na cúpula do G20, o presidente também minimiza o debate sobre racismo [veja aqui], após protestos ao redor do país pelo assassinato de homem negro por seguranças de um supermercado [7] [veja aqui].
Assista na íntegra o pronunciamento de Bolsonaro na cúpula do G20 e veja, com detalhe, os índices de desmatamento e queimadas na Amazônia apontados pelo Inpe.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, mobiliza servidores da Advocacia Geral da União (AGU) para ingressar com ação contra André Borges, jornalista dedicado à cobertura sobre meio ambiente do Estado de S. Paulo, como aponta investigação jornalística desta data [1]. O ministro recua e pede o arquivamento da notificação antes que ela chegasse ao jornalista [2]. Essa desistência ocorreu uma semana depois de vir a público a ação contra o ambientalista Márcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima [veja aqui] [3]. Além de Astrini e Borges, Salles mobilizou a AGU contra o cientista Antonio Donato Nobre, pesquisador do Centro de Ciência do Sistema Terrestre do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) [veja aqui] e Cedê Silva, do site O Antagonista [veja aqui].
Eduardo Bim, presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama) flexibiliza processo de exportação do ipê, contrariando parecer técnico do próprio órgão [1]. Até então, o ipê, considerado a madeira brasileira mais cobiçada do mundo, estava na lista de espécies ameaçadas da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e da Flora [2]. A Convenção é um acordo assinado pelo Brasil em 1973 que reúne 183 países com o objetivo de monitorar o comércio de animais e plantas silvestres [3]. As espécies da lista, como o Mogno e o Pau-Brasil, só podem ser exportadas com uma autorização emitida pelo Ibama [4]. Com a medida, o ipê passa a ser vendido como qualquer espécie, sem nenhum controle específico [5]. A alteração ocorre logo após o Ibama flexibilizar multas para quem compra madeira ilegal [veja aqui]. Este episódio foi posteriormente utilizado como ponto de partida da operação Akuanduba da Polícia Federal, que acarretou na suspensão de Bim da presidência do Ibama por 90 dias por suspeita do cometimento dos crimes de facilitação ao contrabando e advocacia administrativa [veja aqui].
Conheça as árvores com valor comercial ameaçadas de extinção.
O superintendente do Ibama na Bahia, Rodrigo Santos Alves, cancela ato de técnicos do órgão e permite a construção de prédio de luxo em Salvador, como revela reportagem desta data [1]. Em 2015, fiscais do Ibama constataram irregularidade no projeto de regeneração da área degradada na construção do empreendimento imobiliário aplicando contra a construtora multa de R$ 30,5 mil e embargo, que paralisou a obra [2]. Ainda está em análise uma nova multa no valor de R$ 5,1 milhões [3]. Diante do dano ambiental, o Ministério Público Federal da Bahia também moveu ação civil pública em 2018 contra a construtora Porto Victória Empreendimentos, responsável pela construção desses prédios, por vislumbrar danos decorrentes da supressão de vegetação indicada como Mata Atlântica [4]. Em maio de 2019, parecer técnico analisa os argumentos da construtora e afirma que ‘o empreendedor já estava ciente da inviabilidade ambiental do empreendimento’, por se tratar de área de preservação permanente (APP) [5]. Mesmo com esses pareceres, Alves cancela a multa de 30,5 mil reais e o embargo, liberando a continuidade das obras. Em sua manifestação, o superintendente afirma que os atos proferidos pelo do Ibama são nulos e que o órgão extrapolou suas funções [6]. Alves foi nomeado ano passado para o cargo, não contendo currículo compatível com as atribuições desenvolvidas [veja aqui]. Além disso, é sócio de empresa imobiliária que trabalha com a oferta de imóveis de luxo, o que demonstra conflito de interesse com o caso analisado [7]. O Superintendente já atuou de forma semelhante ao cancelar atos do Ibama e liberar obra irregular na Praia do Forte, também na Bahia [veja aqui]. Essa atuação é coerente com a política de enfraquecimento de órgãos de controle do meio ambiente, durante o governo Bolsonaro: o número de operações de fiscalização caiu drasticamente [veja aqui] [veja aqui] e, em 2020, o Ministério do Meio Ambiente centralizou o julgamento de processos do Ibama [veja aqui] e o ministro Ricardo Salles sugeriu o afrouxamento para normas ambientais [veja aqui].
Entenda como funciona um licenciamento ambiental e a história da regulação ambiental no país.
