O Ministério da Saúde publica nota técnica [1] que promove mudanças na Política de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas. O documento permite a compra de aparelhos de eletrochoques para o Sistema Único de Saúde (SUS), reitera a possibilidade da internação de crianças e adolescentes em hospitais psiquiátricos e adota a abstinência como política de tratamento de dependentes de drogas, retirando o protagonismo da política de redução de danos [2]. Em entrevista, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirma desconhecer o documento e, ao tomar conhecimento dos temas, diz que as medidas são controversas [3], mas dias depois defende que a liberação para a compra de eletrochoque não seja vetada por se alinhar à posição do Conselho Federal de Medicina [4]. O coordenador geral do Ministério afirma que o intuito é orientar os gestores do SUS sobre a política de saúde mental [5]. O texto foi divulgado no site do Ministério, mas foi retirado dois dias depois após as críticas. Segundo a pasta, o documento ainda se encontra na fase de consulta interna para receber contribuições de outros órgãos [6]. Especialistas criticam as mudanças e consideram um retrocesso [7]. Em março, o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH)[8] recomenda a imediata suspensão das medidas em execução pelo governo e exige uma ampla discussão em audiências públicas, afirmando que algumas vão na contramão da Lei da Reforma Psiquiátrica, como a abstinência como opção de tratamento a usuário de drogas e o retorno de hospitais psiquiátricos nas Redes de Atenção Psicossocial, visto por especialista como um modelo que explora a internação e no qual ‘as pessoas perdem o direito à cidadania e, muitas vezes, a vida’ [9]. Nos meses seguintes, Bolsonaro baixa decreto que representa retrocesso na política sobre drogas [veja aqui], altera a composição do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas [veja aqui] e, em 2020, governo edita novas regras ao tratamento de comunidades terapêuticas durante a pandemia [veja aqui].
Leia a análise sobre as questões envolvendo o uso do eletrochoque como forma de tratamento e um artigo sobre a política de redução de danos a usuários de drogas.
O presidente Jair Bolsonaro baixa Decreto [1] que institui a Nova Política sobre Drogas. O documento adota como estratégia central o tratamento baseado em abstinência, em oposição à redução de danos prevista em Decreto anterior de 2002 [2]. Ademais, estabelece maior investimento no modelo de comunidades terapêuticas, entidades privadas, em geral, religiosas [3] e menciona ‘hospitais psiquiátricos’ como um dos meios de intervenção [4]. O Decreto ainda expressa posição contrária a qualquer tipo de descriminalização das drogas [5]. A esse respeito, especialistas apontam que o Brasil está atrasado nessa discussão e que o Supremo Tribunal Federal deve julgar o quanto antes a ação que discute a descriminalização do consumo de drogas para uso pessoal diante das ‘graves consequências da aplicação da atual política de drogas’ [6]. Outras medidas do decreto são criticadas. O Conselho Federal de Psicologia [7] e a Frente Estadual Antimanicomial de São Paulo [8] entendem que as novas medidas representam um retrocesso nas conquistas estabelecidas com a Reforma Psiquiátrica e a Coordenadora do Centro de Referência sobre Drogas afirma que o modelo que privilegia a internação afasta o usuário da rede de saúde e que as comunidades terapêuticas são equivocadas em termos científicos por se basearem em ‘trabalho e oração’ [9]. Bolsonaro, em julho, volta a retroceder na temática quando altera a composição do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas e exclui a participação da sociedade civil [veja aqui]. No ano seguinte, o governo edita novas regras ao tratamento de comunidades terapêuticas durante a pandemia [veja aqui].
Leia as análises sobre as alterações na Nova Política de Drogas, como funcionam as comunidades terapêuticas, motivos para descriminalizar o porte para uso pessoal e ouça sobre a eficácia da política de redução de danos.
