O Ministro da Justiça, Sérgio Moro, baixa portaria que autoriza a atuação da Força Nacional de Segurança Pública (FNS) no estado do Maranhão com o objetivo de proteger membros dos povos indígenas Guajajara após assassinato de dois de seus membros [1], no entanto, a medida se restringe às terras indígenas de Cana Brava, local dos assassinatos, excluindo da proteção a terra indígena Arariboia que também registra intervenções violentas de madeireiros [2]. Desde novembro, com o assassinato do Guajajara e guardião da floresta Paulo Paulino [3] por madeireiros invasores, a região do Arariboia registra aumento de ameaças e sentimento de insegurança pela população isolada [4]. A atuação estatal no Arariboia se restringiu à retirada de outros três guardiões da floresta pelo governo do Maranhão e ao envio da Polícia Federal para investigar o assassinato de Paulino [5]. A necessidade de mobilização da FNS para a região é confirmada pelo especialista Carlos Travassos, para quem ‘a invasão pode realmente ter se intensificado após a morte de Paulo’ [6]. A despeito dos pedidos por maior segurança, Moro justifica a restrição da medida para Cana Brava em razão da solicitação da Fundação do Índio (Funai), a qual apenas mencionava essa região [7]. A Funai confirma e diz que poderá solicitar posteriormente a FNS para outras áreas [8]. Vale notar que o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) registra 06 assassinatos de índios Guajajara em 2019 [9]; e que os ataques de invasores ocorrem em contexto de enfraquecimento das políticas de demarcação de terras indígenas [veja aqui] e de discursos do presidente que deslegitimam o assassinato de indígenas [veja aqui] [veja aqui].
Leia análise sobre quem são os guardiões da floresta sob ameaça de madeireiros e entenda os impactos da falta de proteção estatal sobre os Guajajaras.
Na entrada do Palácio Alvorada o presidente Jair Bolsonaro responde pergunta de jornalistas sobre a morte de indígenas guajajaras no Maranhão com ofensas a ativista ambiental sueca Greta Thunberg [1]. Em referência a denúncias de Greta sobre o assassinato de indígenas no Brasil, Bolsonaro afirma que ‘é impressionante a imprensa dar espaço para uma pirralha dessa daí’ [2]. Em reação, a ativista edita o próprio perfil nas redes sociais para incluir a descrição ‘pirralha’ [3]. Após questionamentos da imprensa sobre as declarações de Bolsonaro, o porta-voz do Palácio do Planalto, general Otávio Rêgo Barros, afirma que a expressão utilizada pelo presidente não seria pejorativa, indicando ‘uma pessoa de estatura pequena’ [4]. Em resposta ao assassinato dos indígenas guajajaras, o Ministério da Justiça autoriza o envio da Força Nacional ao Maranhão, mas exclui da portaria importante comunidade tradicional da região [5]. Vale lembrar que essa não é a primeira vez que o presidente despreza a morte de integrantes de comunidades indígenas [veja aqui], e nem que profere ofensas contra comunicadoras de direitos humanos [veja aqui].
Leia análise sobre ataques à ativista Greta Thunberg.
Ao comentar o aumento no preço da carne, o presidente Jair Bolsonaro defende a criação de gado em terras indígenas como medida para a redução dos preços e afirma que pretende incluir a permissão para agricultura e pecuária comerciais no Projeto de Lei que será encaminhado ao Congresso Nacional de liberação da mineração nas reservas indígenas [1]. O Presidente chama o projeto de ‘Lei Áurea para o Índio’, pois ‘o índio vai poder fazer tudo na sua terra, que nem o fazendeiro faz na dele’ [2]. A proposta enfrenta resistência de parlamentares [3]. Em 2019 o número de invasões em terras indígenas cresceu em relação aos anos anteriores, até setembro foram registradas 160 invasões, enquanto no ano todo de 2018 foram registradas 111 [4]. Na Câmara dos Deputados tramita PEC apoiada pela bancada ruralista que permite o arrendamento e exploração agropecuária de terras indígenas [5]. A fala do Presidente se insere nas demais medidas do governo de desmonte das políticas de proteção de terras indígena, como a defesa da exploração mineral nessas áreas [veja aqui], a desestruturação do Incra em favor dos ruralistas [veja aqui], a revogação do decreto que impedia a expansão do plantio de cana nas reservas [veja aqui], a paralisação do Fundo Amazônia [veja aqui] e a liberação da pesca esportiva em áreas protegidas [veja aqui]. O presidente foi alvo de representação no Tribunal Penal Internacional por implementar políticas predatórias contra indígenas [veja aqui] e edita Medida Provisória que estimula a grilagem de terras [veja aqui]. Em 2020, o Projeto de Lei citado por Bolsonaro é encaminhado ao Congresso Nacional [veja aqui].
