Decreto [1] assinado pelo presidente Jair Bolsonaro exclui a participação da sociedade civil da Comissão Executiva para Controle do Desmatamento Ilegal e Recuperação da Vegetação Nativa (Conaveg). Instituído em 2017 [2], o colegiado era composto por representantes ministeriais, estaduais e municipais, além de dois membros da sociedade civil organizada, e tinha como principal atribuição a articulação de ações e políticas para promover a recuperação da vegetação nativa dos biomas. Com o decreto presidencial, a composição da Conaveg passa a ser somente interministerial, e a comissão se torna responsável por propor e articular diretrizes para prevenir e controlar o desmatamento ilegal [3]. Meses depois, em agosto de 2020, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) publica o regimento interno [4] do colegiado, que formaliza a exclusão da sociedade civil [5]. O texto prevê que membros de organizações sociais podem ser convidados para participar de reuniões específicas, mas não têm direito ao voto [6]. Em março de 2019, veículo de imprensa mostrou que o então ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, solicitou ao MMA a extinção de órgãos colegiados, entre eles a Conaveg [7]. A Sociedade Brasileira de Restauração Ecológica criticou a possibilidade, argumentando que instâncias como essa asseguram o direito constitucional a um ambiente ecologicamente equilibrado, e que a participação da sociedade civil organizada garante agilidade e transparência às decisões que envolvem questões ambientais [8]. A exclusão de representantes da sociedade civil de conselhos participativos ligados à gestão ambiental tem sido uma constante no atual governo [veja aqui]: em fevereiro, decretos presidenciais excluíram a participação social do conselho responsável por repasses de recursos para a área ambiental [veja aqui] e a diminuíram na Comissão Nacional de Biodiversidade [veja aqui].
Leia análise que discute a importância dos conselhos participativos para a democracia.
A deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) responsabiliza ONGs por queimadas na Floresta Amazônica e, sem apresentar dados, afirma que a Amazônia ‘nunca queimou tão pouco’ nos últimos 20 anos [1]. O pronunciamento da deputada acontece durante Fórum de Governança da Internet em Berlim, evento promovido pela Organização das Nações Unidas ONU [2]. Na ocasião, Zambelli acusa ONGs que ‘supostamente deveriam estar protegendo’ o meio ambiente de estarem ‘colocando fogo na Amazônia’ para criminalizar o atual governo’, porém, sem apresentar quaisquer provas dos crimes [3].Membros do governo como o vice presidente Hamilton Mourão, o Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles e o próprio presidente Jair Bolsonaro negam que a floresta britsta Amazônica está sendo devastada por queimadas [veja aqui] [veja aqui]. O presidente também acusou ONGs por incêndios criminosos sem citar provas em diversas ocasiões [veja aqui].De acordo com levantamento do Inpe, registraram-se 89 mil focos de calor em 2019 na Amazônia, cerca de 30% a mais do que no ano anterior [4], o que contribui para uma das piores crises ambientais da história do país [5]. Especialistas apontam que queimadas na Amazônia provocaram cerca de duas mil internações no SUS, por problemas respiratórios, em 2019 [6].
Três dias depois da declaração de Zambelli, a Polícia Civil do Pará prende brigadistas membros de ONGs de atuação na região sob acusação de terem iniciado incêndios [veja aqui]. O governo federal vem sendo criticado por especialistas pela política ambiental negacionista; no ano seguinte, o Brasil teve o maior número de focos de incêndio dos últimos 10 anos [veja aqui].
Leia a estimativa da taxa de desmatamento de 2019 divulgada pelo Inpe.
O Ministério do Meio Ambiente implementa no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) novo sistema de registro eletrônico de frequência (SISREF), administrado e disponibilizado pelo Ministério da Economia [1]. O SISREF vem sendo implementado em outros órgãos do governo [2]. De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), a implantação do SISREF prejudica as ações do Ibama, pois força os servidores a adequarem-se a um regime de frequência incompatível com suas funções [3]. O atendimento às ocorrências de ilícitos ambientais não necessariamente ocorre durante o horário regular de trabalho [4]. Com o novo regime, as horas que excedem o limite estipulado não são compensadas em pecúnia ou folga, reduzindo drasticamente o tempo de trabalho em campo [5]. A autarquia já possui um sistema de controle eletrônico de frequência que considerava as peculiaridades logísticas dos trabalhos de fiscalização em campo, o SISPONTO [6]. Até então, era possível o lançamento das horas extras trabalhadas pelos servidores e posterior compensação em folgas [7]. A situação converge com uma sequência de ataques que Bolsonaro vem fazendo contra o órgão, alegando a existência de uma ‘indústria de multas’ [veja aqui]: nos primeiros meses de governo, houve uma queda de 70% nas operações de fiscalização efetuadas pelo Ibama na Amazônia e uma queda de 58% em todo o país, em comparação com o mesmo período do ano passado [veja aqui]. O Ministro Ricardo Salles também foi alvo de críticas ao apoiar ataques à servidores do Ibama em ações de fiscalização de extração de madeira ilegal em terras indígenas em Rondônia [veja aqui].
