O Espaço Cultural Correios em Niterói (RJ) pede que o artista Gabriel Grecco substitua duas obras da exposição ‘Isto não é arte’, pois o material contém ‘imagens sem aderência aos seus princípios de gestão cultural’ e que a proposta não condiz com ‘a política de associação’ da marca, conforme apurado pela imprensa nesta data [1]. Em um dos quadros há a imagem de uma criança armada vestida de Capitão América com a frase ‘Isso não é arte. Isso é nosso mundo de merda’ e no outro há a figura de um homem armado com um fuzil e uma pistola, segurando halteres, com uma suástica tatuada no braço e a seguinte legenda: ‘Nunca fomos tão boçais’ [2]. Grecco acusa a diretoria da galeria de censura e decide cancelar a mostra [3]. De acordo com o artista, a diretora do espaço cultural, Denise Anne, disse que as telas tratavam de ‘problemáticas contemporâneas’ e que era melhor trocá-las para ‘não gerar polêmicas’ [4]. Ele afirma que suas obras não têm cunho político nem são críticas ao governo; mas acredita que se trata de censura, pois não pôde colocar as telas que desejava mesmo tendo a proposta aprovada [5]. Em nota, os Correios declaram que a proposta do artista ainda estava em análise e que outras obras do artista foram expostas no espaço em outros momentos [6]. Grecco é convidado pelo secretário municipal de Cultura, Victor de Wolf, para realizar a exposição no Solar do Jambeiro; de acordo com o secretário a ideia é abrigar nos equipamentos da prefeitura exposições ‘censuradas’ em outros locais do estado [7]. Outros eventos culturais foram censurados em virtude de seu suposto conteúdo político, como as exibições de filmes no Centro Cultural da Justiça Federal [veja aqui], da peça ‘Caranguejo Overdrive’ no Centro Cultural Banco do Brasil [veja aqui], da peça ‘Abrazo’ na Caixa Cultural [veja aqui] e do show da banda Teto Preto no Memorial dos Povos Indígenas .
O ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) determina que o Banco Central (BC) forneça em 5 dias cópias de todos os relatórios de inteligência financeira (RIFs) – informações sigilosas a respeito de movimentações financeiras atípicas – elaborados entre 2016 e 2019 pelo então Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), renomeado e reestruturado em agosto sob o nome de Unidade de Investigação Financeira (UIF) [veja aqui] [1]. A decisão do ministro ocorre em processo sigiloso que discute a legalidade de investigações instauradas com informações obtidas pelo Coaf sem prévia autorização judicial [2]; e é revelada por reportagem da Folha de São Paulo em 14/11, a qual aponta que a determinação inclui a disponibilização de 19.441 relatórios pelo BC, garantindo o acesso a dados de 412,5 mil pessoas físicas e 186,2 mil pessoas jurídicas [3]. A decisão é fundamentada pela necessidade de compreensão das etapas de elaboração dos RIFs, mas o ministro não se pronuncia publicamente sobre o caso [4]. No dia seguinte à reportagem, o Procurador Geral da República, Augusto Aras, solicita a revogação da decisão por considerar a ordem de Toffoli uma ‘medida desproporcional que põe em risco a integridade do sistema de inteligência financeira, podendo afetar o livre exercício de direitos fundamentais’, mas o pedido é indeferido [5]. O entendimento de Aras é corroborado pela Unidade de Investigação Financeira, que ressalta riscos para prosseguimento de investigações [6]. Em 18/11, Toffoli decide ‘tornar sem efeito a decisão’ e afirma que, a despeito das informações terem sido prestadas pela UIF, ‘esta corte não realizou o cadastro necessário e jamais acessou os relatórios de inteligência’ [7]. Vale notar outros episódios de interferência no órgão de inteligência são registradas, como mudança na sua subordinação ministerial [veja aqui], reestruturação e demissão de seu presidente [veja aqui].
Leia análise sobre riscos do acesso indiscriminado de dados sigilosos pelo presidente do STF e entenda o que são os relatórios de inteligência.