Leia a análise sobre como as medidas do governo Bolsonaro relembram a antiga política indigenista.
Ao comentar sobre a criação do Conselho da Amazônia e as medidas para a proteção de terras indígenas, o presidente Jair Bolsonaro afirma que ‘com toda a certeza, o índio mudou. Está evoluindo. Cada vez mais, o índio é um ser humano igual a nós’ e defende que os povos indígenas se integrem à sociedade e sejam ‘donos’ das suas terras [1]. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) entra com uma representação contra Bolsonaro pelo crime de racismo e o advogado da instituição diz que a fala do presidente demonstra uma ideia colonial de desumanização e legitima ações contra os direitos dos povos indígenas [2]. No início do mês, o presidente tenta transferir a demarcação de terras indígenas e quilombolas para o Ministério da Agricultura (MAPA), medida que foi criticada por representante indígena Karajá na ONU por ser ‘integracionista, colonialista e racista’ e é rejeitada pelo Congresso [veja aqui]. Bolsonaro repete o discurso de ‘integração do índio a sociedade’ ao tentar novamente transferir a demarcação de terras para o MAPA, o que é vetado pelo Supremo Tribunal Federal [veja aqui], e ao criticar ocupações indígenas por obstarem a realização de obras [veja aqui]. O presidente discursa na ONU contra a extensão da demarcação das terras indígenas, oportunidade em que afirma que ‘é preciso entender que nossos nativos são seres humanos’ [veja aqui], defende a exploração pecuária [veja aqui] e mineral [veja aqui] nessas áreas e envia projeto de lei que autoriza atividades econômicas nas reservas [veja aqui]. Além disso, a Funai fica sob os interesses dos ruralistas [veja aqui] e o secretário do MAPA afirma que os indígenas são os maiores latifundiários do país [veja aqui]. Em outubro do ano seguinte, David Thiel, funcionário de alto escalão do Facebook – plataforma que sediava o vídeo de Bolsonaro – inicia processo interno para questionar a permanência do conteúdo na rede social, requerendo a remoção por identificar discurso ‘desumanizador’ contra população indígena [3]. A resposta à solicitação de remoção do vídeo é negativa e, em reação, Thiel pede demissão [4]. Após a saída do ex-funcionário, o Facebook afirma que teria mudado de opinião e emite nota afirmando compromisso com a proibição de discursos de ódio [5].
Leia as análises sobre o que significa a ‘integração’ dos povos indígenas – por veículo midiático alinhado com políticas de esquerda, como a política integracionista vai na contramão da Constituição de 1988 e como o governo Bolsonaro reproduz a antiga política indigenista brasileira.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública nomeia, através de Portaria [1], o missionário Ricardo Lopes Dias para exercer o cargo de Coordenador Geral de Índios Isolados e de Recente Contato da Fundação Nacional Do Índio (Funai). Para a nomeação, a Funai modifica o regimento interno qual veda a ocupação do posto por pessoas que não são do quadro de servidores efetivos da Fundação [2]. O Ministério Público Federal (MPF) ajuiza ação civil pública visando à suspensão da nomeação, alegando conflito de interesses, incompatibilidade técnica, ameaça de genocídio e etnocídio contra povos indígenas [3]. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região atende ao recurso do MPF [4], dando ensejo à Portaria da Funai 686 [5], após a Justiça do Distrito Federal manter a nomeação de Lopes [6]. O desembargador responsável pela anulação afirma que o missionário nomeado já tomou decisões que violam os direitos humanos dos indígenas isolados e, portanto, é necessário tomar atitudes que inibam a violação das garantias fundamentais dos povos indígenas [7]. A decisão anula também a alteração no regime interno que permitiu a nomeação de Dias. Após semanas, o STJ suspende a decisão do desembargador, afirmando que Dias preencheu os requisitos legais para o cargo e que a ligação dele com evangelização de índios não é suficiente para caracterizar conflito de interesses [8]. Após alguns meses a Funai abre processo interno para criação de curso de Pós Graduação em Antropologia e escolhe o missionário Ricardo Dias para coordenar e dar aulas [9].
Leia as análises sobre a comunidade criada pelo Missionário para converter indígenas na Amazônia.
