Governo federal lança campanha publicitária ‘O Brasil não pode parar’ para defender flexibilização do isolamento social, em oposição às recomendações da OMS, e aposta em retomada econômica com a volta da normalidade em diversos setores como comércio, transportes e educação [1]. Após o lançamento, procuradores do Ministério Público Federal entraram com ação na Justiça Federal do Rio de Janeiro, que atendeu o pedido para proibir o governo federal de veicular a propaganda [2]. Posteriormente, o ministro do STF, Luís Roberto Barroso, atendeu pedido da Rede para também vetar a campanha publicitária do governo federal. Segundo o ministro, as medidas de flexibilização do distanciamento social colocariam em risco a saúde e vida das pessoas, e atentariam contra princípios constitucionais [3].
Leia análise sobre os efeitos sociais e institucionais da campanha publicitária veiculada pelo governo federal.
Portaria do Ministério da Cidadania [1] estabelece novas regras de atendimento das comunidades terapêuticas durante a pandemia. Pacientes com suspeita de contaminação da covid-19 devem ser encaminhados para tratamento em unidades de saúde, com garantia de retorno as comunidades após o término do tratamento. Novos acolhidos devem permanecer em isolamento por 14 dias, com exceção aos que testarem negativo para o coronavírus. Caso as comunidades não tenham capacidade de realizar o isolamento, novos acolhimentos não devem ser realizados. As visitas dos familiares não estão suspensas, mas não são recomendadas enquanto durar o estado de emergência [2]. As comunidades terapêuticas foram classificadas como serviços essenciais (dentre outras atividades [veja aqui]) para prosseguirem funcionamento [3].
Leia a análise sobre atuação das comunidades terapêuticas no Brasil.
Desde o começo da crise do coronavírus, Bolsonaro e Mandetta têm travado embates. O ministro prega políticas de isolamento, enquanto Jair Bolsonaro adota discurso contrário, o que gera conflito. A popularidade do ministro também é vista com desconfiança pelo presidente. Em 02/04, Bolsonaro fala em entrevista que está ‘faltando humildade’ por parte de Mandetta na condução do país. Mandetta não quis rebater a crítica, mas disse que ‘quem tem mandato popular, fala, e quem não tem, como eu, trabalha’ [1]. Na semana seguinte (05/04), o presidente ameaça demitir pessoas do governo que ‘viraram estrela’, em referência ao ministro, e diz não ter medo de ‘usar a caneta’ [2]. Em 11/04, por sua vez, Bolsonaro volta às ruas contrariando recomendações de instituições de saúde, em visita à obra de hospital no interior de Goiás e gera aglomerações. Com isso, é criticado pelo governador de Goiás, Ronaldo Caiado [veja aqui], e também por Luiz Henrique Mandetta. A série de choques é agravada com a entrevista do ministro ao programa ‘Fantástico’, da TV Globo, em 12 de abril, em que Mandetta diz que a população brasileira não sabe se segue o presidente ou o ministro da saúde [3]. No dia 15/04, o presidente afirma a apoiadores que está resolvendo a questão da saúde para ‘tocar o barco’ [4] e há especulações sobre quem seria o próximo Ministro da Saúde [5], já que Mandetta já teria avisado o Ministério de sua exoneração [6]. Mandetta é exonerado no dia seguinte (16) pelo presidente Jair Bolsonaro [veja aqui].
Leia a análise sobre os choques entre o Ministro da Saúde à época e o presidente.
A Advocacia Geral da União, em novo movimento de defesa do governo federal frente a embate com governadores e prefeitos [veja aqui], divulga nota afirmando que pretende ajuizar ações contra as medidas “restritivas de direitos fundamentais” impostas por ocasião do combate à Covid-19. A nota da AGU, embora não tratasse de nenhum caso específico, seria direcionada ao governador de São Paulo, João Doria, que havia anunciado possibilidade de emprego de força policial para aumentar o isolamento social [1]. Até então o Executivo federal vinha perdendo ações deste tipo [2], sendo o entendimento estabelecido pelo STF de que há competência concorrente entre os entes federativos nas medidas de prevenção da covid-9 [veja aqui].