Em menos de dois meses no cargo, Augusto Aras, Procurador-Geral da República (PGR), executa atos contra minorias. Em 31/10, Aras, de perfil conservador, pede ao Supremo Tribunal Federal (STF) a extinção de ação sobre indenização a indígenas atingidos pela construção da hidrelétrica Itaipu, proposta por sua antecessora no cargo, Raquel Dodge, [1] pedido acolhido pelo STF [2] [veja aqui]. Em 06/11 o PGR também apresenta parecer ao STF defendendo que Jair Bolsonaro poderia bloquear cidadãos em seu perfil no Twitter [3], em ação promovida por deputada que afirma que a rede é utilizada como divulgação de políticas públicas e atos de governo [4]. Ainda, na investigação sobre a morte da vereadora Marielle Franco, procuradores afirmam que o PGR teria se precipitado ao arquivar informações sobre citação a Bolsonaro de um dos acusados do crime [5]. Augusto Aras também abriga procuradores alinhados ao governo de Jair Bolsonaro em seu gabinete [6]. A atuação do PGR é lida como alinhada ao presidente Jair Bolsonaro, o que segundo especialista pode afetar investigações [7]. Vale lembrar que Bolsonaro nomeou Aras fora da lista tríplice definida pela categoria dos procuradores da República, costume desde o primeiro mandato do ex-presidente Lula, sendo duramente criticada pela categoria que afirma que a atitude pode gerar falta de transparência [8] [veja aqui]. No ano seguinte, o PGR exime o presidente de investigação sobre participações em atos antidemocráticos [veja aqui] e o presidente flerta com a possibilidade de indicá-lo ao STF, caso nova vaga seja aberta [veja aqui]. Após um ano no cargo, o diagnóstico de alinhamento se fortalece [veja aqui].
Leia análises sobre o alinhamento de Augusto Aras com o governo, e entenda os requisitos de escolha do PGR e suas principais funções.
Em declaração feita durante cerimônia militar em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, o presidente Jair Bolsonaro afirma que o Brasil deixou de cuidar da área de Defesa nos mandatos anteriores por ideologia, argumentando que as Forças Armadas representam um grande obstáculo ao socialismo e declara que o país precisa se rearmar para conseguir se defender [1]. No mesmo dia, os dois países estabelecem dois memorandos de intenção de cooperação na área de Defesa, que incluem a formação de um fundo para expandir a capacidade produtiva no setor e uma parceria no campo da produção e da comercialização de armamentos [2]. Na ocasião, Bolsonaro também declara que ‘ninguém quer um Brasil extremamente belicoso’, mas que é preciso garantir um mínimo de capacidade de ‘dissuasão’ [3] e afirma que a América Latina precisa de estabilidade [4]. Dois dias antes, Bolsonaro havia classificado as manifestações ocorridas no Chile como ‘atos terroristas’ e declarou que estava em diálogo com o Ministério da Defesa para preparar as tropas para reprimir possíveis manifestações no país [veja aqui]. Vale notar que o governo federal prioriza políticas de ampliação do acesso a armamentos, como a edição do decreto que amplia a autorização de importação de ‘produtos de defesa’ para as Forças Armadas, guardas municipais, colecionadores, atiradores e caçadores [veja aqui], de portaria que amplia a validade de autorização para compra de arma de fogo ao Exército [veja aqui] e declaração do presidente de que é preciso armar a população .
O Procurador Geral da República (PGR), Augusto Aras, requer desistência de ação cível [1] para a responsabilização do Estado brasileiro e da usina hidrelétrica binacional Itaipu por danos causados ao povo indígena Awa-Guarani, decorrentes da construção das obras na ditadura militar [2]. O pedido é acatado pelo STF. A ação foi proposta no mês anterior pela ex-PGR, Raquel Dodge, para indenizar os índios por remoção forçada [3] e estava fundamentada em relatório produzido por grupo de trabalho do Ministério Público Federal (MPF), o qual concluiu que à época da construção da usina hidrelétrica, órgãos governamentais realizaram fraude nos registros de identificação étnica das populações indígenas da região, além de identificar ameaças violentas, discriminações e precarização das condições de vida dos povos indígenas [4]. Já o fundamento do pedido de desistência de Aras se baseou no argumento de ‘risco de inefetividade’ dos pedidos ‘consideradas as dificuldades para a fiel identificação dos sujeitos beneficiários’ [5]. Ressalte-se que o número de sobreviventes diretamente afetados à época da construção da usina se limita a 12 pessoas, conforme alegado pela Comissão Yvyrupa, representante dos Awa-Guarani [6]. Moraes acata o pedido de Aras porque, o Código de Processo Civil possibilita a desistência de ação quando as partes não tiverem sido citadas, o que se confirma no caso concreto [7]. Em reação, os Awa-Guarani solicitam que sejam incluídos como parte interessada do processo, e recorrem, sem sucesso, da decisão [8] [9], pois o STF considera que os ‘índios’ são apenas ‘em tese prejudicados’ o que impede seu reconhecimento como parte representativa [10]. Em nota, integrantes do MPF e da Comissão Arns lamentam a postura de Aras e a decisão de Moraes [11]. Vale notar que o pedido de Aras ocorre em seu primeiro mês no cargo e soma-se a outras atuações afinadas com interesses do presidente [veja aqui].