No mesmo dia em que envia ao Congresso Nacional um Projeto de Lei que prevê a exploração mineral e a geração de energia elétrica em terras indígenas [1] e que abre a possibilidade das aldeias realizarem atividades de agricultura e turismo [2], o presidente Jair Bolsonaro afirma que a medida é um ‘sonho’ seu, que o indígena é ‘tão brasileiro quanto nós’ e que, se pudesse, confinaria os ambientalistas na Amazônia para que eles deixem de ‘atrapalhar’ [3]. O Ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, define a medida como a ‘Lei Áurea’ dos indígenas [4]. Para líderes indígenas, a medida é vista como um ‘projeto de genocídio’ [5]. Entidades ligadas à pauta do meio ambiente criticam o projeto, pois ele viola os direitos dos povos indígenas e contribui para o desmatamento [6], e o Ministério Público Federal afirma que a incapacidade do Estado de fiscalização do garimpo ‘não pode ser legitimada pelo discurso do governo federal de legalização dessa e de outras atividades econômicas’ [7]. Poucos dias antes, Bolsonaro afirma que ‘cada vez mais, o índio é um ser humano igual a nós’ [veja aqui]. No início de 2019, o presidente tenta transferir a demarcação de terras indígenas e quilombolas para o Ministério da Agricultura (MAPA), medida que é criticada por ser ‘integracionista, colonialista e racista’ [veja aqui], na segunda tentativa, também frustrada, discursa a favor da ‘integração do índio à sociedade’ [veja aqui]. Bolsonaro já defendeu a mineração [veja aqui] e a pecuária [veja aqui] em terras indígenas e cedeu aos interesses ruralistas ao exonerar o presidente da Funai [veja aqui]. O secretário do MAPA afirma que os indígenas são os maiores latifundiários do país [veja aqui], o presidente reage em tom jocoso aos questionamentos sobre preservação ambiental [veja aqui] [veja aqui] e as multas por crimes ambientais reduzem nos primeiros meses do governo [veja aqui].
Leia as análises sobre o projeto de exploração de recursos naturais em terras indígenas, quais polêmicas em torno da mineração nessas áreas e como o governo Bolsonaro ecoa a antiga política indigenista
O presidente Jair Bolsonaro diz que não vai mais acatar nenhum pedido de demarcação de terras quilombolas no país [1]. A fala ocorreu em março de 2020, durante evento com empresários em Miami, onde o presidente ainda afirma que os 900 pedidos de demarcação de territórios quilombolas que hoje aguardam sua assinatura não serão deferidos [2]. Sobre a situação das comunidades quilombolas, Bolsonaro argumenta: ‘os governos de esquerda descobriram outras formas de atrapalhar o Brasil, com comunidades quilombolas’, e que a demarcação ‘não pode ocorrer’, pois ‘somos um só povo, uma só raça’ [3]. O presidente afirma existir uma ” ‘indústria de demarcações’ ” no país que promove também o excesso de territórios indígenas na Amazônia e por isso, além do indeferimento de terras quilombolas, não irá mais realizar demarcações de terras indígenas [4]. Bolsonaro defende que há milhares de riquezas sob o solo nessas regiões que precisam ser exploradas [5]. O posicionamento do presidente converge com o avanço das políticas do governo federal direcionadas à exploração de atividades econômicas em áreas de proteção ambiental [veja aqui] e a alta recorde de pedidos de mineração em terras indígenas .
Leia sobre o processo de demarcação de terras indígenas.
Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles exonera diretor de proteção ambiental do Ibama, Olivaldi Azevedo [1]. A exoneração acontece após a transmissão no programa Fantástico, da rede Globo, de reportagem sobre operação do Ibama sobre expulsão de garimpeiros de terras indígenas [2]. No dia 15 de abril, Olímpio Ferreira Magalhães, coronel da Polícia Militar de São Paulo (PM-SP), é nomeado para o cargo [3]. Houve queima das estruturas do garimpo e do maquinário utilizado pelos agentes do Ibama, atividade prevista legalmente para estes casos. A demissão teria sido feita a pedido do Presidente em razão da destruição dos equipamentos [4] [5]. Outros dois servidores do Ibama também são demitidos após a operação, o que é visto como retaliação [6]; os fiscais Renê Oliveira, coordenador-geral de fiscalização ambiental, e Hugo Loss, coordenador de operações de fiscalização, perdem seus cargos e são substituídos por ex-comandantes da ROTA, tropa de elite da PM-SP [7]. A demissão de Azevedo, assim como a queda das fiscalizações ambientais, é questionada pelo presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados com um pedido de informações sobre o assunto ao presidente da Casa [8]. Em 20 de abril, o Ministério Público Federal informa a abertura de um inquérito civil para investigar a existência de desvio de finalidade e os impactos da exoneração de Azevedo [9]. Em novembro, relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) revela a irregularidade de nomeação d Magalhães para o cargo [10]. Destaca-se que os invasores de terras funcionam como vetores da covid-19 para os povos tradicionais, para quem a doença apresenta maiores riscos [11].