Leia análises sobre o Ibama e os conflitos em torno do órgão.
O Fundo Amazônia [1] termina 2019 com 2,2 bilhões de reais paralisados, enquanto o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pede recursos internacionais para financiamento da preservação do meio ambiente [2] e pensa em criar novo fundo [3]. As atividades foram paralisadas após o governo destituir o comitê que fazia a seleção dos projetos para o fundo [4], decisão que leva os dois maiores países financiadores do fundo, Alemanha e Noruega, a bloquearem o repasse de doações [5]. O fundo não aprova projetos em 2019 [6], enquanto 4 propostas já haviam sido outorgadas em 2018 até o mês de agosto [7]. A paralisação das atividades prejudica apresentação de projeto por associações representativas dos indígenas[8]. Por causa da paralisação das atividades, povos indígenas passam a conviver com grande aumento no número de garimpeiros, invasores e madeireiros ilegais [9]. Devido ao aumento histórico do desmatamento na Amazônia [veja aqui], no ano seguinte, partidos políticos ajuízam ação direta de inconstitucionalidade por omissão devido a paralisação do Fundo Amazônia [10]. Em seguida, o Supremo Tribunal Federal questiona a omissão do governo Bolsonaro referente a proteção ambiental [11]. Além do mais, 50 organizações da sociedade civil, escrevem carta para o Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDS) requeredo a que os recursos do Fundo Amazônia sejam liberados visando a mitigação das consequências causadas pela covid-19 e o desmatamento [12]. Vale lembrar que outras medidas do governo que favoreceram o desmatamento [veja aqui] e mitigaram a proteção dos indígenas .
Leia mais sobre os principais acontecimentos envolvendo o Fundo Amazônia em 2019, como foram afetadas as comunidades rurais que eram maiores beneficiadas dos recursos do Fundo e como afetou também as comunidades tradicionais.
Quatro servidores da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) comparecem à 25°Conferência das Partes da Convenção Quadro da ONU para Mudança do Clima (COP-25) em Madri, na Espanha. Esse é o primeiro registro da presença da Abin em tal conferência e, segundo dados obtidos da conferência entre 2013 a 2018, nenhuma delegação enviou qualquer agente de inteligência antes [1]. De acordo com um dos agentes brasileiros presentes na COP-25, o objetivo era ‘captar as críticas ao governo Bolsonaro’ para ‘defender os interesses do País’ [2]. Tal revelação, porém, só é feita em outubro de 2020, após investigação da imprensa [3]. O site da Abin, por outro lado, confirma sua presença na COP-25 ainda em dezembro de 2019, indicando ter participado de painéis em que diferentes governos e atores não estatais apresentaram ações de mudança [4]. Além disso, o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), General Augusto Heleno, se posiciona nas redes sociais, dizendo haver servidores capazes de realizar a ação, a quem compete acompanhar eventos de interesse do país, como demais agências de inteligência do mundo [5] [6]. Especialistas no setor ambiental comentam a desnecessidade do acompanhamento da Abin, já que os debates eram públicos [7]; senadores e deputados mobilizam-se para ouvir explicações do GSI e do Ministério das Relações exteriores sobre o ocorrido [8]. A Anistia Internacional divulgou nota no dia 17 de outubro criticando o governo brasileiro e identificando a ação como “grave”, “especialmente por conta de o Brasil possuir um passado recente de perseguições políticas durante o período do regime militar, que durou 21 anos” [9]. Além disso, uma carta foi enviada à ONU com 172 assinaturas onde afirmam “uma quebra séria de confiança e um precedente terrível para outras partes agirem contra a sociedade civil” [10]. Carlos Alberto Vilhena, subprocurador-geral da República, disse que a operação da Abin na COP-25 é “grave e merece investigação” [11]. Ressalte-se que, em janeiro de 2019, a primeira Medida Provisória de Jair Bolsonaro atribuiu à Secretaria de Governo a função de supervisão e monitoramento das atividades de organismos internacionais e de organizações não governamentais, mudança posteriormente vetada pelo Congresso [veja aqui]. Em fevereiro de 2019, Heleno baixou portaria que ampliou a autorização de servidores da Abin para classificar documentos como sigilosos e ultrassecretos [veja aqui] e agente da Abin foi descoberto trabalhando disfarçado de vigilante na Universidade de Brasília [veja aqui]. No ano seguinte, o governo federal nomeia funcionário da Abin sem identificação para coordenar o órgão da Secretaria de Governo responsável por interlocução com organizações da sociedade civil [veja aqui].