Após já ter flertado com a possibilidade dez dias antes [1], o presidente oficializa a exoneração do Ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta [2]. A demissão marca série de choques que Bolsonaro já travava com Mandetta [veja aqui]. Antes da exoneração, pesquisas já mostravam como o Ministro da Saúde estava ganhando popularidade [3] e como a maioria da população era contra sua substituição [4]. Em seu pronunciamento, Bolsonaro chama a exoneração de ‘divórcio consensual’ [5]. Ele afirma que, apesar de entender a gravidade da pandemia, deve reconhecer as especificidades de seu enfrentamento no país. Citando novamente o diretor da OMS [veja aqui] e a ideia de que ‘as consequências do tratamento não podem ser mais danosas que a doença’ [veja aqui], o Presidente volta a incentivar a liberação do trabalho [6] e alertar para o problema do desemprego [7]. Após o ato presidencial que colocou Nelson Teich no comando da Saúde [8], diversas foram as reações negativas. Presidentes da Câmara e do Senado divulgaram nota conjunta exaltando o trabalho do ex-Ministro, enviando alerta ao Presidente e reafirmando compromisso com a redução dos efeitos negativos da pandemia [9]. Além disso, deputados do PSOL comunicaram à OMS e ONU em carta [10] a demissão do Ministro, denunciando ‘descontinuidade de gestão em plena pandemia’ [11] e o não cumprimento das medidas recomendadas de enfrentamento da doença. Foram também registrados panelaços [12] e grande repercussão nas redes sociais, com destaque para avaliações positivas do ex-Ministro [13].
Leia as análises sobre os conflitos do presidente com o ex-Ministro, as políticas implementadas por ele no Ministério e a repercussão na mídia inglesa e norte-americana.
Após o governo do Maranhão ter coordenado a compra de respiradores e fracassado três vezes, em razão da interferência do governo federal e da competição com o governo alemão e norte-americano [1], o governador Flávio Dino importou os equipamentos fora da rota tradicional [2]. Sobre essa operação, a Receita Federal declara ilegalidade e afirma violação à legislação aduaneira [3]: o plano teria sido realizado sem aval da Anvisa e da Inspetoria da Receita Federal [4] e os parâmetros mais flexíveis de importação estipulados por Instrução Normativa [5] do mês anterior não teriam sido considerados [6]. De acordo com a Lei da Quarentena [7], que vigora durante a situação de emergência sanitária, o registro da Anvisa antes da importação de produtos pode ser dispensado em ocasiões específicas. Dino lamentou a iniciativa da Receita Federal, que ele ligou à a postura do presidente de ‘criar confusão a todo momento’ [8]. Nos meses seguintes, equipamentos de proteção são retidos por semanas pela Receita Federal, a despeito da maior flexibilidade procedimental proposta [9] e o ministério da saúde se exime da responsabilidade de fornecimento de respiradores [10]. Vale notar que as disputas em torno da importação de equipamentos se tornaram comuns durante a pandemia [11] [12] [13]. Medidas de confisco empreendidas pelo governo federal, estadual e municipal [14] têm levantado questionamentos jurídicos [15].
Leia as análises sobre a iniciativa do governo do Maranhão e as disputas internacionais em torno de respiradores chineses reportadas pela mídia inglesa e francesa.
O ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, critica o que chama de ‘cobertura maciça de fatos negativos’ dos veículos de comunicação sobre a pandemia do coronavírus [1]. Ramos cobra que a imprensa destaque dados positivos, como o número de pessoas curadas [2]. As críticas a mídia se assemelham as declarações do presidente Jair Bolsonaro que já atacou a imprensa em mais de uma oportunidade desde o início da pandemia [veja aqui], acusando veículos de estarem criando uma ‘fantasia’ sobre a crise do covid-19 [veja aqui]. Alguns dias depois, quando o Brasil ultrapassava o número de mil óbitos devido à covid-19, o Ministério da Saúde (MS) passa a publicar o que chama de ‘Placar da Vida’, que destaca os dados de brasileiros que se recuperaram da doença e omite o número de óbitos [3]. No decorrer da pandemia, o MS passa a atrasar a divulgação de dados epidemiológicos [veja aqui] e, em seguida, a omitir o total de mortes por covid-19 no país [veja aqui]. Em junho, como resposta às críticas e a restrição do acesso aos dados sobre a pandemia, diversos veículos de mídia formam uma parceria para coletar e divulgar informações relativas aos casos de covid-19, no Brasil [4].
Leia análise sobre a diminuição da transparência na divulgação dos dados de covid-19 no Brasil.
No dia 23 de abril, ao falar com apoiadores na saída do Palácio da Alvorada, Bolsonaro afirmou que enquanto for presidente “não haverá” aborto no Brasil [1]. Cinco dias antes, o presidente encontrou-se com apoiadores religiosos em ato pró-vida, que causou aglomeração na rampa do Palácio da Alvorada mesmo após a OMS recomendar distanciamento social [2]. No dia 24 de abril, o STF começou a julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5581 [3], para a descriminalização do aborto para mulheres infectadas pelo vírus zika. Ajuizada pela Associação Nacional dos Defensores Públicos, a ação tensionava somar a interrupção da gestação pelo zika às demais hipóteses de aborto legal — caso a mulher tenha sido vítima de estupro, corra risco de vida ou se o feto por anencéfalo. Houve rejeição da ação por maioria dos votos [4]. A ADI também tratava da adoção de diversas políticas públicas para mães e crianças com síndrome congênita pelo zika vírus, que ainda propaga-se pelo Brasil. Hoje, há lei sancionada que garante pensão vitalícia mensal à crianças que sofrem da síndrome, condicionada a crianças nascidas entre 2015 a 2019 [5].
Leia a petição inicial da Ação Direta de Inconstitucionalidade 5581 e análise para a compreensão da ação pelo Instituto Anis de Bioética.
O presidente faz postagem em rede social acusando a Organização Mundial da Saúde de incentivar a masturbação e a homossexualidade de crianças [1]. O conteúdo do texto coloca em prova a autoridade da organização para decidir sobre políticas de saúde, afirmando que ela teria políticas educacionais inadequadas para crianças. Minutos depois, Bolsonaro apaga a postagem. Cabe notar que desde o início da pandemia o presidente deturpou falas do Diretor Geral da OMS [veja aqui] em mais de uma ocasião [veja aqui].
Leia a análise sobre a política educacional da OMS e o caso.
Em 30/04, o Ministério Público (MPE) do Maranhão ajuíza Ação Civil Pública (ACP), requerendo a adoção de medidas de confinamento mais severas, entendidas como de lockdown, na ilha de São Luís, que envolve os municípios de São Luís, São josé de Ribamar, Raposa e Paço do Lumiar [1]. A ACP foi ajuizada após o boletim epidemiológico da Secretaria de Estado da Saúde (SES) já apontar que 100% dos leitos de UTI da rede estadual estão ocupados na capital [2] e que faltam dados transparentes para gerir a crise, como também já apontado em outros estados [veja aqui]. No dia em questão, o boletim diário também aponta 3.506 pessoas infectadas, 204 óbitos e 316 novos casos confirmados de covid-19 [3]. Nesse mesmo dia, a justiça estadual acolhe pedido liminar feito pelo MPE [4], o que significa que a decisão ainda pode ser revertida em definitivo. Após a decisão, o governador Flávio Dino decreta o lockdown na Ilha de São Luís [5], que passa a valer em 05/05 [6]. Vale notar que outros estados também cogitam a medida, como Rio de Janeiro, Pernambuco e Pará [7].
Leia as análises sobre as previsões de obrigacões aos cidadãos no decreto do governador e as divergências de especialistas sobre a medida.