O presidente Jair Bolsonaro baixa decreto [1] a respeito da estrutura regimental do Ministério da Saúde, provocando alterações na Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) [2]. Há a ‘integração’ da Sesai e a extinção do Departamento de Gestão da Saúde Indígena, responsável pela gestão administrativa e financeira do subsistema [3]. Segundo líder indígena, a medida é problemática não só porque o departamento extinto é importante para a gestão e controle social, como também porque foi tomada sem qualquer consulta prévia aos povos indígenas, principais destinatários da política pública [4]. Pesquisadores também alertam para o uso político da palavra ‘integrar’ na normativa, considerando o modo como o presidente tem defendido políticas integracionistas para essa população [veja aqui] [veja aqui] e a necessidade de individualização das características culturais e de saúde [5]; igualmente, apontam que o órgão extinto deixa um vácuo sobre quem será responsável por garantir a execução do orçamento da Sesai [6]. Em nota, o Ministério da Saúde afirma que segue a diretriz de ‘aprimorar o atendimento diferenciado à população indígena’ [7]. Vale lembrar que em fevereiro o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, criticou a Sesai e propôs alterar sua estrutura [8], e, em abril, outro decreto Bolsonaro extinguiu inúmeros órgãos de participação da sociedade civil [veja aqui], dentre eles a Comissão Nacional de Política Indigenista [9].
Leia as análises sobre como funciona a Sesai e entenda o que é saúde indígena
O presidente Jair Bolsonaro sanciona, com vetos, Lei [1] aprovada pelo Congresso em 15/05 que propõe alterações no Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad) [2]. A Lei adota a abstinência como estratégia central de tratamento [3], medida que já havia sido adotada em Decreto baixado em abril instituindo a Nova Política sobre Drogas [veja aqui]. A Lei autoriza a internação compulsória de dependentes químicos de forma voluntária e involuntária sem a necessidade de autorização judicial e podendo ser decidida por agentes públicos nos casos de usuários sem família ou responsável legal [4]. Em relação aos vetos, Bolsonaro retira o sistema de avaliação das políticas sobre drogas, que serviria para ‘planejar metas e eleger prioridades’ [5], além de vetar artigo que alterava as penas para tráfico de drogas por ter efeito mais benéfico a quem comete crimes [6]. A Lei é alvo de críticas. O secretário executivo da Plataforma Brasileira de Política de Drogas afirma que a nova política se torna ineficiente ao não tocar em temas como a descriminalização ou ‘a definição de critérios objetivos para diferenciar uso de tráfico’ [7] e o advogado do programa de Violência Institucional da Conectas a considera um ‘grave retrocesso’, contrariando protocolos internacionais ao não respeitar o direito à autonomia e autodeterminação [8]. Vale lembrar que, em julho, Bolsonaro exclui a participação da sociedade civil na composição do Conad [veja aqui].
Leia as análises sobre o que é a internação compulsória, os problemas da nova política e ouça sobre a eficácia de políticas para redução de danos.
Levantamento desta data revela que 57 hospitais, de uma lista de 176 instituições habilitadas, se negam a realizar o procedimento de aborto legal [1]. A pesquisa [2] mapeou estabelecimentos que oferecem serviço de interrupção da gravidez em sites do Sistema Único de Saúde e por meio de pedido de Lei de Acesso à Informação (LAI) ao Ministério da Saúde, em seguida foram realizadas ligações telefônicas a todos os hospitais, dos quais 43% informaram não prestar o serviço [3]. O aborto é autorizado pelo Código Penal em três situações: violência sexual (estupro), risco à vida da gestante e anencefalia do feto; nesses casos, deve ser assegurado o acesso gratuito a serviços de saúde especializados [4]. A pesquisa também constata a falta de informação dos próprios hospitais respondentes, muitos dos quais revelaram desconhecimento sobre a idade gestacional máxima permitida e a desnecessidade de apresentação de boletim de ocorrência em caso de violência sexual [5]. Os resultados da pesquisa são confirmados por especialistas da saúde e do direito que comparam as dificuldades enfrentadas pelas mulheres a uma ‘via-sacra’ [6]. Vale notar que ao longo de 2019, o governo federal adotou posturas prejudiciais aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres: a ministra Damares Alves defende a vida ‘desde a concepção’ em discurso na ONU [veja aqui], denuncia revista por reportagem sobre aborto [veja aqui], e lança campanha que defende a abstinência sexual contra gravidez precoce [veja aqui]. No ano seguinte, o Itamaraty se abstém em votação da ONU sobre resolução que visa ao fortalecimento de direitos sexuais e reprodutivos [veja aqui] e realiza conferência anti-aborto [veja aqui].