Leia a reportagem sobre a presença da Abin na Convenção do Clima e entenda o monitoramento da agência no evento climático da ONU.
O presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, ignora dois pareceres técnicos do órgão e autoriza o desmatamento em área da Mata Atlântica no Paraná para um canteiro de obras que servirá de apoio para a construção de uma usina hidrelétrica [1]. As obras e o desmatamento já haviam sido iniciados antes da autorização [2]. A empresa responsável pela construção realizou dois pedidos desde 2018, mas os pareceres recomendaram que o Ibama não autorizasse o desmatamento da área sob a justificativa de apresentar um ‘elevado potencial ambiental, cultural e paisagístico’ [3] e possuir espécies ameaçadas de extinção e rica em fauna que só existe nesse local [4]. Em nota, o Ministério do Meio Ambiente afirma não ter havido impedimentos para a ‘supressão vegetal necessária’ à instalação da obra, mas funcionários alegam que as duas normativas foram alteradas para beneficiar a empresa [5]. O ministro do Meio Ambiente já havida exonerado 21 dos 27 superintendentes regionais do Ibama [veja aqui], prática nunca vista nessa amplitude [6], além de exonerar servidor público do Ibama que multou Bolsonaro por pesca irregular [veja aqui] e trocar diretor de Proteção Ambiental do Ibama após operação contra garimpos [veja aqui]. Multas por crimes contra desmatamento também caíram 23% no início do governo [veja aqui]. Em 2020, através de decreto ainda não publicado, o Ministério do Meio Ambiente facilita a liberação de licenças ambientais para construção de grandes obras na área de proteção da Mata Atlântica e o governo ajuíza ação a favor da regularização de desmatadores no bioma [veja aqui].
Leia a análise sobre a atuação do Ibama e suas mudanças sob o começo do governo Bolsonaro.
A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) através de Resolução Normativa [1], determina algumas alterações sobre a liberação comercial de Organismos Geneticamente Modificados (OGM) e seus derivados [2], que foram impulsionados no mercado desde o início do governo Bolsonaro [3] e se somam a outras alterações normativas que propiciam o aumento de OGM . Uma das alterações é a lista de informações que empresas devem fornecer à comissão para análise, caso interessadas em colocar no mercado produtos com OGM. A mudança reduz o detalhamento das informações sobre esses organismos quando consumidos por humanos ou animais [4]. As consultas públicas, que eram obrigatórias para todos os pedidos de liberação de OGM, não existem mais, e as propostas seguem direto para a análise do conselho da comissão [5]. Existe a possibilidade da realização de audiência pública, que difere das consultas públicas anteriores, caso haja um pedido de um integrantes da CTNBio ou de parte comprovadamente interessada na matéria [6]. De acordo com o professor e pesquisador Marcos Pedlowski ‘dificilmente empresas que querem aprovar o uso comercial deste ou daquele OGM vão estimar corretamente os níveis de risco, perigo e dano ao ambiente e à saúde humana que os mesmos trazem com sua liberação para uso comercial’ [7].
Leia mais sobre a crítica do Idec à nova Resolução.