Leia análises sobre os motivos que fundamentaram o pedido de indenização para os Awa-Guarani, entenda os resquícios da ditadura militar sobre o imaginário dos povos indígenas hoje e leia entrevista sobre as graves violações de direitos humanos perpetradas contra os povos indígenas no período militar.
A Polícia Militar do Amazonas mata 17 pessoas, dentre elas um menino de 14 anos, depois de um suposto confronto, mas nenhum policial é baleado e as viaturas que atuaram na ação não apresentam marcas de tiros [1]. Segundo moradores, não houve troca de tiros e uma testemunha afirma que ouviu policiais dizendo que ‘a ordem é para matar’ [2]. O governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), se manifesta nas redes sociais exaltando o combate ao crime organizado e afirma que trabalha para garantir a segurança do cidadão e quem ‘ganha é o cidadão de bem’ [3]. Na mesma linha, o secretário de Segurança Pública do estado, coronel Bonates, afirma que a ‘polícia não mata, ela intervém tecnicamente’ e atribui o fato de nenhum policial estar ferido a uma proteção divina [4], além de declarar que quem trocar tiro com a polícia causará o ‘choro de suas famílias’ [5]. O Ministério Público instaura procedimento administrativo para apurar o ocorrido [6] e, em janeiro de 2020, após o inquérito conduzido pela Polícia Civil concluir que os policiais agiram de acordo com o ‘dever legal’ e em legítima defesa, o Ministério Público decide realizar novas diligências [7]. Outras declarações com valorização de medidas punitivistas ocorrem nas falas do presidente Jair Bolsonaro sobre a pena de morte [veja aqui] e elogio a policial que mata em serviço [veja aqui], do governador de São Paulo, João Doria, ao afirmar que a polícia não precisa reduzir o número de mortes [veja aqui] e que a política de segurança pública não vai mudar [veja aqui] e do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, ao declarar que a polícia ‘mandou recado’, em referência ao número de mortes no estado [veja aqui].
Leia a análise sobre a naturalização das mortes nas periferias e ouça as análises sobre a segurança pública e a estrutura das polícias militares no país.
Bolsonaro assina decreto [1] revogando decreto anterior, de 2009, [2] que determina o zoneamento para plantação de cana de açúcar no Brasil. Dessa forma fica permitido [3] o plantio de cana-de-açúcar na Amazônia, no Pantanal e em terras indígenas, por exemplo [4], podendo assim, ampliar o desmatamento [5]. Devido à proteção ambiental conferida pelo antigo decreto, o setor sucroalcooleiro havia se dissociado completamente do desmatamento, alega organização ambiental de proteção à ecossistemas [6]. Por conta da revogação, o Brasil pode perder a imagem positiva que tinha internacionalmente por conta do biocombustível, segundo pesquisadores do Observatório do Clima [7] e perder exportações com a Europa, conforme ressalta pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) [8]. Devido aos riscos apresentados às áreas que perderam proteção, o Ministério Público Federal (MPF) ajuíza ação contra a União, pedindo a revogação do decreto revogatório [9]. Em abril do ano seguinte, a justiça acata o pedido liminarmente e suspende o decreto assinado pelo presidente, restabelecendo o zoneamento até que sejam esclarecidas as razões que motivaram sua revogação, bem como a União comprove que ‘não haverá retrocesso na proteção ambiental, nem risco de danos graves e irreversíveis’ [10].