Leia reportagem sobre a destruição de equipamentos utilizados em crimes ambientais pelo Ibama e sobre os cortes feitos às políticas de saúde para os povos tradicionais.
A Funai publica normativa [1] que interfere no processo de demarcação de terras indígenas, facilitando a invasão ilegal das áreas [2]. A nova normativa determina que somente terras indígenas que tiveram a fase de homologação finalizada – última fase do processo, determinada pelo presidente [3] [4] – serão cadastradas no Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra). O cadastro é importante, pois torna oficiais os dados sobre o perímetro do imóvel [5]. Dessa forma, a normativa mitiga a proteção de áreas que aguardam a homologação do Presidente da República. A legislação anterior, permitia o cadastro de qualquer terra indígena, mesmo com o procedimento de demarcação ainda em andamento [6]. Outra novidade é a modificação da emissão da Declaração de Reconhecimento de Limites, uma espécie de certidão, que garante que a propriedade privada não invada áreas vizinhas ocupadas por indígenas [7]. O que anteriormente era somente uma espécie de declaração, agora se torna um documento de posse, que imóveis privados localizados em terras indígenas ainda não homologadas poderão adquirir [8]. Durante o governo Bolsonaro, 114 terras privadas já foram certificadas de forma irregular pela Funai em áreas indígenas que aguardam demarcação de terra [9]. Após a publicação da normativa, o número registrado em menos de um mês foi de 72 novos certificados [10], grande aumento se comparado com as 42 certificações que ocorreram desde o início de 2019, até a publicação da normativa [11]. O governo vem tomando outras medidas que chancelam a violação dos direitos indígenas à terra, em âmbito estadual, como no caso do Projeto de Lei que autoriza o cadastramento de fazendas em sobreposição à terras indígenas e federal, como as tentativas de transferir a demarcação de terras para o ministério da Agricultura [veja aqui], resultando no grande aumento em invasões e violência [12].
Leia as análises sobre a eficácia da regulamentação fundiária na redução do desmatamento e as manobras do governo Bolsonaro para postegar a demarcação de terras indígenas.
A Funai (Fundação Nacional do Índio) ainda não apresentou nenhum plano para proteção das aldeias indígenas em relação à contaminação da covid-19 [1]. Já existem 2.392 casos de indígenas contaminados pela doença [2]. 23 povos indígenas levantaram barreiras sanitárias, em suas aldeias, bloqueando o acesso de pessoas de fora da comunidade, para evitar o contágio da doença [3]. Ao menos 40 etnias adotam essa medida; no entanto, a Funai desincentiva as medidas [4]. Devido à falta de amparo, os indígenas são obrigados a buscar auxilio fora das aldeias, gerando contaminações, bem como o contato com profissionais de saúde contaminados e assintomáticos [5]. Em 29/05/2020, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) denunciou que a Funai já teria gastado parte da verba enviada para a proteção de aldeias com a compra de veículos, que está sob investigação por irregularidades na licitação [6], mas não apresentou sequer uma ação de proteção [7], resultando em investigação pelo MPF [8]. Líderes indígenas pedem auxílio para a ONU [9] e associações indígenas pedem um plano de apoio a Secretaria Especial de Saúde Indígena [10]. Em defesa dos indígenas, o prefeito de Manaus representa contra o governo federal junto à Organizações Internacionais [11]. Na terceira semana de junho, Senadores aprovam o projeto de lei [12] que combate o avanço da Covid-19 em terras indígenas e segue para sanção presidencial [13]. Povos indígenas isolados são contaminados, fato que leva ação no Supremo Tribunal Federal (STF) requerendo medidas de proteção [14]. O Governo Federal não cumpre com a determinação do STF e fica omisso em relação à obrigatoriedade de apresentar um plano para construção de barreiras sanitárias em terras indígenas [15].
Leia as análises sobre a situação na pandemia, segundo liderança indígena, e a ameaça ao povo Yanomami por garimpo.