No Fórum Econômico Mundial em Davos, ao ser questionado sobre como os governos deveriam agir diante do temor aos danos ambientais, o Ministro da Economia, Paulo Guedes, afirma que ‘o maior inimigo do ambiente é a pobreza’, que ‘as pessoas destroem o ambiente para comer’ [1] e que a produção de alimentos ainda depende dos agrotóxicos [2]. Durante o painel sobre florestas tropicais, o cientista brasileiro Carlos Nobre discursava, quando foi interrompido por secretario do Ministério da Economia, ação pouco usual, que subiu ao palco e defendeu as ações ambientais do governo Bolsonaro [3]. Posteriormente, Nobre afirma que as falas de Guedes contrariam a ciência e estão desalinhas com o ‘discurso do mundo econômico em Davos’ [4]. Por outro lado, Guedes se aproxima das falas do presidente Jair Bolsonaro, que defende que o desmatamento é cultural [veja aqui] e que existe uma ‘psicose ambientalista’ contra o Brasil [veja aqui], mas afirma que passar fome no país ‘é uma grande mentira’ [veja aqui]. Em outra oportunidade, Guedes afirma que o aumento do dólar é ‘bom pra todo mundo’, pois com o dólar mais baixo ‘até empregada doméstica estava indo para a Disney’ [veja aqui]. Além disso, o governo Bolsonaro é marcado pelo desmonte das políticas ambientais, através da desestruturação de órgãos de fiscalização [veja aqui], exoneração de funcionários [veja aqui] [veja aqui], corte orçamentário e redução de autuações por crime contra o desmatamento [veja aqui]. Inclusive, em 2020, o ministro do Meio Ambiente, defende aproveitar-se da crise sanitária para flexibilizar normas de preservação ambiental [veja aqui].
Leia as análises sobre as falas de Paulo Guedes em Davos e como a pauta ambiental entrou no cenário do Fórum Econômico Mundial.
O Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio) altera regras sobre pesca esportiva através de Portaria [1]. O texto permite a atividade em Unidades de Conservação (UC), além de autorizar que visitantes consumam o pescado no próprio local [2]. A normativa abre possibilidades para exploração comercial da pesca esportiva em unidades classificadas de proteção integral, como áreas indígenas e de quilombos, exigindo que a atividade seja objeto de autorização específica do instituto [3]. Ficam permitidas também atividades em reservas extrativistas, florestas nacionais e reservas de desenvolvimento sustentável, onde organizações representantes das comunidades locais ou beneficiários da UC deverão preferencialmente realizar o serviço de apoio de pesca [4]. De acordo com o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), que pede anulação da nova portaria [5], a liberação da pesca esportiva prejudica ecossistemas como Pantanal e Amazônia [6]. O presidente, que já foi multado por pesca ilegal [7] antes de assumir o cargo e depois exonerou o fiscalizador [veja aqui], defende mudanças nas áreas de conservação [8]. Com a nova portaria, o governo permite novamente a exploração de atividade econômica nas UC, fragilizando a proteção ao meio ambiente e às populações tradicionais residentes das áreas de proteção [veja aqui].
Leia a análise sobre a autorização da pesca em unidades de conservação ambiental.
A sociedade civil perde espaço no Conselho Deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente através de decreto [1] do presidente Jair Bolsonaro. O conselho fica com 6 cadeiras, todas pertencentes à representantes federais [2]. O fundo é responsável por controlar o destino dos repasses de recursos gerenciados pela área ambiental do governo para projetos [3]. Com a nova normativa, ONGs ambientais e entidades do terceiro setor perdem o espaço que obtinham desde 2009 no conselho [4], que continua sob os comandos do Ministério do Meio Ambiente. Representantes da Casa Civil e do Ministério da Economia possuem assentos sem limite definido [5]. O afastamento do terceiro setor que vêm acontecendo no governo Bolsonaro desde 2019 , como aconteceu na suspensão de 90 dias das parcerias de ONGs como Ministério do Meio Ambiente [6]. A diretora da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, afirma ‘é um golpe duro contra o meio ambiente, nós estamos à mercê de um governo com políticas para diminuir a regulamentação ambiental e para diminuir muito as ações de desenvolvimento científico e tecnológico’ [7]. A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) pede anulação da normativa através de Projeto de Decreto Legislativo [8]. Em agosto, o Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, defini alguns encargos do Conselho. A função de determinar o que é prioridade e as diretrizes do Fundo, antes do Conselho, passa a ser do ministério do Meio Ambiente [9]. Outra alteração é que passa a ser objetivo único do Conselho julgar projetos que tenham como finalidade o uso de recursos naturais de forma sustentável e racional [10].
Leia a análise sobre as críticas da sociedade civil em relação a nova composição do Conselho do Fundo da Amazônia.