Leia análise sobre o estado do acesso à informação sobre aborto legal no Brasil e acesse o mapa do aborto legal produzido pela pesquisa
Wilson Witzel (PSC), governador do Rio de Janeiro, declara apoio a política de internação compulsória de pessoas em situação de rua [1]. Na fala, o governador diz que ‘pessoas que estão na rua e que não têm capacidade de autodeterminação não podem decidir se querem ou não ficar na rua’ [2]. A declaração faz referência a pessoas em situação de rua e dependentes de substâncias químicas, em especial a episódio de dois dias antes na zona Sul da capital, em que um homem em situação de rua e possivelmente em estado de transtorno psicótico tentou assaltar duas pessoas, resultando em morte [3]. Sobre o ocorrido, o governador ainda elogia os policiais militares (PM), que acertaram com um tiro o homem em situação de rua, e completa ‘teria dado um tiro na cabeça dele’[4]. A proposta se relaciona a lei sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, que prevê a internação compulsória de dependentes químicos sem a necessidade de autorização judicial [veja aqui]. A proposta é considerada por especialistas como um retrocesso, uma vez que viola direitos fundamentais como a autodeterminação, além de incentivar a criminalização da pobreza [5]. Vale notar ainda as declarações de Witzel são marcadas pela legitimação do uso de violência contra minorias [veja aqui], com a comemoração de ações policiais que resultam em morte [veja aqui].
Leia análise sobre tratamentos alternativos à internação compulsória e ouça podcast sobre a lei que facilitou a internação
O presidente da República Jair Bolsonaro afirma, ao lançar o programa ‘Médicos pelo Brasil’, que o ‘Mais Médicos’ (criado pela ex-presidenta Dilma Roussef em 2013) tinha como objetivo formar núcleos de guerrilha no Brasil [1]. O ‘Mais Médicos’ era fruto de uma parceria com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), que intermediou acordo entre os governos do Brasil e Cuba [2]. O governo cubano rompeu a parceria após a eleição de Jair Bolsonaro, que chegou a comparar a situação dos médicos cubanos com a ‘escravidão’ [3]. O ‘Mais Médicos’ continuou existindo após a saída dos profissionais cubanos, mas enfrentando dificuldades para ocupação dos postos [4], especialmente em áreas mais vulneráveis [5], ocupadas por territórios indígenas [6], além de atrasos nos pagamentos [7]. A declaração de Bolsonaro, que não é lastreada em fatos comprováveis [8], não foi a primeira de atque ao programa e aos médicos cubanos: na ocasião de lançamento do ‘Médicos pelo Brasil’, Bolsonaro também afirma que se os médicos cubanos fossem bons teriam salvado a vida do ex-presidente da Venezuela, Hugo Cháves [9]. O novo programa é baseado no ‘Mais Médicos’ e, de acordo com Luiz Henrique Mandetta, os dois programas devem coexistir até que o primeiro seja extinto [10]. Cabe destacar que com a saída dos cubanos, 17% das vagas anteriores do Mais Médicos não foram preenchidas [11].
Leia análise sobre diferenças entre o programa Mias Médicos e o Médicos pelo Brasil.