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) é excluído de processo responsável por autorizar a criação de peixes em reservatórios de hidrelétricas do país [1]. Por meio de decreto presidencial [2], o governo repassa à Secretaria da Pesca a competência de emitir autorizações para que produtores criem espécies exóticas e nativas nas áreas de barragens de hidrelétricas. A fiscalização da pesca e do controle reprodutivo era tema tratado pelo Ibama nos processos de licenciamento de hidrelétricas [3]. Na maioria das barragens, em que o Ibama não irá mais atuar, é prevista a criação de tilápia, peixe que não é nativo do Brasil. Ambientalistas alertam que há riscos dessa espécie escapar dos criadouros e dominar áreas de peixes nativos, gerando desequilíbrio ambiental [4]. O secretário da pesca, Jorge Seif Júnior, defende o decreto e afirma que ‘o povo brasileiro quer comer mais pescado, mas não produzimos o suficiente’ [5]. A política de desregulamentação de normas ambientais é constante no governo Bolsonaro. No que se refere a atuação do instituto: em 2019 o presidente do Ibama autorizou práticas de desmatamento para a construção de obra hidrelétrica [veja aqui]; em 2020, menos de 40% do orçamento do instituto para combate ao desmatamento e queimadas foi executado [veja aqui]; superintendentes regionais do Ibama foram nomeados sem as qualificações requeridas pelo cargo [veja aqui] [veja aqui] e atos normativos do órgão foram cancelados para permitir a liberação de obras irregulares [veja aqui] [veja aqui]
O ministro Kássio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), concede liminar que autoriza a pesca de rede de arrasto no litoral do Rio Grande do Sul (RS), o que é proibido por lei desde 2018 [1]. A decisão é proferida em ação [2] proposta pelo Partido Liberal (PL) que questiona lei estadual [3]. Inicialmente, o pedido havia sido negado pelo então ministro Celso de Mello em 2019, que manteve a proibição da pesca de arrasto por considerar que estados podem legislar juntamente com a União sobre matéria ambiental [4]. Já segundo Marques, cabe somente à União legislar sobre mar territorial e navegação marítima e, portanto, dispositivos da lei estadual que proíbem a pesca de arrasto seriam inconstitucionais [5][6]. A decisão beneficia grandes embarcações que fazem pesca industrial no litoral do RS [7]. Nessa modalidade de pesca, uma rede é lançada a partir de um barco sobre o fundo do mar e arrastada ao longo de horas, capturando tudo o que está à frente, o que pode destruir recifes de corais e outas formações oceânicas [8]. Em razão disso, há comprometimento da atividade pesqueira [9]. A decisão é comemorada por Bolsonaro, que afirma ter conseguido ‘uma liminar com o ministro Kássio Marques’ contra uma lei que prejudicava milhares de pescadores [10]. Dias após a decisão, o governo do RS recorre, por entender que a medida pode gerar dano irreparável ao meio ambiente [11]. Um mês depois, o Ministério da Agricultura emite portaria que suspende a pesca de arrasto até a elaboração de um plano para a retomada sustentável da prática [12]. A decisão do ministro vai ao encontro da política ambiental do governo Bolsonaro e de flexibilização da pesca predatória: como exemplos, podem ser destacadas a liberação da pesca de Sardinhas em Fernando de Noronha, apesar de parecer contrário do ICMBio [veja aqui] e da pesca esportiva em unidades de conservação, terras indígenas e quilombos [veja aqui]. Dias depois da decisão, o presidente também publica texto em que acusa a China de praticar pesca ilegal no Rio Grande do Sul [veja aqui].
Leia o relatório sobre os impactos da pesca de arrasto no Brasil e no mundo
Governo anuncia pavimentação da BR-319 sem garantias da adoção de mecanismos que assegurem a preservação da floresta no entorno [1] [2]. A rodovia, que liga as cidades de Manaus e Porto Velho, foi inaugurada em 1976 e desde então possui trechos não pavimentados [3]. Segundo o Ministério da Infraestrutura, a pavimentação facilitaria a logística do transporte da produção agrícola da Região Norte [4]. Para ambientalistas, a obra pode aumentar o desmatamento na Amazônia, impedindo que o Brasil alcance as metas de redução de emissões de carbono com as quais se comprometeu no Acordo de Paris [5]. Em nota técnica, pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) destacam que 40 unidades de conservação, 6 milhões de hectares de terras públicas e 50 terras indígenas estariam ameaçadas pelo empreendimento [6]. Além disso, relatório elaborado pela Rede Brasileira de Especialistas em Ecologia de Transportes (REET) aponta uma série de inconsistências no projeto, que tenderiam a causar ainda mais danos ao meio ambiente [7]. As obras da BR-319 também desconsiderm a convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e de decreto federal [8], que exigem uma consulta prévia aos povos indígenas impactados por obras desta natureza, dando a eles o poder de veto [9]. Em agosto, o Ministério Público Federal já havia denunciado o descaso do governo com a consulta prévia, por meio de uma carta enviada pelo cacique Valdomiro Farias da Silva Apurinã, do povo Apurinã, cujas terras ficam próximas à rodovia [10]. Meses antes do anúncio da obra, o presidente Bolsonaro também afirmou que o Brasil ‘está de parabéns’ pela preservação ambiental [veja aqui]. Igualmente, o governo estabeleceu a ‘Estratégia Federal de Desenvolvimento (EFD) para o Brasil de 2020 a 2031’, ignorando metas de combate ao desmatamento e combate a focos de incêndio na Amazônia e no Pantanal [veja aqui].
Leia sobre os impactos socioambientais da BR-319.