Leia as análises sobre as consequências da revogação do zoneamento do plantio de cana de açucar e as dez perguntas mais importantes para entender a situação
O governo federal transfere a área da cultura do Ministério da Cidadania para o Ministério do Turismo através de dois [1] decretos [2]. A medida realoca a Secretaria Especial de Cultura e o Conselho Nacional de Política Cultural, a Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, a Comissão do Fundo Nacional de Cultura e outras seis secretarias [3]. A mudança é vista como ‘revanchismo’ do governo federal em relação à classe artística [4]. A alteração acontece em cenário de precarização da cultura, pela soma de várias medidas. Por exemplo, o cancelamento de programas culturais por empresas estatais [veja aqui], a nomeação de Roberto Alvim como secretário da Cultura, que ganhou a simpatia do presidente Jair Bolsonaro ao ofender a atriz Fernanda Montenegro em suas redes sociais [5]. Artistas e profissionais da área, incluindo dois ex-ministro da Cultura, criticam a decisão em razão da precarização da área [6]. Especialistas também afirmam que a medida pode dificultar a captação de recursos para a área cultural, além de lançar dúvidas sobre questões orçamentárias para o órgão e questões gerais de organização para realizadores e servidores [7]. Posteriormente, Alvim afirma que a arte brasileira é um ‘projeto de esquerda’ [veja aqui] e é demitido por fazer vídeos com referências nazistas [veja aqui]. A realocação das áreas somente se finaliza seis meses depois, na saída da então secretária Regina Duarte [veja aqui]. Vale lembrar de outras medidas na área cultural, como a nomeação de presidenta sem perfil acadêmico para a Casa de Rui Barbosa [veja aqui].
Leia análises sobre o histórico da cultura no governo Bolsonaro, a mudança da pasta para o Ministério do Turismo, a precarização da cultura e crítica a outras mudanças na área.
A Portaria nº 137 [1] assinada pelo Comandante Logístico, o general Carlos Alberto Neiva Barcellos, altera regulação anterior [2], para estender regras de aquisição de armas antes restritas ao Exército. A partir de agora, militares da Marinha e Aeronáutica estão autorizados a adquirir armas de fogo, em número de até seis unidades, tanto de uso permitido como de uso restrito. No mesmo dia, é editada outra Portaria [veja aqui] sobre aquisição de armas de fogo por agentes de segurança estatais controladas pelo Comando do Exército [3] e, no mês seguinte, é editada nova Portaria que facilita regras sobre atividades de colecionamento de armas, tiro desportivo e caça [veja aqui]. As Portarias regulam aspectos dos Decretos sobre o acesso a armas de fogo baixados em 2019 [veja aqui]. Em 2020, o governo dá continuidade a flexibilização do controle de armas [veja aqui], aumenta o limite de munições para civis [veja aqui], e promete novas medidas armamentistas [veja aqui], como a retirada de imposto de importação para armas de fogo [veja aqui].
Leia as análises sobre armas de fogo como instrumento de segurança e balanço do governo Bolsonaro quanto a medidas na área de segurança pública.
A Portaria nº 136 [1] revoga regulação anterior [2] sobre aquisição por agentes de segurança estatais (agentes policiais, por exemplo) de armas de fogo controladas pelo Comando do Exército. O requerimento de autorização para compra de arma de fogo ao Exército passa a servir para compras de até quatro anos, o que antes era vedado. Além disso, o prazo para a aquisição de armas após a autorização muda de seis meses para um ano [3]. A Portaria também muda regulação [4] sobre limites de armas e munição para colecionadores, atiradores e caçadores (CACs). Nesse sentido, aumenta a quantidade de pólvora permitida por compra para a recarga de munições de caça – em 2018, era de 12 kg, agora passa para 20kg [5] – e a quantidade munições de 5.000 unidades para armas de uso permitido e 1.000 para armas de uso restrito. Fora isso, aumenta o limite de armas adquiridas por CACs. No mesmo dia, outra portaria foi editada [veja aqui], estendendo a todas as Forças Armadas regras de aquisição de armas restritas ao Exército e, no mês seguinte, sobreveio nova Portaria nesse sentido [veja aqui]. As Portarias regulam a série de Decretos sobre o acesso a armas de fogo baixados em 2019 [veja aqui]. No ano seguinte, o presidente aumenta o limite de compra de munições para civis comuns [veja aqui] e promete mais medidas de flexibilização em prol da agenda armamentista [veja aqui].
Leia as análises sobre armas de fogo como instrumento de segurança e balanço do governo Bolsonaro quanto a medidas na área de segurança pública.