O presidente Jair Bolsonaro veta [1] projeto de lei (PL) [2] que modifica a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) para determinar a notificação compulsória de serviços de saúde pública e privada à polícia em 24h em casos de suspeita da prática de violência contra a mulher [3]. A lei já obrigava a notificação em caso de risco à vítima ou à comunidade; o PL de autoria da deputada Renata Abreu (PTN-SP) inova ao determinar o registro de indícios de violência no prontuário médico da paciente, o que segundo a parlamentar ajudaria a produzir dados estatísticos na ausência de boletim de ocorrência [4]. Segundo Bolsonaro, o veto integral é respaldado pelos Ministérios da Saúde e da Mulher, Família e Direitos Humanos que veêm ‘contrariedade ao interesse público’, uma vez que a notificação implicaria na identificação da vítima sem seu consentimento [5]. Igualmente, promotora especializada no enfrentamento à violência doméstica sinaliza ‘efeitos colaterais’ do PL, uma vez que o registro policial é um dos elementos que inibem as mulheres de procurarem ajuda [6]. Já para advogada criminalista, o veto é um ‘erro’, na medida em que o PL teria o potencial de aprimorar diagnósticos da política pública de enfrentamento à violência [7]. No mês seguinte, o Congresso Nacional derruba o veto presidencial, garantindo a obrigatoriedade da notificação por servidores da saúde [8]. Vale lembrar que em 2019, o governo federal retira compromisso de não violência contra mulher de edital de livros didáticos [veja aqui], extingue órgãos colegiados de prevenção à violência de gênero [veja aqui], o termo gênero deixa de ser usado pelo Itamaraty [veja aqui], e informações sobre a política de gênero são censuradas [veja aqui]. Em 2020, o governo tenta barrar medidas que ampliam direitos das mulheres na ONU [veja aqui], e promove conferência anti-aborto [veja aqui].
Leia análise sobre os efeitos da notificação obrigatória de violência doméstica por serviços de saúde.
A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, lança oficialmente a campanha que promove a abstinência sexual entre jovens na Semana Nacional de Prevenção à Gravidez Precoce em conjunto com Ministério da Saúde [1]. A política com o logo ‘tudo tem seu tempo’, estimula o adiamento das relações sexuais e ocorre no mesmo período em que que o Ministério da Saúde interrompe a distribuição da caderneta do adolescente nas unidades básicas de saúde, documento com informações sobre puberdade e sexo seguro [2]. A campanha é criticada por entidades da saúde e questionada pela Defensoria Pública da União, que recomenda em ofício aos ministérios seu encerramento diante da ausência de evidências sobre a efetividade da abstinência na diminuição da gestação entre adolescentes e na prevenção de doenças sexualmente transmissíveis [3]. A medida ocorre em contexto de censura de informações sobre políticas de gênero pelo Itamaraty[veja aqui], e críticas de Damares Alves à suposta ‘ideologia de gênero’[veja aqui].
Leia análise sobre as origens do modelo da política de abstinência sexual e seus riscos.
Presidente Jair Bolsonaro lista, através do Decreto 10.282 [1], série de serviços considerados essenciais, isto é, aqueles que se não realizados podem colocar em risco a sobrevivência, saúde ou segurança da população. Dentre as atividades listadas estão as de assistência à saúde e segurança pública, transporte de passageiros, serviços de call center e delivery, farmácias e supermercados, transporte e entregas de cargas em geral, mercado de capitais (Bolsa) e de seguros. Em 22/03, o Decreto 10.288 [2] inclui a imprensa como um serviço essencial [3]. Já o Decreto 10.292 [4], de 25/03, inclui atividades religiosas de qualquer natureza como serviços essenciais [veja aqui]. Em 28/04, o Decreto 10.329 [5] exclui o transporte intermunicipal do rol das atividades essenciais, mantendo o transporte interestadual e internacional de passageiros. Em 08/05, o Decreto 10.344 [6] inclui salões de beleza e academias como atividades essenciais durante a pandemia [veja aqui]. Vale lembrar que, em decisão do STF, foi fixado entendimento de que estados e municípios têm autonomia para determinar atividades tidas como essenciais, de forma concorrente ao governo federal [veja aqui].
Leia a análise sobre as disputas políticas das atividades que podem ser consideradas como essenciais no contexto da pandemia.